Uma manobra apontada como criminosa, envolvendo o Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal (Idaf) e o Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema), está sendo realizada em favor da Aracruz Celulose (Fibria).
O objetivo é licenciar pelo menos 12.900 hectares (pode ser 17.017,75 hectares) para a empresa plantar eucalipto na região noroeste do Espírito Santo. O volume dos plantios coloca em risco toda a bacia do rio Cricaré (chamado São Mateus, na cabeceira), no noroeste e norte do Espírito Santo.
A denúncia é do Movimento Social a Favor das Águas Norte-Capixabas, que se define como ONG sem fins lucrativo. A ONG historia que desde 2013 tramita o processo administrativo Idaf n. 62426109, da Aracruz Celulose (Fibria). No processo é formalizado o pedido de Licença Prévia (LP) e de Instalação (LI) para a implantação de uma mega silvicultura compreendida por uma poligonal abrangente a quatro municípios do do Espírito Santo. Totaliza a área de 12.900 hectares, diz a denúncia.
O Movimento Social a Favor das Águas Norte-Capixabas assinala que o Espírito Santo nunca viu um plantio “desta magnitude”. Este tamanho “vem causando tanta preocupação à sociedade local e às autoridades públicas”.
“Tramita na surdina processo administrativo de um gigantesco licenciamento ambiental de eucalipto em nome da Fibria, atualmente ativo o Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema). A sociedade afeta ao empreendimento vem gritando insistentemente para todas as autoridades como Polícia, Ministério Público, outras secretarias, porém ha uma apressada e criminosa manobra para aprovar a toque de caixa antes de finalizadas as investigações em curso nos órgãos de investigação”, denuncia o movimento.
Aponta que o processo é um verdadeiro crime, “burlando todo interesse social da sociedade. Os interesses de dezenas de comunidades vêm sendo atropelado em nome de um interesse empresarial, um mal planejado e megalomaníaco plantio de eucalipto, financiados pela Fibria, que vão destruir os recursos hídricos da região. A Fibria se nega a fazer estudos técnicos e manobra para aprovar como se fosse uma coisa simples, sem impacto na vida das pessoas”.
A situação foi denunciada a diversos órgãos do Estado e, mesmo assim, querem fazer a sociedade acreditar que não há problemas. “Propina, mentiras, manobras como forma de não escutar os comitês de bacia da região hidrográfica do empreendimento, fraudando o rito, criando outros ritos sorrateiramente para prejudicar a sociedade. Nós, cidadãos de bem do norte e afetos a essa barbaridade, precisamos de ajuda. Esvaziaram a Agência de Águas e não fazem audiências públicas e debates com a sociedade que será impactada no norte”.
A ONG aponta que nem decisão da Justiça Estadual em liminar impedindo qualquer tipo de licenciamento está sendo respeitada. “Mesmo assim a Seama [Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos], Idaf e Agerh [Agência Estadual de Recursos Hídricos] estão desconsiderando tudo e todos para fazer valer o mega-empreendimento travestido de empregos e oportunidades. Ora, plantio de eucalipto não traz absolutamente nenhum retorno para a sociedade, somente consumo degradante de recursos de água, servindo somente para os interesses devoradores da Fibria. Países de primeiro mundo nem mais aceitam esse plantio em monocultura, deixando para os subdesenvolvidos esse papel lamentável”.
O Movimento Social a Favor das Águas Norte-Capixabas tem sede em Mucurici, no noroeste capixaba. Informa que os “processos fraudulentos” produzirão agressão aos recursos hídricos, já escassos no norte do Espírito Santo. Cobra apurações tanto da policia quanto do Ministério Público.
Cobra que seja investigada a Agência Estadual de Recursos Hídricos e convocado o Fórum Estadual dos Comitês de Bacias Hidrográficas do Espírito Santo. E, ainda, que seja ouvido o juiz de Direito de Mucurici, e promotor de Justiça de Mucurici.
Aponta a ONG que “o Idaf, de maneira fraudulenta, sem qualquer tipo de intervenção de sua própria Procuradoria ou da Procuradoria do Estado do Espírito Santo, dispensou licitação para contratar os serviços de consultoria ambiental de uma universidade mineira, com o intuito de camuflar o porte e os danos ambientais envolvidos no empreendimento Aracruz Celulose (Fibria)”.
Também lembra que o Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) apresentado pela Fibria “sequer fez menção às impactações hídricas em bacias e sub-bacias hidrográficas da região do empreendimento. Assim, uma região de extremo estresse hídrico, fortemente abalada pela falta de água, secas e conflitos pelo uso da água, está sendo maçantemente avassalada por mais uma degradação orquestrada pela corrupção do nosso Estado”.
Segue: “É clarividente a criação de um procedimento administrativo próprio para os interesses da Fibria. Esta empresa pagou para comprar um procedimento sumaríssimo junto ao Idaf, poupando, por exemplo, a oitiva da sociedade, dos comitês de bacias hidrográficas, pareceres técnicos minuciosos da Agerh, pareceres jurídicos precisos quanto à legalidade e possibilidade de um empreendimento dessa magnitude”.
A ONG aponta um funcionário de alto escalão do Idaf e ainda com posto elevado na atual administração como parte da folha de pagamento da Fibria. Afirma a ONG que a atual direção do “Idaf vem impondo, a toque de caixa, a passagem do processo pelo Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema), cuja tramitação exige uma série de nuances procedimentais que só ocorrem após toda a tramitação do processo pelas mais diferentes esferas de discussão”.
Lembra a ONG que o tema plantio de eucalipto “já foi alvo de decisão judicial (processo n. 000060809.2014.8.08.0034) do juiz de Mucurici, apoiado na íntegra pelo promotor de Justiça da cidade, que juntos impediram qualquer tipo de plantio de eucalipto, sob pena de multas diárias. A mesma questão foi alvo de investigação pelas procuradorias municipais de São Mateus e Conceição da Barra, com forte atuação das respectivas Câmaras de Vereadores, mas nada parece surtir efeito”.
Diz a nota que centenas de caminhões-pipa são retirados de toda a região do norte capixaba para atender os plantios de eucalipto da Fibria, e ninguém fala nada. “O poder da empresa, grande contribuinte de campanhas da bancada legislativa da Assembleia Legislativa, e grande apoiadora do atual governo do Estado, parece não ter fim, tendo contaminado a Agerh, o Idaf, a Seama, o Poder Judiciário e o Ministério Público Estadual. Este último, para nossa maior surpresa”.
A entidade aponta que cada plantio de silvicultura da Fibria (são dezenas) utiliza em média 1,25 milhão de litros de água diariamente, e que nenhum comitê de bacia hidrográfica está sendo ouvido. Lagoas, córregos, nascentes e grandes reservatórios de água subterrânea vêm desaparecendo e a sociedade está amordaçada à espera de um final trágico e muito previsível.
“A ação da Fibria é uma barbárie cometidas contra as comunidades locais de Mucurici, Ponto Belo, Montanha e Pinheiros. Trata-se de não podemos aceitar a destruição da vegetação nativa e o mais precioso bem natural da vida, a água”.
O Movimento Social a Favor das Águas Norte-Capixabas cita que a ação da Promotoria de Justiça de Mucurici, que rés as empresas Fibria S/A e Suzano S/A, identificam as empresas como grandes vilãs do meio ambiente estadual. No referido processo, o promotor descreve que o empreendimento fraudulentamente em andamento criará “massivos e seríssimos danos ambientais e sociais caso os projetos de plantios de eucalipto em Mucurici e Ponto Belo sejam executados, evidenciando que a paisagem natural e construída que atualmente existem nos municípios serão drasticamente impactadas pelos possíveis eucaliptais, com risco maior de êxodo rural”.
Acolhendo a integralidade dos pedidos da promotoria, registrou o juiz de Direito da causa: “Tradicionalmente, encontra-se a cultura associada a contextos sócioeconômico-ambientais delicados, por importar no manejo da mata nativa e plantada, na captação dos sempre escassos recursos hídricos, na alteração da produção econômica historicamente desenvolvida nas regiões afetadas, no fomento da monocultura extrativista e do oligopólio” .
Mas a decisão não foi aceita passivamente. As empresas fizeram o agravo de instrumento n. 000037138.2015.8.08.0034, tendo o Tribunal de Justiça mantido a decisão e determinando a proibição de plantio de eucalipto na região norte capixaba.
A ONG segue ainda o arrazoado contra a Fibria, para depois finalizar com requerimentos. “Que seja ouvido Paulo Renato Paim, presidente da Agerh; Hélio de Castro, atual presidente do Fórum Capixaba de CBHs; e ainda o juiz de Direito e o promotor de Mucurici”.
Também requer que “sejam imediatamente apurados fraudes e crime de desobediência, caracterizados no descumprimento da ordem liminar concedida pelo juízo de Mucurici e mantida pelo Tribunal de Justiça”. O próprio Movimento Social a Favor das Águas Norte-Capixabas pede para ser ouvido na Câmara dos Vereadores de Pinheiros.