Em oficio ao juiz federal da 4ª Vara Cível de Vitória, a Associação Nacional dos Amigos do Meio Ambiente (Anama) requereu a realização de “perícia complementar”, com inventário de fontes no ar da Grande Vitória. O advogado da Anama, Esdras Elioenai Pedro Pires, também requer a impugnação das “conclusões do laudo preliminar” do chamado “perito do juízo” no processo.
A perícia chamada “do juizo” é considerada incompleta e foi contraditada pelo perito da Anama. Mas, até mesmo o perito oficial reconhece que faltam dados sobre a poluição do ar. “(…) há prejuízo da avaliação atmosférica, sobretudo na análise de origem e responsabilidade pela emissão do `pó preto´, carecendo de estudos específicos…”, diz um trecho do parecer do perito.
O perito do juizo Luiz Roberto Charnaux Sertã Junior é engenheiro agrônomo, com mestrado em “Desenvolvimento”. É também corretor de imóveis. Ao encaminhar sua perícia ao juiz, ele requer “a liberação do levantamento restante de seus honorários…”.
Há concordância dos peritos do juizo e da Anama em relação à perícia complementar. O perito da ONG afirmou que foi comprovada a necessidade de se fazer um inventário das emissões atmosféricas de responsabilidade da ré (Vale) devido à falta de isenção da empresa Ecosoft … , pois a mesma presta serviços para Iema, Vale, ArcelorMittal Brasil, (e) esta é uma condição que deixa abertas todas as portas para contestação de qualquer serviço prestado por esta empresa, como é citado pelo advogado na petição para nova perícia.
Segundo o perito da Anama, quanto à origem e responsabilidade pela emissão do “pó preto”, está bem clara e bem definida no trabalho feito pela Ufes para o Iema “Caracterização e qualificação de partículas sedimentadas na região da Grande Vitória”.
O advogado da Anama se manifesta na Ação Civil Pública nº 0006596-30.2006.4.02.5001 (2006.50.01.006596-7). O juiz da 4ª Vara Federal Cível, é Ricarlos Almagro Vitoriano Cunha. Além da Vale, são réus na ação o Estado do Espírito Santo, o Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema), a União Federal e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Em ação que foi tornada conexa a esta, a Anama também denuncia a ArcelorMittal por crimes ambientais.
Cita que o laudo pericial do juizo “consignou, em síntese, que a poluição causada pela primeira ré, está dentro dos limites legais vigentes, apesar da não avaliação atmosférica, sobretudo da análise de origem e responsabilidades pela emissão do pó preto, que carece dos estudos específicos propostos pelo perito, que ainda aguardam decisão deste Juízo”.
Ressalta o advogado que o objetivo precípuo da perícia do juizo restou prejudicado, porquanto dependente de avaliação complementar que o próprio perito pediu para medição da qualidade de ar, visto que a atual rede de monitoramento da qualidade do ar da Grande Vitória não permite uma leitura estratificada. “Por essa ausência de avaliação, aliás, que a perícia afirmou não existir elementos suficientemente consistentes para asseverar com certeza e clareza o grau de poluição do ar”, afirma Esdras.
Depois de lembrar também que “foi verificada a necessidade de melhoria dos sistemas de tratamento dos efluentes sanitários” da Vale, entre outros pontos, o advogado da Anama considera imprescindível que seja deferida a perícia complementar sugerida pelo perito.
Esdras destaca que como exposto pela Anama em sua ação, a empresa Ecosoft, que realiza o monitoramento para a Vale, também presta assistência técnica para o réu Iema, ou seja, ela serve ao fiscalizado e ao órgão fiscalizador. “Esse fato que, por si só, já revela a necessidade de que o monitoramento contínuo realizado pela mencionada empresa para a Vale também deve ser objeto da perícia judicial, dentro do espectro de amplitude proposto pelo nobre perito. Além disso, a ré Vale usou metodologia contestada para apontar eficiência das winds fences”, sustenta o advogado.
Seguindo o raciocínio, o advogado da Anama afirma que além disso, o órgão fiscalizador (Iema) é também réu na ação, e, portanto, não pode ser aproveitada sua medição. No mais, o advogado acrescenta que é impossível ao perito dizer se está dentro ou não do padrão, se há ou não nexo causal, se a medição está sendo questionada.
“Ainda, o laudo – que podemos chamar de preliminar”, diz o advogado, afirma que a poluição causada pela Vale está dentro dos limites legais, mas não fala qual é o padrão legal, nem exatamente o que foi constatado no exame pericial. Não há sequer esclarecimento objetivo sobre o quantitativo da emissão de poluição. “A bem da verdade, o laudo não diz de que é composta a poeira na Grande Vitória, levando em consideração as emissões da Vale. Mesmo assim ousa negar o nexo”, destaca Esdras.
Mais incoerências da Ecosoft no laudo apresentado à Justiça é apontado pelo advogado. “O laudo não informa, ainda, qual a quantidade de emissões da Vale em detrimento das outras empresas. Não especifica qual a composição do pó preto nas emissões da Vale. Outra incoerência no laudo é que ele fala de diversas empresas que são fonte da poluição, portanto, com nexo causal com a poluição na Grande Vitória. Todavia, quando se refere à ré Vale ele nega o nexo.
O laudo também é evasivo na resposta ao quesito 10 deste Juízo, onde foi indagado ao perito se a poluição do ar está dentro dos limites da OMS ou órgão internacional equivalente. Especificamente quanto à qualidade do ar, o perito apenas se reporta ao quesito anterior, que reconhece que o monitoramente não funciona”, afirma o advogado da Anama.
Ele conclui que os danos ao solo e à água subterrânea estão provados, tanto pela perícia quanto pelos documentos que acompanham o parecer técnico anexo.
O advogado faz mais crítica: “Além disso, se exercesse o seu dever legal, teria o Iema feito a empresa poluidora reduzir a poluição a níveis recomendados pela OMS e demais órgãos internacionais. Pois, independentemente de existência de padrões objetivos de poluição no âmbito estadual, municipal ou nacional, São padrões de qualidade do ar as concentrações de poluentes atmosféricos que, ultrapassadas, poderão afetar a saúde, a segurança e o bem-estar da população, bem como ocasionar`danos à flora e à fauna, aos materiais e ao meio ambiente em geral [como determina o Conama na resolução nº 3/1990]”.
De acordo com o advogado da Anama, a Vale pode, legalmente, ter suas atividades suspensas. Ele reitera que a empresa não pode alegar que desconhece tecnologias apropriadas para combater o pó preto, como o enclausuramento das pilhas de minério e das áreas de sua transferência, de eficiência próxima aos 100% na contenção das emissões de pátios de estocagem, cuja eficiência é garantida independentemente de fatores climáticos, como o vento, o sol e etc, que propiciam a propagação dos poluentes.
A Vale foi eleita a pior empresa no quesito ambiental do mundo no ano 2013 pela premiação das ONGs Greenpeace e Declaração de Bérnia, a Public Eye People’s, conhecido como o “Oscar da Vergonha”, anunciado no Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça.
Depois de todo o arrazoado, o advogado da Anama requereu ao juiz federal que seja deferida a perícia complementar solicitada pelo próprio perito oficial. Mas, ressalva: “No mais, pelos motivos aqui expostos e pelos constantes do parecer técnico e documentos anexos, ao qual se reporta, ficam impugnadas as conclusões do laudo preliminar da Vale”.