Para o Iemanjah Rastafári, Quarta-feira de Cinzas é Quarta-feira de Brasas. O bloco de rua antiproibicionista sai pelo terceiro ano seguido em Vitória tratando na brincadeira de uma coisa séria – a política brasileira de combate às drogas – e erguendo alto o estandarte da legalização da maconha. A concentração é nesta quarta-feira (18) no Píer de Iemanjá, na Praia de Camburi, a partir, naturalmente, das 16h20.
O espírito brejeiro do Carnaval é ideal para vestir temas espinhosos com a fantasia da irreverência. Marchinhas tradicionais ganham paródias canábicas. Cachaça, por exemplo, fica assim: “Você pensa que Maconha Mata? / Maconha não Mata não / Maconha vem da natureza / É remédio para baixar pressão”. E, como estamos no Espírito Santo, as músicas do congo capixaba também são parodiadas.
“No Carnaval, as pessoas costumam estar despidas de preconceitos e estigmas”, diz o artista plástico Filipe Borba, um dos organizadores do bloco. O problema, portanto, é o antes e o depois da folia, quando a política nacional de combate às drogas insiste em expedientes exclusivamente repressivos.
É o processo que ONGs e especialistas pró-legalização classificam como “Guerra às Drogas”. Esses segmentos sustentam que a política repressiva tem recrudescido os problemas sociais ao invés de remediá-los, razão pela qual defendem um sistema de regulação e controle das drogas ou, pelo menos, da maconha.
Embora de modo geral o bloco levante a bandeira da legalização, este ano o foco é a defesa cultivo pessoal de maconha. Borba explica que a questão vem na esteira da liberação do canabidiol para fins medicinais em janeiro deste ano pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O cultivo doméstico de cannabis para consumo pessoal é considerado uma forma de segura consumo porque: evita a relação direta usuário/tráfico e estimula o consumo de produto de qualidade.
O Iemanjah Rastafári nasceu há três anos, adubado nas edições da Marcha da Maconha em Vitória – a marcha é um movimento social e político que expressa todo ano, em várias cidades do Brasil, em passeatas pró-legalização. Borba e amigos animavam as marchas com paródias musicais: daí para a criação de um bloco carnavalesco foi um tapa. Até porque, hoje, inspiração não falta na folia brasileira. Pelo menos desde 2011, cerca de sete blocos canábicos desfilam de norte a sul no país, entre os quais o pioneiro Segura a Coisa (PE), em atividade desde 1975, e o tradicional Planta na Mente (RJ).
O nome de batismo do bloco une duas entidades que sofreram ou ainda sofrem segregação: Iemanjá, entidade do candomblé e da umbanda, e o rastafarianismo, ou movimento rastafári, crença religiosa que faz uso cerimonial da maconha.