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Com base em carta anônima, juiz expede mandado de busca e apreensão contra advogado

Imaginem o susto de acordar e dar de cara com quatro homens desconhecidos dentro da sua casa. Foi exatamente o que aconteceu na manhã desta quarta-feira (24) com o advogado Marcos Dessaune
O advogado, que costuma dormir com protetores auriculares, não ouviu quando os policiais esmurravam a sua porta às 7 da matina, gritando: “Abra, e a polícia”. 
Depois de passarem uma hora em vigília na frente do apartamento, com direito à plateia da vizinhança, a chegada da empregada permitiu a entrada dos policiais. Quando Marcos acordou, assustado, deu de supetão com os policiais já na sua sala. 
Mas o segundo susto viria em seguida. O delgado Petterson Gimenis explicou ao advogado que estava cumprindo um mandado de busca e apreensão, expedido pela Primeira Vara Criminal de Vila Velha. 
Antes que o advogado se refizesse do susto para entender o que estava acontecendo, o delegado explicou que estava atrás computadores, pen drives e mídias eletrônicas, o que seria, em tese, razoável, já que Gimenis é o titular da Delegacia de Repressão aos Crimes Eletrônicos (DRCE).
 
 
O advogado, cauteloso, junto com os dois representantes da Ordem dos Advogados que acompanhavam o cumprimento do mandado, notou que o mandado se restringia a “localizar e apreender armas, munições e drogas, e quaisquer outros elementos de convicção eventualmente encontrados no local, relacionados com o delito que está sendo apurado”. 
Foi explicado ao delegado, que no mesmo local de moradia de Dessaune funcionava também seu escritório de advocacia que, com base na lei, é inviolável. O delegado, após vistoriar e não encontrar armas, drogas e munições no apartamento, examinou, à distância, o cômodo que abrigava o escritório, considerou pertinentes as alegações e concordou que precisaria de um mandado específico para apreender os eletrônicos de trabalho do advogado. 
Como nossa Justiça voa, quando convém, horas depois o delegado estava de volta à casa de Dessaune com o novo mandado. Esse com plenos poderes para sequestrar tudo que fosse relacionado ao delito que estava sendo apurado. 
Mas o advogado, até então, nada sabia sobre o tal “delito”. O segundo mandado, porém, esclarecia que “a medida objetiva possibilitar a responsabilização criminal dos agentes que, em tese, invadiram o dispositivo de informática do sr. Carlos Magno Moulin Lima”. 
A partir do segundo mandado a história começava a fazer sentido e se tornar ainda mais absurda. Enquanto a polícia cumpria o novo mandado, levando computadores e eletrônicos, Dessaune, acompanhado de sua advogada, Elisângela Melo, levava o caso de violação de prerrogativas à Seccional da Ordem.
A esta altura a advogada já havia descoberto que o juiz José Augusto Farias de Souza, da Primeira Vara Criminal de Vila Velha, expediu os mandados com base em uma carta anônima.
Uma história mirabolante
Teria chegado às mãos do juiz uma carta anônima de um hacker que, em tese, é um criminoso, denunciando um crime que teria sido tramado pelo advogado Marcos Dessaune
O advogado teria contrato os serviços do hacker para invadir o computador do juiz Carlos Magno com o intuito de criar perfis falsos nas redes sociais para criminalizar o juiz. Qual seria a motivação do hacker para entregar todo o plano à Justiça e arriscar sua própria cabeça? Vingança. Na carta, o hacker teria dito que levara um calote do advogado que contratara seus serviços criminosos. 
A advogada Elisângela Melo, que tem 20 anos de experiência em direito criminal, confessa que não se lembra de nenhum caso em que o juiz tenha se baseado numa denúncia anônima tão mirabolante para expedir um mandado de busca e apreensão, que é uma medida extrema.
Elisângela assinalou que a mesma delegacia que cumpriu o mandado desta quarta (24), fora acionada pelo seu cliente justamente para denunciar o uso de perfil falso por parte do juiz Carlos Magno Moulin para caluniar e difamar Dessaune
A Delegacia de Repressão aos Crimes Eletrônicos está investigando, ou deveria estar, a conduta do juiz Carlos Magno Moulin, acusado de manter um perfil falso no Facebook. O “fake” Leonardo S. V. Silva era usado a partir do computador pessoal e do celular do juiz. Embora o boletim de ocorrência tenha sido feito há mais de seis meses por Dessaune, que conseguiu a identificação judicial do usuário que estava por trás do perfil falso, as investigações, até agora, não avançaram. 
“Meu cliente foi até a delegacia, se identificou, apresentou as evidências materiais que identificavam o autor dos perfis falsos, mas até agora nada aconteceu. Ninguém foi na casa do juiz fazer busca e apreensão de computadores. Agora, com base em uma carta anônima, fazem uma verdadeira devassa na casa e escritório do meu cliente”, criticou a advogada. 
Elisângela afirmou que a Seccional capixaba da Ordem também está indignada com esse caso extremo de violação de prerrogativas, e solidária, como não podia ser diferente, ao advogado. 
“Conversei com o presidente da Ordem [Homero Mafra] que classificou o fato ocorrido como absurdo. Ele prometeu que adotará medidas enérgicas em defesa das prerrogativas do advogado”, afirmou Elisângela. 
Mafra repudiou a violação sofrida pelo advogado.  “Admitir que carta anônima possa dar ensejo à busca e apreensão seja contra quem for, mais ainda contra advogado, é dizer que Estado de Direito não existe, é dizer que a Constituição da República não existe, é dizer que nós estamos submetidos aos príncipes do Poder Judiciário, é negar tudo que levamos tanto tempo para construir. Isto é de uma insensatez absoluta, é a certeza de que a máquina se coloca a serviço de interesses que não são os melhores”, criticou o presidente da Ordem.
A documentação da violação ocorrida nesta quarta-feira (24) foi remetida a Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que está acompanhando de perto o caso. 
Aliás, o Conselho Federal, em outubro do ano passado, protocolou duas reclamações disciplinares no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contra os juízes Carlos Magno Moulin Lima, e seu primo, Flávio Jabour Moulin, por violações às prerrogativas profissionais do advogado Marcos Dessaune. A medida faz parte dos desdobramentos do parecer da Comissão Nacional de Defesa das Prerrogativas e Valorização da Advocacia (CNDPVA), que concluiu pela prática de abusos por parte dos magistrados, como a utilização de perfis falsos para difamar o advogado.

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