O Tribunal de Contas do Estado (TCE) vai investigar uma denúncia de irregularidades em contratos de obras de reforma e ampliação de escolas estaduais em 2006, durante o primeiro mandato do governador Paulo Hartung. Na última quinta-feira (12), o conselheiro Sérgio Aboudib determinou a notificação do secretário de Transparência, Marcelo Zenkner, para esclarecer as providências adotadas pelo governo sobre quatro auditorias que revelaram o superfaturamento de até 2.700% no pagamento de serviços.
As investigações podem atingir o conselheiro do TCE, Sebastião Carlos Ranna, que chefiava a Auditoria Geral do Estado (AGE), extinta para dar lufar à Secretaria de Controle e Transparência (Secont). Consta na denúncia protocolada pelo ex-presidente da Assembleia Legislativa, o ex-deputado José Carlos Gratz, que o então chefe da AGE teria deixado de assinar as quatro notas técnicas sobre as irregularidades nos contratos firmados pela Secretaria de Educação (Sedu) e pelo Departamento de Estradas de Rodagem do Estado (DER-ES).
Na decisão monocrática nº 254/2015, publicada no Diário Oficial do TCE, o conselheiro Aboudib faz questão de relatar os questionamentos sobre a eventual omissão do colega de plenário. Durante a instrução do processo, a área técnica da Corte constatou que apenas um dos quatro contratos sob suspeição estava sendo alvo de apurações. Com base nessa constatação, o relator acolheu a recomendação dos técnicos do TCE para determinar a notificação do atual titular da Secont para informar se houve resposta às recomendações feitas há mais de oito anos. O prazo para resposta é de 30 dias.
As auditorias foram realizadas entre os dias 17 de agosto a 11 de outubro de 2006. O primeiro caso se refere às obras da EEEM Mario Gurgel em Vila Velha, cujas contratações foram feitas diretamente pela Sedu, sem a participação da prefeitura. A obra foi realizada pela Blokos Engenharia. De acordo com a nota técnica 025/2006, datada de 17 de agosto de 2006, vários itens sofreram superfaturamento, porém, em dois casos, a diferença era abusiva. Os valores pagos na compactação de aterros e aquisição de argila para aterros sofreram um superfaturamento de 363,81%.
Outro caso semelhante foi apurado na nota técnica 028/2006, de 21 de agosto de 2006, onde o alvo dos auditores foi o contrato de manutenção e pequenas reformas em cerca de 50 escolas na Grande Vitória. A vencedora do certame foi a Duto Engenharia que faturou o contrato de R$ 3,74 milhões.Os auditores apontaram que dos 403 itens constantes na Planinha de Quantitativo e Preços, 160 não foram alvo de medições, equivalente a 40% de itens contratados.
O documento da AGE cita alguns itens com um preço no projeto básico muito diferente do orçamento das obras. O item tela retangular teve superfaturamento de 8.042%, remoção de telhas cerâmicas teve alta de 1.572% e um fio de cobre termoplástico isolante com um acréscimo de 1.180%. Além das supostas irregularidades nos preços, a nota técnica fez menção a falhas na execução do contrato, bem como o desvio de prioridades, como a permanência de salas de aula sem envidraçamento, deixando as crianças expostas ao tempo.
As outras duas notas técnicas (027/2006 e 041/2006, de 25 de agosto e 11 de outubro de 2006) tratam de duas obras distintas, a construção do EEEM Renato Pacheco e a reforma do Colégio Estadual, ambas em Vitória. Mas, além do município onde fica localizados, outra coincidência apurada pelos auditores estaduais foi o superfaturamento no preço de matérias e serviços.
Na primeira empreitada, tocada pela Tomazelli Engenharia, Comércio e Planejamento Ltda, os técnicos da AGE detectou irregularidades nos valores pagos pelo aterro da área da construção. Somente esse item teve superfaturamento de incríveis 2.716,98%, o que representou um valor pago a mais de R$ 537,9 mil.
Nas obras do Colégio Estadual, tocadas pela Cinco Estrelas Construtora e Incorporadora Ltda., também foram encontrados diversos itens com preços diferentes do previsto em planilha. O superfaturamento em materiais e serviços alcançou níveis, até então, impensáveis. O documento ainda aponta que a argamassa pré-dosada e proteção armadura tiveram superfaturamento de 1.133%, enquanto a regularização de base para revestimento teve um acréscimo ainda maior, 1.175%.
Repercussão
Esse caso foi denunciado pelo jornal Século Diário em agosto de 2008. Na época, a ONG Transparência Capixaba protocolou uma representação junto ao TCE, em que pediu a apuração do caso com “extrema urgência”. Naquela oportunidade, o deputado Euclério Sampaio (PDT), então opositor ao governo, apresentou um requerimento de informações ao governador Paulo Hartung em relação ao episódio.
Na ocasião, o peemedebista respondeu que não tinha procedência o pedido do deputado e um ofício do responsável à época pela chefia do AGE, Edílson Barboza, afirmou não ter encontrado essas notas técnicas a que reportagem de Século Diário teve acesso. Já o Ministério Público Estadual (MPES) permaneceu silente em relação às suspeitas de corrupção.