Com dois meses de trabalho, os deputados estaduais já criaram quatro Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) nesta legislatura. Mas a abrangência dos temas e as polêmicas surgidas com a criação dos colegiados colocam em evidência os interesses por trás dos trabalhos dos deputados estaduais.
A Assembleia pode funcionar com até cinco CPIs ao mesmo tempo. De fevereiro até agora foram criadas quatro comissões: Pó Preto, Sonegação, Máfia dos Guinchos e Transcol. A única que não trouxe polêmica antes mesmo de começar foi essa última, mas o interesse nela também é facilmente identificado nos meios políticos.
Proposta pelo deputado Euclério Sampaio (PDT), a CPI do Transcol quer investigar denúncias de irregularidades na gestão do sistema. A ideia partiu de denúncias feitas pelo Ministério Público de Contas (MPC) sobre a regra que permite às próprias concessionárias operarem a Câmara de Compensação Tarifária.
O sistema existe desde o governo Albuíno Azeredo, mas, para os meios políticos o recorte já é certo, as apurações devem se concentrar no período Renato Casagrande (PSB). Esta seria uma manobra para tentar desconstruir a imagem do governo passado. Como Euclério é aliado do atual governador Paulo Hartung (PMDB), deve direcionar a CPI nesse foco.
Outra CPI criada no mês passado e que ganhou muita visibilidade por causa das manobras de bastidores é a do Pó Preto. Depois de duas tentativas fracassadas do deputado Gilsinho Lopes (PR) em criar a comissão, em 2013 e 2014, o deputado tentou novamente no início de fevereiro, mas teve a ideia tomada de sua mão pelos governistas e membros da Comissão de Meio Ambiente.
Com a pressão popular para a criação do colegiado, os aliados do Palácio Anchieta manobraram para tomar conta da CPI, dando uma resposta à população ao mesmo tempo em que buscariam formas de amenizar a responsabilidade das empresas poluidoras instaladas na Grande Vitória. Mas a pressão popular acabou denunciando a manobra e chamou a atenção ainda para o lobby das empresas dentro da Assembleia, o que acabou fazendo com que os deputados cedessem um espaço para Gilsinho Lopes (PR) no colegiado.
Na semana passada, mais uma polêmica em torno da criação de CPIs ganhou o plenário. O deputado Enivaldo dos Anjos (PSD) propôs a criação de um colegiado para investigar a sonegação de impostos no Estado. Se os objetivos primeiros da CPI fossem atingidos, as apurações poderiam chegar aos deferimentos fiscais que tomam conta da gestão pública no Estado, mas o rumo foi modificado.
Sob a influência dos deputados que foram presos na Operação Derrama, ocorrida no início de 2013, o rumo mudou e o colegiado parece agora ter o objetivo de recuperar a imagem dos ex-prefeitos e contra-atacar os agentes que promoveram as prisões.
Os interesses nessa CPI passam pelo presidente da Casa, Theodorico Ferraço (DEM), que já se manifestou em relação ao caso no sentido do contra-ataque. A mulher dele, Norma Ayub (DEM), ex-prefeita de Itapemirim, foi presa na operação, assim como os deputados Edson Magalhães (DEM) e Guerino Zanon (PMDB), que inclusive é membro efetivo da CPI.
A polêmica da semana é com relação à criação da CPI dos Guinchos. A iniciativa da comissão é do deputado Enivaldo dos Anjos. O deputado já recolheu 14 assinaturas de adesão. A discussão sobre esse tema cria um atrito com o governo do Estado, que pela fala do líder do governo na Assembleia, Gildevan Fernandes (PV), vem tentando protelar a aprovação de um projeto que proíbe o recolhimento do veículo em caso de não comprovação do pagamento do IPVA. O Palácio Anchieta é contrário à medida, que resulta da diminuição de receita para o Estado.
O histórico de CPIs na Assembleia não aponta para grandes soluções para os problemas investigados. Mas o cenário político atual é outro, o que pode trazer desfechos diferentes para as apurações dos colegiados. Diante de algumas vozes independentes no plenário, caso de Enivaldo dos Anjos, Sérgio Majeski (PSDB), entre outros, a expectativa é em torno do comportamento do plenário em relação a essas articulações.
Nos últimos 12 anos, a Casa teve um comportamento submisso ao Palácio Anchieta e o governo tenta manter esse perfil no Legislativo, mas o atual plenário é heterogêneo e vem mostrando um comportamento incerto. Os deputados aderem à base governista, até um ponto em que as ações não prejudiquem suas próprias imagens com as bases eleitorais. Nesse sentido, o resultado da atuação parlamentar nas CPIs é imprevisível.