Em depoimento à CPI do Táxi, nesta segunda-feira (25), na Câmara de Vitória, a presidente da comissão especial de licitação para 108 placas de táxi de Vitória, Jaqueline Murça, não exibiu a mesma segurança quanto à lisura do certame que mostrou em depoimento à CPI da Máfia dos Guinchos, em maio. Limitou-se a defender seu trabalho, este, sim, segundo disse, reto, sem sobressaltos: “Eu sei dos procedimentos que eu fiz”, evadiu-se.
A seguir, completou, sugestiva: “Tem coisas que realmente eu não sei explicar porque eu não sei”.
A servidora efetiva da Secretaria Municipal de Administração (Semd) foi convocada para explicar denúncias de irregularidades na licitação que distribuiu 108 placas em Vitória. A principal suspeita envolve o critério de apresentação de certificados de conclusão de curso de língua estrangeira. Os cinco primeiros colocados do certame concluíram cursos em intervalos de dois a três meses em média, recorrendo, porém, a cursos online. O edital não previu avaliação oral dos concorrentes.
Jaqueline explicou que a prefeitura dispõe de uma comissão permanente de licitação, composta por membros da Semad, mas que, em casos específicos, são formadas comissões especiais com membros indicados pela secretaria interessada para análise das propostas técnicas.
Ele explicou que os membros da comissão especial foram indicados pelo então secretário municipal de Transportes e hoje vereador Max da Mata (PDT), em cuja gestão o edital foi elaborado. Inclusive o taxista Alex Sandro Muller Helmer, representando o sindicato dos taxistas (Sinditax-ES). “O senhor Alex Muller foi indicado pelo então secretário”, garantiu Jaqueline. Os membros que avaliaram as propostas técnicas são Adriana Sossai, Heleno Barros e Minervino de Oliveira, servidores da Secretaria de Transportes, Trânsito e Infraestrutura Urbana (Setran).
Jaqueline destacou que não participou da elaboração do edital. O vereador Reinaldo Bolão (PT), vice-presidente da CPI, questionou a utilização de certificados de língua estrangeira para inflar a pontuação no certame. “O termo de referência [documento que precede a elaboração do edital] não pediu que avaliássemos as pessoas”, safou-se. Valeu-se da mesma explicação que deu à CPI da Máfia dos Guinchos: seguiu o que pedia o edital.
O depoimento de Jaqueline e, mais tarde, de Heleno Barros, fizeram emergir outro personagem da elaboração do edital de licitação de táxi de Vitória: a ex-subsecretrária de Transportes, Júlia Schuartz. Ambos afirmaram que a ex-servidora sanava dúvidas quanto ao edital. Heleno afirmou que ela participou diretamente da elaboração do mesmo.
Segundo Jaqueline, Júlia foi exonerada há cerca de um ano. Fontes ouvidas por Século Diário afirmam que ela era comissionada indicada por Max da Mata. Bolão (PT) apresentou encaminhamento para convocação de Júlia à CPI.
Heleno reforçou que não participou da elaboração do edital. Só foi designado para a comissão especial para avaliar as questões técnicas.
A servidora da Controladoria Geral do Município (CGM), Sueli Souza, fez uma revelação que gerou dúvidas nos membros. Como assessoria técnica da gerência de contratos e convênios da prefeitura, a servidora recebeu uma versão do edital para apontar possíveis vícios antes da publicação definitiva do documento.
Ela apontou possíveis irregularidades e devolveu o edital para a Setran. Segundo explicou, o então secretário, Max da Mata, poderia ou não acatar o parecer da servidora, mas, ela destacou, o bom senso recomendaria o saneamento dos possíveis vícios e reecaminhamento do edital à servidora para nova análise. Não foi feito. “O secretário deve ter achado que o que a gente apontou não caberia, acredito”, pontuou Sueli.
A CPI também ouviu o taxista Jeferson Araújo, que depôs de forma espontânea. Ele participou da licitação e em uma primeira classificação, ficou em 56° lugar. Após reclassificação, despencou para a 126° posição, ou seja, área das 50 vagas do cadastro de reserva. Até hoje não sabe o motivo do reposicionamento. “Me estranha pessoas nos primeiros lugares que apresentaram cursos de línguas”, disse.
Ele também fez uma denúncia. Ouviu de um colega a conversa segundo a qual o permissionário do veículo 0570 se orgulha de dizer que o trabalho de taxista é um hobby para ele – que é, na verdade, advogado. Segundo Jeferson, o veículo fica a semana toda estacionado em um edifício-garagem na descida da Curva do Saldanha, no Centro.
Defensor há 18 anos, Jeferson contou que está há uma semana parado. Sucumbiu à diária de R$ 200 do último trabalho, no ponto do Parque Moscoso. Não conseguia honrar o pagamento e preferiu desistir.
Os vereadores também ouviram Helder Lordello, permissionário da placa 0357. Helder aparece em uma lista de 125 procurações a que Século Diário teve acesso em maio. Morador de Vila Velha, concedeu em 2009 procuração a Carlos Roberto Agne Filho, apontado como filho de Carlos Agne, o maior gestor de placa do mercado de táxi de Vitória.
Aos vereadores, Helder disse que não paga valores a Carlos Agne Filho. A relação de trabalho ali é de troca: ele faz serviços elétricos para Agne e este faz serviços mecânicos para Helder ou burocráticos, como emplacamento de carro.
Helder disse que o veículo opera no ponto em Jardim da Penha, mas não soube informar qual – são três pontos de táxi no bairro. Disse também que não trabalha há seis meses, em função de uma alergia. Ele recebeu a permissão de um colega de igreja, que não lhe cobrou valores. Ato gratuito.Hoje, trabalha no regime de comissão com seu único defensor, que recebe 40% do lucro bruto do dia. Helder garantiu que a renda bruta mensal do táxi é de cerca de R$ 4,5 mil.