Apesar dos tropeços nas áreas políticas e administrativas, o governador Paulo Hartung (PMDB) conseguiu importantes avanços do ponto de vista estratégico nos cem primeiros dias de gestão. No período, o peemedebista caminha a passos largos para a reedição do chamado “arranjo institucional”, que garantiu a governabilidade na última Era Hartung (2003-2010). A principal conquista foi o realinhamento do Ministério Público Estadual (MPES), com o qual mantém boas relações com o chefe da instituição, Eder Pontes da Silva.
Nesses primeiros cem dias, o procurador-geral de Justiça teve no governador um grande aliado para enfrentar o seu principal momento de instabilidade, logo após o anúncio de investigação do Tribunal de Contas do Estado (TCE) em contratos na área de informática do órgão ministerial. Logo após o caso vir à tona, em reportagem publicada em primeira mão por Século Diário, o governador saiu no socorro do chefe do MPES em solenidades públicas, como no pedido de palmas durante o discurso na posse dos novos deputados estaduais, em fevereiro.
Desde então, o governador e o procurador-geral mostraram afinidades em outras solenidades públicas. A mais recente ocorreu no último dia 18, durante a instalação do Comitê Interinstitucional de Recuperação de Ativos (Cira), realizado na sede do Ministério Público. Hartung também nomeou três membros da instituição para compor sua equipe de governo: os promotores Marcelo Zenkner (secretário de Transparência) e Evaldo Martinelli (Ações Estratégicas) e o procurador Sócrates de Souza, recentemente nomeado como corregedor-geral do Estado.
Um antigo parceiro do governador, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) permanece ao lado do mandatário do Palácio Anchieta. Atualmente, o governador tem uma sólida maioria no plenário da Corte, que tem ex-integrantes da equipe do peemedebista em sua composição, casos dos ex-secretários-chefes da Casa Civil de Hartung, Sérgio Aboudib e José Antônio Pimentel. Outros conselheiros mantêm ligação com o palácio, como o ex-secretário de Desenvolvimento Urbano no segundo mandato de Hartung, o ex-deputado Rodrigo Chamoun, além do atual presidente do TCE, Domingos Augusto Taufner, que está longe de ser considerado um desafeto do governador.
Durante a eleição passada, os meios políticos levantaram a possibilidade de utilização do Tribunal de Contas para cooptação de lideranças políticas, sobretudo, no interior do Estado. Apesar das suposições não terem sido confirmadas, tampouco negadas, os bastidores da corte dão conta da influência de Hartung entre os conselheiros mais próximos. Na outra ponta estão os conselheiros Sérgio Manoel Nader Borges e Sebastião Carlos Ranna que, coincidentemente, acabam sendo mais “visados” pela mídia. Fato é que a nomeação de Borges, ex-deputado, até hoje é contestada pelo Ministério Público Estadual e de Contas, bem como o nome de Ranna é alvo de críticas em função de sua atuação na Operação Derrama.
Mesmo com o quadro de estabilidade em relação ao Ministério Público e Tribunal de Contas, o governador não demonstra a mesma sintonia com o Poder Judiciário. No entanto, a relação entre Hartung e o Tribunal de Justiça (TJES) definitivamente não pode ser classificada como ruim – longe disso. Atualmente, o afastamento momentâneo entre o Executivo e o Judiciário se dá mais por conveniência do que por algum mal-estar, apesar do corte de R$ 130 milhões no orçamento do TJES não ter sido bem digerido por setores ligados à magistratura. Hoje, o tribunal enfrenta uma crise interna após as manifestações do desembargador Pedro Valls Feu Rosa, que criticou a demora no exame dos casos de corrupção.
Basta recorrer à história para entender que o perfil de Hartung é de não se envolver durante momentos de crise em outras instituições. Contudo, o governador nem tem do que se queixar, afinal, a Justiça ainda não conseguiu localizar o peemedebista para intimá-lo sobre a ação popular sobre as viagens da primeira-dama do Estado, Cristina Gomes. Hartung conseguiu ainda uma liminar para retirar do ar uma matéria publicada por Século Diário sobre uma empresa familiar do peemedebista.
O governador está próximo ainda de conseguir se livrar da acusação de crime eleitoral, apresentado pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-ES). A sigla pediu a impugnação do registro de candidatura de Hartung por abuso de poder econômico. No entanto, o procurador eleitoral Flávio Bhering Leite Praça opinou pela improcedência da ação por falta de provas sobre a acusação de omissão na declaração dos bens de Hartung.
O parecer acabou sendo respaldado, de forma indireta, pela decisão do corregedor do TRE-ES, Sérgio Luiz Teixeira Gama, que é desembargador do TJES, ao rejeitar a maior parte dos pedidos de produção de provas solicitadas pelo partido. Na manifestação do Ministério Público Eleitoral (MPE), o procurador apontou que não existiriam provas nos autos que indicassem o eventual crime cometido pelo então candidato ao governo. Na ação eleitoral, o PSOL citou que o peemedebista teria omitido patrimônio em sua declaração de bens, entre eles, a “mansão secreta” em Pedra Azul – fato revelado exclusividade por Século Diário, que teve repercussão na imprensa nacional e nos demais veículos de comunicação local.