Pobre Daysi, pobre Wanderson Marinho, pobre Neuzinha de Oliveira. Até as 19h dessa segunda-feira (7), a audiência pública com o tema Dia Mundial da Saúde era aquele fenômeno silencioso e enfadonho de praxe, de falas burocráticas ante um plenário vazio (foto abaixo). Mas a chegada de cerca de 70 pessoas à Câmara Municipal de Vitória mudou radicalmente o clima do debate.
Eram os manifestantes da edição capixaba do protesto em função do Dia Mundial da Saúde. O constrangimento estampou-se na cara da secretária municipal de Saúde, do vereador do PRP e da vereadora do SDD, além do representante da Secretaria Estadual de Saúde (Sesa).
A manifestação saíra por volta das 17h30 do Hospital Universitário Cassiano Antônio de Moraes (Hucam), pegando a Avenida Marechal Campos, depois a Vitória, passou em frente ao Hospital São Lucas. A ideia inicial era se dirigir para a sede da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), na Marechal Mascarenhas de Moraes, em Bento Ferreira. Mas audiência pública veio mais a calhar e o povo tomou o rumo da Casa do Povo.
Foi um protesto lúdico, mas igualmente crítico. Estavam presentes entidades sindicais como Sintufes, Sindisaudeprev-ES, Sindipublicos, Adufes, Sindienfermeiros e estudantes da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Desde o início ficaram expressas as críticas contra a mercantilização da saúde e a luta antimanicomial.
Com carro de som, um bumbo, um tarol e letras bem-humoradas banhadas em ritmo de funk ou congo, o Bloco Que Loucura!, criado pelo Fórum Capixaba em Defesa da Saúde Pública, saiu pelas ruas cantando e dançando contra a mercantilização da saúde, os manicômios (pedindo especificamente o fechamento da Clínica Santa Isabel, em Cachoeiro de Itapemirim), a Rede Abraço, a entrega dos hospitais Jayme dos Santos Neves e São Lucas para a gestão de Organizações Sociais – as chamadas OSs -, o que entendem ser uma privatização velada da saúde pública.
Para o azar ainda maior da mesa, o protesto chegou pouco antes de a audiência se abrir para as perguntas dos participantes. Fosse uma audiência pública normal – chata, burocrática, etc…, como aliás vinha sendo – as primeiras questões, ou seja, formuladas por quem já se encontrava no plenário, seriam respondidas sem maiores sobressaltos.
Mas não. A cada resposta da secretária Daysi Koehler Behning apupos e gritos tomavam o plenário. Ela respondia daqui e um “É mentira!” estalava acolá. Como era de se esperar, os manifestantes entraram na fila de inscrição para questionar uma constrangida mesa.
A psicóloga Rafaela Amorim, secretária-geral do Sindicato dos Psicólogos do Estado o Espírito Santo (Sindipsi-ES), dirigiu duas perguntas à secretária: onde está o relatório final da Conferência Municipal de Saúde, realizada ano passado e o que ela acha da Rede Abraço – “que não é uma rede que abraço, mas é uma rede que recolhe”. A artilharia prosseguiu pesada, com manifestantes pedindo o microfone para questionar mais e mais.
Dessa vez, ninguém foi ferido ou detido. A polícia militar se espalhou por pontos estratégicos em todo o percurso, acompanhando o cortejo. Ninguém choramingou vidraças quebradas. Não houve bala de borracha (embora as armas estivessem nas mãos dos soldados, para qualquer, digamos, eventualidade) ou spray de pimenta.
Quando os manifestantes entraram na Câmara, policiais entraram junto, logo atrás, cerca de seis. Mas só olharam. Do lado de fora, 10 viaturas estavam de prontidão. A única vitrine quebrada foi a de vereadores, que, com certas audiências públicas, ficam bem na foto de suas comunidades.
Dessa vez não deu, simplesmente porque ao final a audiência foi um êxito de debates ricos e produtivos.