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Operação Carne Fraca reacende debate sobre sustentabilidade do consumo de carne

“A criação de gado é uma das mais importantes fontes de poluição do meio ambiente. A aplicação da legislação ambiental sobre ela simplesmente inviabilizaria a atividade”, afirma, categoricamente, o biólogo Sergio Greif, especialista em Gerenciamento Ambiental, mestre em Alimentos e Nutrição e um dos membros fundadores da Sociedade Vegana.

“Passei alguns de meus últimos anos no interior de São Paulo, fiscalizando fontes de poluição ambiental: usinas de açúcar e álcool, fábricas que processamento de polímeros, fundições etc. Mas nada me pareceu tão poluente e agressivo quanto os curtumes e abatedouros de animais”, reflete Sergio, em artigo onde discorre sobre os incríveis números que dão forma e peso à insustentabilidade ambiental da produção de carne bovina.

De fato, mesmo as entidades não vegetarianas/veganas levantam dados incontestes sobre os impactos ambientais da produção de carne e leite, especialmente bovinos. O Sistema de Estimativas de Emissão de Gases de Efeito Estufa (SEEG) é por exemplo. Iniciativa da rede de ONGs Observatório do Clima, o SEEG gera estimativas anuais a partir de dados do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e outras fontes, seguindo diretrizes do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), e as disponibiliza na internet, de forma simples e clara, agilizando e democratizando o acesso.

Dados oficiais confirmam insustentabilidade

Em entrevista via Skype, em setembro de 2015, para esta repórter, Tasso Azevedo, coordenador geral, foi enfático: “Cerca de 60% das emissões de gases de efeito estufa no Brasil são geradas pela cadeia de produção da pecuária. E 80% de tudo o que é desmatado na Amazônia vira pasto, antes de qualquer outra coisa”, salientou.

A Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB), em nota à imprensa sobre a Operação Carne Fraca, também enfatiza os impactos ambientais. “A produção de carne no Brasil é responsável pelo uso de amplas extensões de terra, desmatamento, poluição da água e solo, e mais emissões de gases de efeito estufa do que qualquer outro setor. E se não fosse pelos incentivos fiscais e dinheiro público que as grandes empresas de carne recebem do governo, a conta não fecharia”.

“Talvez agora as pessoas percebam que o que a pecuária mostra nos comerciais da TV não é nada confiável”, afirma Fabio Chaves Fundador e infoativista do portal Vista-se, em resposta, via email, à nossa reportagem.

21 dias sem carne

Em sua campanha 21 Dias Sem Carne, a SVB anuncia que ao aceitar o desafio de viver três semanas sem proteína animal, é possível economizar: 47.628 litros de água, equivalente a mais de um ano de banhos diários; 420 kg de grãos, necessários para alimentar dois veganos durante um ano; 56m² de floresta desmatada, ou seja, 3 árvores; 189 kg de CO² lançados na atmosfera, equivalente a dirigir até o México de carro a gasolina; e a vida de muitos animais inteligentes”.

Em seu site oficial, a SVB disponibiliza download gratuito da publicação “Comendo o Planeta”,  com números atualizados sobre os diferentes impactos que a alimentação carnista provoca no planeta.

A água, por exemplo, que é utilizada não só na dessedentação dos animais, mas também, abundantemente empregada “nas diferentes etapas que envolvem o processamento das carcaças de animais abatidos: sangria, escaldagem, depenagem, depilação, barbeação, evisceração, lavagem etc.”, segundo enumera Sergio Greif, merece uma tabela comparativa (abaixo, à direita).  

“O pecuarista não paga pela água que utiliza nem pelos efluentes (água contendo sangue, gorduras, visceras, vômitos e fezes) que o abatedouro gera. No preço da carne não estão contabilizados estes custos, nem os prejuízos ao meio ambiente causados pela criação de animais. Todos estes custos são subsidiados pelo governo. Isto significa que o contribuinte arca com todos estes custos, para lucro exclusivo do setor pecuário”, esclarece o biólogo.

Novos vegetarianos

Sobre a Operação Carne Fraca, o especialista em Gestão Ambiental diz que também deseja que ela seja uma oportunidade de mais pessoas conhecerem a alimentação vegetariana e, quem sabe, adotá-la permanentemente. O que vem, de fato, acontecendo em várias cidades do país, inclusive na Grande Vitória. “Seguramente, há um aumento no número de novos clientes, pessoas que chegaram ao Restaurante para conhecer a dieta vegetariana depois do escândalo da Carne Fraca”, observa a gerente-geral do Restaurante Alimento, Jovana Nineaoum.

Novos clientes por um lado, e “velhas novidades” do outro. “Já ouço que salsicha tem papelão desde criança, isso não é novidade”, conta Sergio, destacando que não há nada de novo sobre as barbaridades que recheiam as salsichas, embutidos e embalagens de carne vendidas nos mercados.

Sônia T. Felipe, doutora em Teoria Política e Filosofia Moral e autora de diversos livros sobre a ética animal e ambiental pronunciou-se de forma semelhante em sua página no Facebook: “Nada de novo no front. Levando em conta o termo grego para “escândalo”, que quer dizer, o que sai do costumeiro (da mores, dos costumes), quem realizou, finalmente, um escândalo foi a PF, por ter saído da inércia em relação à corrupção da carne em nosso país. Que siga escandalizando!”, ironizou.

“Cadaverina”

Na publicação, Sonia explica que carne significa “músculo morto” e, portanto, necessita de “muita química” mesmo para ser vendida como alimento antes que a cadaverina atue, natural e definitivamente, em sua decomposição e putrefação. “As carnes não humanas também apodrecem. Basta esvair-se o sangue dali. Sem oxigênio, o que começa mesmo é a ação de uma amina, altamente concentrada, a ‘cadaverina’”, explica.

Sonia explica que para retirar a cadaverina de carnes, “já mais do que fora de hora para consumo”, há frigoríficos que costumam usar ácido ascórbico (vitamina C). “A vitamina C presente nos alimentos vegetais in natura é altamente benéfica para o organismo dos animais incapazes de sintetizá-la, como nós, humanos. “Mas usada assim, para maquiar a decomposição de carnes, o ácido ascórbico é cancerígeno”, alerta.

Agricultura sustentável

Soluções? Sergio não tem dúvida de que o fenômeno que ocorre no Espírito Santo, de substituir as pastagens (que já cobriram cerca de 40% do território capixaba e agora estão na casa dos 29%) por monoculturas de eucalipto não é a solução, “tanto por questões técnicas (esgotamento de solo, propagação de doenças, baixa biodiversidade), quanto por motivos econômicos (não vale a pena colocar todos os ovos em uma mesma cesta)”, pondera.

 
“A solução está sim em sistemas de produção integrada, com valorização de espécies locais, produção mais próxima dos centros de consumo, etc. Na situação ideal, os alimentos seriam produzidos parte em agroflorestas e sistemas consorciados e parte em sistemas artificiais de produção intensiva que poderiam estar dentro das próprias cidades (hortas urbanas ou edifícios hidropônicos)”, vislumbra.

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