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Em oito meses, 112 relatos de tortura policial na Grande Vitória

Entre 23 de julho de 2015 e 10 de abril de 2016, 112 relatos de tortura foram registrados na Grande Vitória durante audiências de custódia realizadas pela Defensoria Pública do Espírito Santo (DPES). Essas práticas expõem o nome de 189 policiais, sendo 13 deles mencionados pelo menos duas vezes (os nomes não foram divulgados). Quase todos os casos (99,11%) tiveram algum tipo de agressão física. Uma delas, inclusive, culminou em morte.
Esses dados fazem parte do “Relatório sobre Denúncias de Tortura: Análise de 112 Casos Catalogados em 257 dias nas Audiências de Custódia no Espírito Santo”, elaborado pela Coordenação de Direitos Humanos da DPES.
As práticas de tortura mencionadas durante as audiências, que, na região metropolitana, acontecem no Centro de Triagem de Viana, englobam: espancamentos, sufocamento com sacola plástica, o popular “telefone”, enforcamento, estrangulamento, choque a laser, uso de spray de pimenta e ferimentos com armas letais (agressões físicas), além de humilhações verbais e de torturas psicológicas, como ameaça de estupro, de morte e de perseguição. Tais práticas foram classificadas em quatro categorias: agressão física, agressão física e psicológica, agressão física e verbal e agressão psicológica.  
Exames e laudos médicos
Apesar de os relatos apontarem que a agressão física é o tipo mais frequente de violência policial, a realização de exame de corpo de delito na vítima ocorreu em apenas 67,86% dos casos. Em 20, 54%, a realização do exame não foi informada, enquanto em 11,61% não foi executada.
Em relação aos laudos médicos, a Defensoria teve acesso a apenas 21 documentos, o que corresponde a 18,75% dos casos. Outro agravante, neste caso, é que nenhum dos laudos estudados apresentou quesito específico de tortura psíquica, conforme recomendado pelo Protocolo de Istambul e pelo Protocolo Brasileiro de Perícia Forense no crime de Tortura.
A lesão pode ser constatada por meio deste tipo de exame ou por outros meios. Em seis casos, os próprios policiais ou a magistrada confirmaram a existência de lesão aparente. Essas informações das autoridades foram dadas, respectivamente, em depoimento no Auto de Prisão em Flagrante da suposta vítima de tortura ou em Auto de Lesão/Morte decorrente de oposição à intervenção policial e em ata de audiência.
Em 80,36% das denúncias catalogadas pela Defensoria Pública não há informação sobre ausência de lesão ou ferimento da vítima. Apenas em 17,86% dos registros de tortura foi constatada a lesão física. O baixo percentual, contudo, não indica que a maioria de pretensas vítimas não foram lesionadas, mas sim que não houve informação suficiente a respeito de todos os casos catalogados. Destaca-se que, dos 21 laudos que a Defensoria Pública teve acesso, em apenas dois deles não se vislumbrou a existência de lesão.
Na maioria dos relatos de tortura física, o auto de lesão ou morte decorrente de oposição à intervenção policial não foi lavrado (cerca de 85% do total) e em cerca de 7% do total de denúncias não há qualquer informação a respeito da existência ou não do auto, como apontao relatório. O percentual de autos lavrados e registrados foi de cerca de 8%.

Todas as autoridades com atribuição para apuração nas esferas criminal e administrativa foram notificadas dos 112 relatos analisados, segundo a pesquisa. As autoridades neste caso são o Ministério Público, a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (Sesp), e as Polícia Militar e Civil.

Tipos de delitos das supostas vítimas de tortura
Foram contabilizados 174 tipos penais que teriam sido praticados pelos assistidos da DPES supostamente vítimas de tortura. “Fica claro que as transgressões possivelmente cometidas pelos usuários da Defensoria não estiveram dentre aquelas cuja gravidade abstrata, geralmente, provoca grande comoção social. Apenas 2,70% dos delitos corresponderam à delinquência que ofende a integridade física do indivíduo (homicídio e lesão corporal)”, aponta o estudo.
De acordo com a pesquisa, em análise abstrata dos graus de reprovabilidade das condutas, “podemos concluir que a prática de tortura se apresenta mais gravosa do que a maioria dos delitos supostamente perpetrados pelos usuários defensoriais”.
Medidas necessárias
A Defensoria propõe, no documento, 13 ações conjuntas e interinstitucionais para minimizar as dificuldades enfrentadas no processamento dos casos relatados. São elas: “acelerar a implementação do protocolo de atuação para os defensores nos casos de tortura; buscar diálogo entre as instituições pertencentes ao sistema de controle; adotar medidas para contribuir com a formação de agentes estatais em direitos humanos; estabelecer comunicação com o corpo docente e demais envolvidos nas academias de Polícia visando entender a formação ideológica e intelectual das forças policiais; sugerir a implementação de instrumentos alternativos que não contemplem o poder punitivo tradicional; e propor a realização de audiência pública sobre controle externo da atividade policial”.

Além disso, “refletir quanto ao trabalho da polícia científica na realização de perícias envolvendo tortura, bem como cobrar a sua autonomia; defender o direito à imagem do acusado na mídia, seja em âmbito individual ou coletivo; questionar a construção da imagem, pelos meios de comunicação, de pessoas que supostamente comentem delitos; impulsionar a atuação do Ministério Público no sentido de apurar a caracterização de improbidade administrativa por policiais militares que praticam tortura e prisões ilegais; desenvolver pautas positivas junto à Policia Militar; aprofundar o debate sobre a Desmilitarização da polícia; e manter a coleta de dados atualizada, buscando o seu cruzamento com as informações levantadas pelas demais instituições.

 
(Com informações da Defensoria Pública Estadual)

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