No discurso, o “novo Paulo” se diz um homem democrático, defensor das liberdades e transparente até o último fio de cabelo. Na prática, o discurso muda de figura.
No seu primeiro teste para mostrar se havia incorporado bem o novo personagem criado na campanha eleitoral pelo seu marqueteiro, o governador teve uma recaída e voltou a agir como o “velho Paulo”.
Há pouco mais de um mês, no início de dezembro, os delegados do Espírito Santo, inspirados no movimento que vinha ocorrendo em pelo menos dez estados brasileiros, protagonizaram um momento histórico. Pela primeira vez a categoria escolheria o chefe de Polícia por meio de uma eleição direta.
A partir de três candidatos que se apresentaram para a disputa, os delegados indicaram para o cargo o colega Júlio César Oliveira.
Imediatamente após a posse do governador, a categoria, por meio do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado do Espírito Santo (Sindepes) e da Associação dos Delegados de Polícia do Espírito Santo (Adepol-ES), informou a Hartung a decisão na expectativa de que o novo chefe do Executivo, que se diz um governante democrático, acatasse o nome legitimado pelas urnas.
O Sindepes esclareceu que Júlio César, além de ser escolhido democraticamente pela categoria, se qualificou por meio de critérios estritamente técnicos. Aliás, condição sine qua non imposta a todos aqueles que se apresentaram para a disputa.
Para concorrer, o postulante precisava ocupar o último nível funcional na carreira (classe especial) de delegado, não possuir sentença penal condenatória transitada em julgado ou decisão condenatória definitiva por improbidade administrativa, além de apresentar obrigatoriamente um programa de gestão que expresse as medidas administrativas e estruturais de modernização da instituição Polícia Civil.
Apesar de no discurso Hartung afirmar que escolhe sua equipe não por critérios políticos ou de amizade, mas por meritocracia, na prática ele mostrou que não é bem assim que a banda toca.
Nada contra Gracimeri Gaviorno, que foi escolhida nesta quarta (14) por Hartung para ser a nova chefe da Polícia Civil. O que está em análise aqui não é a competência da delegada, mas o fato de Hartung ter ignorado um processo legítimo da categoria.
Mais grave. Os delegados, como é característica do “velho Paulo”, não foram sequer chamados para uma conversa. Hartung atropelou a eleição e nomeou quem ele bem quis a partir dos seus próprios critérios.
Se o governador fosse um homem compulsoriamente democrático, como anda dizendo por ai, em respeito ao processo eleitoral legítimo de escolha do chefe de polícia, teria chamado a categoria para uma conversa franca. Poderia até dizer que não seria possível acatar, agora, a indicação feita por meio do sufrágio da categoria, mas que estava disposto a dialogar para adotar a eleição direta, por exemplo, em dois anos.
A decisão, da maneira como foi tomada, confirma a verdadeira faceta de Hartung. Um governante autoritário, centralizador, avesso à democracia e a tudo que derive dela.