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Especulação fundiária e imobiliária afetam a circulação da Grande Vitória, diz professor

Além indicar que as mazelas da mobilidade urbana da Grande Vitória são efeitos de um desequilíbrio de distribuição de riquezas, com Vitória concentrando as atividades socioeconômicas da região, e portanto atraindo demanda/tráfego, o professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Cláudio Zanotelli, lança uma questão intrigante: “Por que a Região Metropolitana da Grande Vitória está se expandindo tanto?”. 
 
Em mais uma matéria de uma série, digamos, multidisciplinar, sobre os impactos da implantação do Sistema BRT (vias exclusivas para ônibus) na Grande Vitória, o professor da Ufes traça um panorama do atual modelo de organização territorial da região, orientado antes por interesses especulativos que por projetos de planejamento urbano. Como se verá, as consequências sobre a circulação da cidade são visíveis.
 
E por que a Região Metropolitana da Grande Vitória está se expandindo tanto? O próprio Zanotelli responde, trazendo estudos desenvolvidos com alunos do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Ufes, do qual é coordenador: “Porque uma das coisas que tem acontecido aqui é a especulação fundiária”. 
 
Um problema que agrava outro, o da mobilidade urbana: a expansão metropolitana pressiona ainda mais os bairros periféricos, ao dificultar o deslocamento a trabalho de trabalhadores de baixo poder aquisitivo em direção aos centros econômicos. 
 
“Boa parte dos perímetros urbanos de Vila Velha, Serra, Cariacica, Viana, Fundão, Guarapari e Anchieta são espaços rurais que foram definidos por leis municipais como perímetro urbano”, diz. 
 
Daí nasce um primeiro problema. Zanotelli não aponta ermos inacessíveis, mas zonas localizadas no limite da mancha urbana. É nessas zonas de infraestrutura precária que se registra o surgimento de construções e loteamentos. “Isso coloca um problema em termos de planejamento. Você não expandir a mancha urbana indefinidamente porque o custo disso em termos de deslocamento é muito grande”, reflete.
 
Parte de grandes fazendas da Grande Vitória estão nesse perímetro urbano traçado por Zanotelli. O preço do hectare na zona rural é um, mas no perímetro urbano, outro – e muito maior, claro. “Grandes proprietários que só esperam que [suas propriedades] se transformem em perímetro urbano, e que o poder público leve estrada, asfalte rua, leve linha de ônibus, para justificar o início do loteamento”, exemplifica. Eis a questão da especulação fundiária. 
 
O segundo problema nasce aqui: quem vai comprar esses loteamentos? Zanotelli cita o Minha Casa, Minha Vida, principal programa de habitação do governo federal. Há projetos para famílias com renda entre zero e três salários mínimos e que, em geral, localizam-se nessas franjas urbanas. O motivo é claro: os terrenos ali são mais baratos para os agentes imobiliários; às vezes, são doação da prefeitura. 
 
Assim como também está claro que quem vai habitar essas franjas são os mais pobres. Seja, como se viu, no Minha Casa, Minha Vida, seja em improváveis loteamentos servido de pouco ou nenhum equipamento – água, luz, esgoto, transporte. “As coisas vêm depois que as pessoas se instalam. E valorizam-se as terras de quem é fazendeiro ali”.
 
Os estudos de Zanotelli e alunos constataram que um terço da Grande Vitória é pasto, à espera de valorização. Apenas 31% da região é área densificada, que, ressalve-se, apresenta inúmeras manchas de vazio também. Em particular, na Serra, Vila Velha, Aracruz e Anchieta. 
 
Ou seja, em alguns casos, dependendo do município, 70% ou 80% é área vazia (com pasto, área rural ou terreno abandonado). “Estamos numa área metropolitana, onde tem um monte espaço vazio dentro da área urbana, que não é ocupado, e vai se construindo cada vez mais na periferia”, aponta Zanotelli.
 
Dados do Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado do Espírito Santo (Sinduscon-ES) indicavam que, entre 2005 e 2012, 35 mil apartamentos e casas estavam em construção na Grande Vitória. No mesmo período, foram lançados 65 mil imóveis. Por outro lado, havia, segundo estudos do Instituto Jones dos Santos Neves (2009) , um déficit habitacional de cinco mil apartamentos na região. 
 
Ao mesmo tempo, agora segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010), havia cerca de 66 mil residências vazias na Grande Vitória stricto sensu (Vitória, Vila Velha, Serra e Cariacica), que não são residências secundárias, estilo veraneio, ou seja, de ocupação sazonal.
 
Conclusão? “Temos um problema aí”, diz Zanotelli. “Isso nos indica, pelo menos nos grandes números, que estamos em uma área onde há uma especulação imobiliária, associada à especulação fundiária. E isso tem consequências diretas sobre as pessoas em termos de circulação e de qualidade de vida”, analisa.
 
O cerne do problema é que, muitos desses imóveis vazios estão em áreas centrais, à espera de serem alugados, vendidos (ou sendo vendidos), ou estão vazios por pura especulação. 
 
“Os PDM’s [Plano Diretor Urbano] deveriam falar ‘vamos densificar a mancha, não vamos deixar expandir’. Só que eles fazem um perímetro que é três vezes a mancha. Dois terços do perímetro, em alguns casos, é mato”, critica.

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