Por tudo que a envolve, a gestação é um período cercado de fortes emoções, crenças e mitos. Mas será que uma gestante tem mesmo necessidade de uma dieta alimentar diferenciada? Vamos a alguns fatos para compreender um pouco esse tema, cercado de opiniões e carente de informações.
Em primeiro lugar, a Nutrição cada vez mais vai se tornando uma ciência política, como bem definiu o Dr. David Heber, diretor do Centro de Nutrição Humana da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), referência mundial na área, rivalizando com Harvard essa primazia. Tudo o que se aborda relacionado com mudanças de hábitos nutricionais mexe com interesses políticos e econômicos, em cadeia – a indústria da doença à frente.
Fato é que a gestação deve ser um momento para construir a educação em saúde, voltada para o bem-estar do binômio mãe-filho, e isso inclui hábitos nutricionais. Lamentavelmente, isso não parece estar sendo priorizado pelas autoridades brasileiras, haja vista a ausência de profissional de Nutrição tanto nas equipes dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) quanto na equipe mínima da Estratégia de Saúde da Família (ESF). Como consequência, as futuras mães, principalmente aquelas atendidas na rede pública de saúde, recebem orientação nutricional de profissionais não, especificamente, habilitados para isso, como demonstrou pesquisa realizada pelo Centro de Ciências da Saúde, da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), na rede pública de Santo Antônio de Jesus (BA), publicado pela Revista Baiana de Saúde Pública.
Nessa pesquisa foram entrevistadas 284 gestantes e apenas 75% receberam orientação nutricional. Desse universo das informadas, 75% tiveram isso passado por enfermeiros e apenas 8% por profissionais de Nutrição. Menos de 3% foram orientadas neste sentido por médicos, que praticamente não aprendem sobre o tema na sua formação, a menos que se decidam por alguma especialização, como a Nutrologia. Um detalhe importante da pesquisa é que apenas 15% receberam essa orientação por escrito.
Tem mais um dado relevante revelado pela pesquisa baiana: há uma diferença expressiva no percentual de mães que engordaram mais do que deviam, quando se investiga as que tiveram informações nutricionais na gestação e as que não receberam. Apenas 10% das que mantiveram o peso baixo relataram não terem recebido a informação, mas 21% das que ganharam mais peso do que o admissível não tiveram esse tipo de informação.
A questão do preparo dos profissionais de saúde para orientarem, adequadamente, as mães em relação à alimentação durante a gestação foi tema de estudo de pesquisadores da Universidade Estadual de Goiás, publicado pela Revista da Faculdade Montes Belos (FMB). E ficou demonstrado que não apenas as gestantes, mas os profissionais de saúde carregam muitos mitos, que são repassados a elas.
Sem pretender a defesa do corporativismo, mas é inevitável defender a presença de profissionais habilitados nas equipes mínimas de estratégias da saúde da família, nos Programas de Saúde da Família (PSF) e outros projetos e programas correlatos.
Mas, afinal, qual é a alimentação adequadas para as gestantes? Terão elas, de fato, necessidades especiais?
Sim, as gestantes necessitam de cuidados mais específicos com a nutrição. Mas no entanto lembrando sempre da qualidade do alimento a ser ingerido. O que a ciência tem concordado é que alguns alimentos não devem fazer parte da dieta das grávidas. Isso parece estar evidente, por exemplo, em relação à cafeína, cujo consumo materno causa problemas fetais como: redução do crescimento, baixo peso ao nascer, aborto, malformações e outros. Isso, apesar de pesquisas recentes dizerem que nenhum risco foi encontrado na ingestão de cafeína. Por enquanto, é melhor manter os conceitos pré-existentes.
A mulher que amamenta deve evitar álcool, café, cigarro e evitar a ingestão de alimentos que produzem gases (cebola, couve-flor, brócolis e outros). Após a mamada o bebê deve ser colocado na posição ereta para expulsar o ar quando arrotar, esse ar ocasiona as cólicas. A mãe precisa controlar a ansiedade e evitar não ficar nervosa porque o recém-nascido manifesta-se com mais cólicas. Tudo o mais a este respeito é mito.
Enfim, o que se pode dizer é que, embora a gestante apresente carências nutricionais maiores do que uma mulher não gestante, isso não dá às futuras mamães o direito de comerem mais do que o normal a pretexto de “comerem por dois”. Se disserem que precisam se “nutrir por dois”, então, estão certas. Mas, nutrir-se é diferente de comer.
Resumindo: o estilo de vida saudável e ativo, com a perfeita ingestão de proteínas, carboidratos complexos, fibras, água, vitaminas e minerais é uma necessidade de gestantes ou não, sendo que, para as gestantes, é correto dizer-se que precisam de mais de todos esses nutrientes, o que se obtém com uma alimentação seletiva de maior qualidade e, em alguns casos, sim, com o uso de bons suplementos nutricionais.
A gestação é uma ótima oportunidade para levar a mulher a uma mudança de hábitos nutricionais para sempre. O período é, suficientemente, longo para permitir isso, além de todo o aspecto emocional, psicológico e comportamental que o novo estado provoca, tanto para as futuras mães, quanto para os futuros papais, e todo o núcleo familiar envolvido na expectativa da chegada desse novo ser.
Cuidar da alimentação saudável e da prática regular de atividades físicas, sempre com orientação de um profissional, durante a gestação é um gesto solidário, que deve ser estimulado, com a formação de grupos de interesse e a promoção de palestras educacionais com vistas à completa transformação do ambiente que está a esperar o bebê, podendo haver reflexos positivos em todo o ambiente também ao seu redor, pelo poder da conscientização.
Independente de sua condição socioeconômica e cultural, invista em sua educação pessoal, pelo bem da sua e das futuras gerações.
Lídia Caldas é nutricionista pela Faculdade Católica de Vitória, especialista em Nutrição Esportiva pela Universidade Gama Filho (RJ) e gestora de Unidade de Alimentação e Nutrição. Fale com a nutri: [email protected]