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Judiciário e MPES dão ???pedalada fiscal??? para reduzir gastos com pessoal

O Tribunal de Contas do Estado (TCE) está apurando a prática de “pedalada fiscal” no cálculo dos gastos com pessoal dos órgãos públicos no Espírito Santo. Desde o ano de 2012, a corte vem adotando uma metodologia que lança as despesas com inativos, inclusive, dos demais Poderes, nos limites de gastos do Executivo. Somente no exercício de 2013, foi apurada uma diferença de R$ 167,06 milhões. A Procuradoria Geral do Estado (PGE) já se manifestou contra a prática que teria assegurado que o Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) e o Ministério Público do Estado (MPES) se mantenham dentro dos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Consta no parecer assinado pelo procurador Eliézer Lins Sant’Anna, que data de maio do ano passado, a recomendação para que cada Poder ou órgão autônomo do Estado computasse na despesa total com pessoal (DTP) as despesas com inativos e pensionistas. O parecer foi claro: “não se admitindo a transferência ao Executivo de despesas que não lhe é afeta”. O documento foi dirigido à apreciação da chefia da PGE, mas até hoje, a situação continua a mesma com gastos dos inativos do TJES, MPES, TCE e Assembleia Legislativa sendo contabilizados na conta do Executivo.

A polêmica teve início no próprio Tribunal de Contas, que utilizou uma decisão plenária e uma resolução interna, proferidas há mais de uma década para embasar o seu cálculo – que permite aos demais Poderes, inclusive, o próprio TCE, de repassar o valor da contribuição complementar para cobertura de déficit financeiro sem onerar os limites da LRF. Desde então, o repasse da cobertura do déficit previdenciário dos aposentados do TJES, MPES, TCE e da Assembleia é feita de forma extraorçamentária para o caixa do Estado. No entanto, esses gastos não eram computados pelos demais Poderes.

Durante a análise do relatório de gestão fiscal do 3ª quadrimestre de 2013, o TCE admitiu uma diferença entre o valor declarado pelo governo (51,69% da Receita Corrente Líquida do Estado) e o apurado pela corte (53,28% da RCL), que hoje já ultrapassa o limite de alerta (previsto na LRF em 54% da RCL).

Com base neste processo (TC 1635/2014), a Procuradoria do Estado questionou os dois instrumentos utilizados para realização desse cálculo. “Ao se proceder a análise de um e de outro instrumento [decisão plenário TC 006/2001 e Resolução TC 189/2003], é de se verificar que nenhum deles dão azo à prática agora adotado pelo Tribunal de Contas”, afirma o autor do parecer. De acordo com Lins Sant’Anna, o Tribunal de Contas não tinha o “poder de conferir interpretação à própria LRF que esteja completamente dissociada de seus termos”.

A interpretação peculiar se deu da seguinte forma: a legislação obriga cada órgão ou Poder a contabilizar os gastos com os seus servidores inativos, porém, as decisões do TCE permitiram que as despesas dos demais Poderes fossem computadas dentro dos limites do Poder Executivo, no caso dos aposentados até o dia 3 de maio de 2000, data de promulgação da LRF. No entanto, os órgãos seguiram fazendo a contabilidade desses gastos na conta do Executivo, apesar dos recursos saírem de seu próprio caixa.

O reflexo disso é que a proximidade dos índices de alerta pelo Poder Executivo está servindo de justificativa para a não adoção de medidas, como a contratação de novos servidores, realização de concursos públicos, atualização dos planos de cargos e salários das atuais carreiras. Além disso, o recente alerta recebido pelo Estado acabou dando suporte ao discurso do governador Paulo Hartung (PMDB) na tentativa de criminalizar o seu antecessor, Renato Casagrande (PSB), pela elevação de gastos com pessoal.

Por outro lado, a “pedalada fiscal” garante a possibilidade de ampliação indiscriminada dos gastos com pessoal dos demais Poderes, sobretudo no Judiciário e Ministério Público, mesmo sem a real possibilidade, caso os valores fossem computados da forma sugerida pela PGE. Por exemplo, uma das medidas que seriam prejudicadas é a pretensão do órgão ministerial na criação de 216 cargos comissionados de assessor, não valendo sequer a justificativa do procurador-geral de Justiça, Eder Pontes da Silva, sobre a “troca” por 70 cargos de promotor. Para efeitos da LRF, são contabilizados apenas os gastos já existentes – são excluídas as despesas por suposição, caso dessas vagas de promotor, que não foram ocupadas.

A reportagem de Século Diário consultou fontes do governo que essa diferença foi próxima a R$ 180 milhões no ano passado. Deste total, o Tribunal de Justiça responde por quase 65% da diferença, enquanto o MPES responde por outros 30%. Justamente, os dois órgãos que estão próximos de superar os limites da LRF, mesmo com a manobra fiscal. O primeiro fechou o balanço do primeiro quadrimestre de 2015 com uma despesa total com pessoal (DTP) de R$ 699,5 milhões – entre maio de 2014 e abril deste ano -, que representa 5,95% da Receita Corrente Líquida (RCL) do Estado. Pouco menos e R$ 6 milhões abaixo do máximo, que é 6% da RCL (equivalente a R$ 705,3 milhões).

No caso do Ministério Público, a despesa bruta com pessoal registrou uma alta de 12,2% nos quatro meses de 2015 – R$ 82,33 milhões contra R$ 73,37 milhões no mesmo período do ano anterior. Atualmente, o órgão ministerial está próximo dos limites estabelecidos na LRF. Entre os quadrimestres dos dois anos, o índice de comprometimento com salários e benefícios dos membros do MPES (promotores e procuradores de Justiça) e servidores subiu de 1,69% para 1,72% da RCL, sendo que o limite máximo – termo adotado pela LRF – é de 2%%, enquanto a margem prudencial é de 1,90% e de alerta (1,80%).

No caso dos órgãos do Poder Legislativo – Assembleia e Tribunal de Contas –, a pequena elevação nos gastos com pessoal no período não é motivo de preocupação, já que estão longe do limite legal, podendo fazer o computo das despesas com inativos sem maiores problemas: as despesas com pessoal no TCE saltaram de 0,82% para 0,848% da RCL – o limite de alerta é de 1,17% -, enquanto a Assembleia registrou uma elevação de 1,18% para 1,21% (limite de alerta é de 1,53%).

Chama atenção que a manobra fiscal com gastos com inativos não é o único instrumento para manter os Poderes dentro dos limites da LRF. Também por decisão do TCE, os órgãos públicos conseguiram retirar os chamados “penduricalhos legais”, que são considerados como despesas com exercícios anteriores, do cálculo do rol de despesas para efeitos da lei.

Sem o ajuste, as despesas com pessoal do TJES foi de R$ 688,44 milhões no ano passado, o que daria 5,83% da RCL, ultrapassando o limite prudencial. No caso do Ministério Público, o gasto total com pessoal foi de R$ 239 milhões – equivalente a 2,02% da RCL –, porém, a conta que valeu para efeitos do cálculo da LRF teve o abatimento de R$ 44,12 milhões a título das despesas não computadas, o que garantiu o atendimento a todos as “réguas” da lei.

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