A autooutorga de auxílio-moradia de R$ 4,3 mil mensais aos juizes brasileiros, dádiva do ministro Luiz Fux, do STF, é a gota que faltava para uma revolta popular contra as mordomias do andar de cima.
Não por acaso as notícias dos jornais sobre o assunto vêm carregadas de sarcasmo destilado pela raiva dos redatores, nenhum dos quais ganha R$ 4,3 mil de salário por mês. Como resistir ao ímpeto de denunciar o desplante de que já recebe proventos de cinco dígitos, mais benefícios como uma côrte de assessores?
Como os oficiais residentes em vilas militares ou os gerentes do BB na época em que nenhum bancário pensaria em fazer greve por uma diferença de 5% no reajuste salarial, os juízes passam a desfrutar agora de uma ajuda que só se justificaria temporariamente em casos de chegada a uma cidade nova.
O auxílio-moradia mensal dos juízes – são 14 mil no Brasil – equivale a seis salários mínimos, remuneração que representa o dobro da média salarial dos trabalhadores brasileiros. A verba total chegará a R$ 60 milhões por mês ou R$ 720 milhões por ano.
É justo que uma autoridade ganhe o suficiente para ficar livre de pressões dos ricos e poderosos, mas quem ganha mais de R$ 20 mil mensais (como é o caso dos juízes) num país desigual como o Brasil, devia por a mão na consciência e agradecer por desfrutar de uma posição de relevo na sociedade. Autoregalar-se com uma mordomia habitacional é uma ofensa ao esforço de milhões de pessoas que se esforçam honestamente para viver com conforto e dignidade.
Do jeito que as coisas foram colocadas pelo ministro Luiz Fux e depois “isonomizadas” pelos seus pares, qualquer brasileiro está no direito de protestar veementemente contra uma das medidas mais escandalosas da história do Brasil. Medida irrecorrível pois o Judiciário é o único poder que se mete na vida dos outros e cujas decisões não podem ser reformadas. O que nos resta, cidadãos comuns?
Resta-nos pôr a boca no trombone, como fizeram os manifestantes de junho de 2013. Mas ninguém estranhará se alguém situado na ampla faixa de pobreza chutar o traseiro dos chefes, esvaziar os pneus dos carros dos bacanas, furtar os supermercados ou apedrejar as vidraças dos bancos, símbolos qualificados do abuso de poder dos ricos sobre os pobres.
A esta altura da desfaçatez das classes superiores, entre as quais se refestelam ministros, procuradores, desembargadores, promotores e juizes, somente a desobediência civil poderá restabelecer a decência, tal como recomendam a ética e o bom senso.
LEMBRETE
“O Minha Casa Minha Vida é um programa de governo que tem transformado o sonho da casa própria em realidade para muitas famílias brasileiras. Em geral, o Programa acontece em parceria com estados, municípios, empresas e entidades sem fins lucrativos. Se você tem renda bruta de até R$ 5.000,00, o Programa oferece algumas facilidades, como, por exemplo, descontos, subsídios e redução do valor de seguros habitacionais”. (Texto do site da Caixa Econômica Federal sobre o Minha Casa Minha Vida)