A implantação do Pacto pelo Enfrentamento à Violência contra a Mulher, firmado pelo governo federal com os governos estaduais, foi um dos principais temas de audiência pública promovida nesta terça-feira (12) pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado, destinada a fazer um balanço sobre os resultados alcançados pela Lei Maria da Penha. Este pacto tem como um dos principais eixos a “Casa da Mulher Brasileira” (CMB), que possibilitará um atendimento amplo para vítimas de violência.
Como informou na audiência a representante da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, Aparecida Gonçalves, ainda neste mês estará em funcionamento a CMB de Brasília, e outras já estão em obras nas demais capitais, incluindo Vitória. Mas a servidora do governo federal reconhece que aspectos relacionados à burocracia, como a lentidão nas licitações e no próprio andamento das obras, tem criado obstáculos “Você coloca os poderes Judiciário e Executivo, o Ministério Público, a Defensoria, todos no mesmo espaço físico e obedecendo a protocolos de atendimento. Além de toda uma estrutura voltada para o acolhimento da mulher e eventuais crianças”, lembrou Aparecida.
Esta estrutura inclui ainda brinquedoteca e a presença de profissionais como psicólogos e assistentes sociais.
Orçamento federal
A reunião foi presidida pela senadora Ângela Portela (PT-RR), para quem o pacto só produzirá resultados efetivos se houver recursos do Orçamento da União com esta finalidade. “Hoje menos de 20% dos municípios têm uma estrutura mínima voltada para o atendimento à mulher. Em Roraima, para todo o estado, existe apenas uma delegacia especializada”, disse a senadora.
A mesma visão foi apresentada pelo senador Donizeti Nogueira (PT-TO), que acredita que as casas-abrigo são caras até para municípios de médio porte. O senador ainda lamentou que, desde a promulgação da Lei Maria da Penha, segundo dados oficiais, mais de 1 milhão de mulheres foram assassinadas e cerca de 500 mil estupradas.
Aparecida Gonçalves alertou aos senadores que a lei já teria produzido uma conseqüência prática, traduzida no aumento das denúncias das vítimas de violência. Um avanço cultural reconhecido também por Donizeti Nogueira.
Resultados da lei
Quem também participou da audiência foi o pesquisador Daniel Cerqueira, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Ele apresentou aos senadores três pesquisas conduzidas pelo órgão, que no entender da instituição indicam que a lei diminuiu o número de agressões às mulheres.
Os estudos do Ipea basearam-se em números oficiais do governo e da Organização das Nações Unidas (ONU) relacionados a casos de assassinato. Desde a promulgação da lei em 2006, as mortes de mulheres por razões de gênero apresentaram um aumento de 10%, número bem inferior a qualquer outra base de comparação durante este período. “Os números de assassinato são indicadores de outros casos de violência grave ou de agressões. Temos muito a avançar ainda, mas podemos dizer que centenas de milhares de mulheres deixaram de ser agredidas desde a vigência da Maria da Penha”, defende o pesquisador.
Cerqueira também acredita que o maior desafio no momento é a efetivação de uma estrutura estatal, integrando estruturas de governo, para que mais estados e municípios contem com delegacias especializadas e casas de abrigo. “A lei desnaturalizou a violência contra a mulher. Vivemos em uma sociedade onde até recentemente se justificavam agressões com argumentos do tipo ‘ela provocou porque estava com pouca roupa’ ou de ‘legítima defesa da honra’”, disse o pesquisador, ao defender que a lei combate o machismo no campo civilizacional.
Cerqueira ainda lembra que a lei atua como “elemento dissuasório”, ao empoderar a mulher e prever punições como a prisão e o afastamento do agressor do mesmo ambiente da vítima. “Antes da lei se punia a agressão à mulher com pagamentos de cesta básica, existem inúmeros casos na Justiça com punições como essa”, disse.