Foi para facilitar o agronegócio, principalmente nos plantio de eucalipto, pastagens e café, que os três últimos governos do Estado deixaram de cumprir o artigo 189 da Constituição do Estado, promulgada em 1989. Dois dos mandatos de Paulo Hartung (PMDB), de 2003 a 2010, e no mandato de Renato Casagrande (PSB), de 2011 a 2014.
Esta é avaliação de um dos coordenadores do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) no Espírito Santo, Valmir Noventa, ao analisar a atual crise hídrica no Estado. Aponta que as matas nativas são essenciais para assegurar a formação das nascentes e manter os níveis dos córregos e rios normais, segundo as estações do ano.
Ao invés de cumprir a lei e determinar o plantio de vegetação da mata atlântica, que produz água, os governos do economista Paulo Hartung e do engenheiro florestal Renato Casagrande favoreceram o plantio de eucalipto. A espécie, exótica, é voraz consumidora de água, além de grande consumidora de minerais do solo, a ponto de levar a terra à exaustão, como é constatado no norte capixaba.
Determina a Constituição Estadual, promulgada em 1989, no artigo 189, que “os proprietários rurais ficam obrigados a preservar ou a recuperar com espécies florestais nativas 1% ao ano de sua propriedade, até que atinja o limite mínimo de 20%”.
No artigo 190 é determinado, ainda: “o Poder Público poderá estabelecer, para fins de proteção de ecossistemas, restrições ao uso de áreas particulares que serão averbadas no registro imobiliário”.
No parágrafo 1°: “o Estado, na forma da lei, estabelecerá incentivos aos proprietários das áreas alcançadas pela restrição prevista neste artigo e pela obrigação constante do artigo anterior”. E, no parágrafo: “2°: as terras particulares cobertas com florestas nativas receberão, na forma da lei, incentivos do Estado proporcionais à dimensão da área conservada, e seu proprietário terá prioridade na concessão de crédito”.
Não foram adotadas tais providências, sentencia Valmir Noventa. Medidas? Só pontuais, afirma. O dirigente do MPA acrescenta que nos governos Paulo Hartung e Renato Casagrande, o Estado foi o primeiro a não acompanhar, tampouco fiscalizar o cumprimento da lei. E tudo para beneficiar grandes grupos econômicos no campo, como os que plantam eucalipto, principalmente a Aracruz Celulose (Fibria), e os latifundiários que plantam capim e café.
“O desinteresse em relação ao ambiente visa atender ao interesse do capital. O interesse do cidadão e do próprio Estado, que é a proteção do ambiente e, portanto, também da vegetação nativa, não é contemplado. Os governos têm obrigações de fazer projetos para seus mandatos e estabelecer metas de longo prazo. Nada disso é feito”, afirma Valmir Noventa.
Em sua avaliação, a lógica das grandes empresas é somente o lucro. Desprezam os danos ambientais que afetam a população, como a destruição da mata nativa, produtora de água, e de toda sua biodiversidade. Tanto que não se importam com o uso da água, que é sem limites. É o caso da Aracruz Celulose, Vale, incluída a Samarco, e a ArcelorMittal Tubarão e Cariacica, grandes consumidoras de água.
Mata nativa
O MPA tem se manifestado sobre a questão da produção da água, considerando as necessidades da sociedade. Veja trecho de texto sobre o tema.
“As florestas, dentre suas inúmeras funções, cumprem um papel fundamental na regulação do clima e do ciclo hidrológico. A floresta nativa recebe a água da chuva, e como esponja, a retém e libera aos poucos, alimentando nascentes e o lençol freático, atenuando os efeitos das enchentes e das estiagens.
Um volume de chuvas intensas como o que atingiu o Espírito Santo em dezembro de 2013, se houvesse uma maior cobertura de florestal, sem dúvida teria havido menos inundações, e as nascentes estariam ainda agora com água. Portanto, a floresta regula a velocidade de circulação da água.
Além disso, a evaporação proporcionada pelas florestas impede a formação de massas de ar quente de alta pressão como o que está ocorrendo agora no Sudeste. Se houvesse maior cobertura nativa, haveria mais umidade na atmosfera, permitindo que as frentes frias chegassem até a região chovendo como deveria”.
Atualmente, o Espírito Santo tem apenas 7% de seu território coberto pela mata atlântica. Além da pequena área, a vegetação é muito fragmentada.