A comissão especial que analisa a Proposta de Emenda Constitucional (PEC 215/00) que submete ao Congresso Nacional a decisão final sobre a demarcação de áreas indígenas, pode votar nesta quarta-feira (3) o parecer do relator, deputado Osmar Serraglio (PDMB-PR). O parlamentar apresentou substitutivo à proposta mantendo a demarcação pelo legislativo, porém por meio de projeto de lei, e não decreto do governo federal, como é feito atualmente, com base na Constituição.
A proposta original, do ex-deputado Almir Sá, inclui entre as atribuições exclusivas do Congresso Nacional a aprovação da demarcação das terras indígenas. Já no substitutivo, o relator determina que a demarcação seja feita por meio de lei de iniciativa privativa do presidente da República. O texto diz ainda que a lei poderá estabelecer a permuta de áreas que originalmente caberiam aos indígenas, além de vedar a ampliação de terra já demarcada.
O substitutivo também modifica o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, determinando que se a União não cumprir o dever de demarcar as terras indígenas no prazo constitucional previsto, ao todo cinco anos, terá de indenizar o proprietário das terras. Ao mesmo tempo, determina que procedimentos considerados em desacordo com a disposição da PEC sejam revistos no prazo de um ano.
Serraglio propõe mudanças ainda nas regras de posse das terras tradicionalmente ocupadas por indígenas, a quem é garantido, hoje, o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.
O substitutivo diz que os índios poderão explorar essas terras direta ou indiretamente, estabelecendo uma série de exceções: ocupações configuradas como de relevante interesse público da União; instalação e intervenção de forças militares e policiais; instalação de redes de comunicação, rodovias, ferrovias e hidrovias e edificações destinadas à prestação de serviços públicos; áreas afetadas por unidades de conservação da natureza; e perímetros urbanos.
A proposta autoriza o ingresso, trânsito e permanência de não índios nas áreas indígenas, inclusive pesquisadores e religiosos, e que as comunidades indígenas em estágio avançado de interação com os não índios poderão se autodeclarar aptas a praticar atividades florestais e agropecuárias e a celebrar contratos, inclusive de arrendamento e parceria.
A proposta do deputado, que integra a bancada ruralista do Congresso, foi repudiada com veemência em nota divulgada pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
A entidade alerta que tanto a PEC como o substitutivo são “descaradamente inconstitucionais e ultrajantes aos povos indígenas”, já que inviabilizam novas demarcações, reabrem procedimentos administrativos já finalizados, e legalizam a invasão, posse e exploração das terras demarcadas. Entre os territórios ameaçados, estão os Tupinikim e Guarani de Aracruz, norte do Estado.
“Com um Congresso Nacional dominado pelo ruralismo e interesses das grandes corporações empresariais multinacionais do campo, a consequência prática disso seria o total impedimento de novas demarcações de terras”. Situação que criaria profunda fragilidade e instabilidade jurídica e política às comunidades tradicionais, como destaca a entidade.
Em carta enviada aos povos indígenas em outubro deste ano, a presidente Dilma Rousseff reiterou oposição à PEC 215, por considerá-la inconstitucional. “Nada em nossa Constituição será alterado com relação aos direitos dos povos indígenas”, garantiu.