O mel brasileiro se tornou competitivo no cenário internacional. Do montante exportado, 80% têm procedência orgânica e a produção destinada à exportação não pode ter nenhum pólen transgênico. Como alerta reportagem do jornal O Globo desta semana, uma das principais plantas usadas pelas abelhas para produzir o mel é o eucalipto. Entretanto, sob a ameaça do plantio do eucalipto transgênico, variedade da FuturaGene, grande parte da produção de mel brasileiro e propólis poderá ser afetada, como ocorreu com o México em 2011.
Segundo a secretária-executiva da Associação Brasileira dos Exportadores de Mel (Abemel), Joelma Lambertucci, em entrevista ao O Globo, todos os lotes exportados são analisados e, em caso de detectada a transgenia, os produtos contaminados são descartados. A informação reforça a preocupação já manifestada pela Associação Brasileira dos Exportadores de Mel (Abemel).
A FuturaGene é braço da Suzano Papel e Celulose e apresentou, em setembro último, a proposta de liberação comercial do eucalipto transgênico à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTN Bio). Caso o pedido seja aprovado, o Brasil será o primeiro país do mundo a plantar árvores transgênicas em escala comercial.
Os danos à natureza são irreversíveis. Valmir Noventa, da coordenação regional do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), ressalta que não se pode pensar no eucalipto transgênico pontualmente. É preciso avaliar os impactos que esse tipo de planta causa em todo o conjunto da natureza. As abelhas polinizadoras e produtoras de mel voam por quilômetros para conseguir o pólen e, quanto mais próxima estiver a planta transgênica, maiores são as chances de o mel estar contaminado.
Ele explica que as sementes crioulas, que são resultados de cruzamentos genéticos produzidos naturalmente durante anos pelos camponeses, podem ser contaminadas pelo gene transgênico em minutos, levando ao fim um trabalho que envolveu gerações em um cruzamento natural de espécies. A transgenia é um problema para a soberania alimentar dos povos, sobretudo às populações tradicionais, uma vez que as plantas transgênicas possuem programação genética para o tempo de floração e produção, além de serem programadas para produzirem apenas uma vez, atrelando a produção à compra de novas sementes, e não à reutilização de uma parte da safra anterior.
O mesmo alerta foi feito na audiência pública sobre o assunto, que aconteceu em setembro último, quando o engenheiro agrônomo João Dagoberto dos Santos afirmou que o processo genético foi desenvolvido com o objetivo comercial de aumentar a produção de celulose em maior escala e em menor tempo e, sem o conhecimento de suas características, pode causar danos imprevisíveis ao ecossistema.
Segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário, os estudos realizados para avaliar os efeitos do eucalipto nas abelhas e na produção de mel são insatisfatórios, pois levaram em conta apenas cinco colmeias de uma única localidade. Cerca de 25% do mel produzido no Brasil vem do eucalipto, e a pesquisa apresentada pela FuturaGene / Suzano não avalia os aspectos nutricionais do mel produzido a partir de pólen trangênico, tampouco sua toxicidade ou alergenicidade.
No Espírito Santo, o MPA ainda não recebeu reclamações dos produtores de mel com relação aos eucaliptos transgênicos. Apesar disso, Valmir explica que a transgenia já domina a produção de grãos no Brasil e está sendo ampliada a outros ramos da produção rural, como a de frutas e verduras. Os problemas locais frequentes com transgênicos são referentes ao milho, cuja semente é comercializada sob a propaganda de “melhor produtividade”, sem que o produtor seja informado de que a variedade é modificada geneticamente. Além disso, os órgãos públicos ligados à produção no campo, que deveriam fiscalizar a comercialização dos transgênicos, não o fazem, permitindo que lavouras de sementes crioulas sejam contaminadas, muitas vezes sem o conhecimento do produtor.
A Suzano, que desenvolve o eucalipto transgênico, responde pelo modelo de desenvolvimento das monoculturas de eucalipto no Estado com a Aracruz Celulose (Fibria). A Aracruz, inclusive, é uma das empresas apoiadoras do projeto Rede Apes, desenvolvido pelo Sebrae, que auxilia produtores de mel em 32 municípios capixabas. Entre eles, Aracruz, São Mateus e Conceição da Barra, que estão entre os municípios mais impactados pela monocultura do eucalipto.