Sexta, 29 Março 2024

Militantes comemoram habeas corpus em favor de adolescentes da Unis Norte

Militantes comemoram habeas corpus em favor de adolescentes da Unis Norte

Representantes de entidades da área de Direitos Humanos comemoram a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que, em ato histórico, concedeu habeas corpus coletivo em favor dos adolescentes que cumprem medida socioeducativa na Unidade de Internação Norte (Unis Norte). Administrada pelo governo do Estado por meio do Instituto de Atendimento Socioeducativo do Espírito Santo (Iases), a unidade tem sido palco de tratamento degradante, com superlotação excessiva, sendo comparada até a “minipresídio”, com rebeliões e mortes registradas. 


Mais uma vez, foi preciso a intervenção de um tribunal superior para fazer cessar situações de tratamento degradante a custodiados pelo Estado do Espírito Santo; desta vez, menores de idade.

 

Com capacidade para 90 internos, a Unis Norte chega a abrigar mais de 250, tornando adolescentes vítimas de um constante estado de medo e apreensão, o que também atinge suas famílias. Apesar de impetrado pela Defensoria Pública do Estado em 2015, a decisão do STF, três anos depois, é considerada de extrema importância não apenas para o Estado, mas em âmbito nacional.

 

O defensor público Hugo Matias, que participou da elaboração do habeas corpus coletivo em 2015, explicou que a medida foi uma forma encontrada para efetuar um litígio estratégico em favor do sistema socioeducativo do Espírito Santo. A estratégia, no caso, baseada em pesquisa e estudo dos defensores, foi utilizar a tese chamada numerus clausus, que defendeu a necessidade de se estabelecer um fluxo pra ingresso e saída dos adolescentes da Unis Norte, de forma a reduzir a superlotação. 


“A ideia da Defensoria não era de construir uma nova unidade, mas estabelecer um limite. Foi uma vitória local e nacional, uma vez que o habeas corpus contou com apoio de entidades de nível nacional que ingressaram como ‘amigos da corte’”, explicou.

 

Para Hugo Matias, apesar de destinada a Unis Norte, o habeas corpus reverbera em todo o sistema socioeducativo capixaba e também se tornará base de estudos para juristas de todo o País.

 

O advogado Antonio Fernando Moreira lembra que, em síntese, a decisão do STF significa que, “pela segunda vez, um Tribunal Superior de Brasília diz ao governo Paulo Hartung que ele não pode tratar seres humanos como animais. Sejam presos do 'sistema socioeducativo' [menores de idade], sejam maiores de idade”. Para ele, “essa decisão, portanto, soma-se à proferida pela 6ª Turma do STJ ]Superior Tribunal de Justiça] no caso dos contêineres de Cariacica, que teve voto histórico do ministro Nilson Naves”, lembrou.

 

Em seu voto, o relator, ministro Nilson Naves, destacou que no ordenamento jurídico nacional não se admitem, entre outras, as penas cruéis. Para o ministro, a prisão preventiva do acusado “trata-se de prisão desumana, que abertamente se opõe a textos constitucionais, igualmente a textos infraconstitucionais, sem falar dos tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos”.

 

Para Gilmar Ferreira, militante histórico de Direitos Humanos no Estado, que já presidiu o Conselho Estadual de Direitos Humanos (CEDH) e outras entidades da área, essa é uma vitória de enorme significado para a juventude e adolescência brasileira. 


“Essa é uma vitória de grande simbolismo para a adolescência  e juventude brasileira. Espero que seu impacto  alcance todo o sistema socioeducativo do país  e que, a partir dela, o sistema de Justiça possa revisar os conceitos punitivistas e adotar medidas que não sejam de internação e segregação. A decisão  confirma o que já  disse na audiência  da Corte Interamericana de direitos humanos  de que os problemas são sistêmicos e demandam soluções sistêmicas. Assim  podemos eliminar essa realidade de presídios  juvenis”.

 

Para Lula Rocha, da entidade do movimento negro Círculo Palmarino, foi preciso novamente recorrer às instâncias externas para salvaguardar direitos elementares da população capixaba,  desta vez, ao Supremo. “Isso prova o quanto os poderes locais, sobretudo o Executivo, estão avessos à resolução de problemas que historicamente denunciamos”, reforçou.



Também é o Estado considerado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos como torturador de adolescentes. O Tribunal Internacional, renovou, em dezembro do ano passado, as medidas relativas à adequação da Unis até dezembro de 2018.     

 

No final de 2017, dois comissários da Comissão Interamericana de Direitos Humanos estiveram no Espírito Santo e publicaram um comunicado à imprensa sobre a visita ao Brasil e também relataram suas observações sobre o Estado. O Tribunal, inclusive, concedeu liminar determinando que o Brasil fizesse reformas em seus sistemas socioeducativos, adequando-o a padrões internacionais de defesa dos direitos humanos. Medidas cautelares continuam em julgamento. No caso do Estado, houve três visitas realizadas por membros da Corte à Unis de Cariacica em 2016 e 2017.

 

Em maio do ano passado, uma audiência pública chegou a ser realizada em San José, na Costa Rica, cidade sede da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Falando em nome dos peticionários das medidas aplicadas contra o País em relação à Unis de Cariacica, foi destacado o representante do Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Serra (CDDH-Serra), Gilmar Ferreira. 


“Estive e fui ouvido na audiência pública. Nossa ação diz respeito à Unis, mas disse à Corte que os problemas são sistêmicos e demandam soluções sistêmicas. Tendo em vista que as notícias que nos chegam é de que a realidade vivida na Unis Norte [Unidade de Internação Norte] é dramática e exige um olhar especial dos órgãos de Estado para aplicar as medidas previstas e proteger a vida e a dignidade dos adolescentes e dos servidores da unidade”.

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