segunda-feira, novembro 18, 2024
21.9 C
Vitória
segunda-feira, novembro 18, 2024
segunda-feira, novembro 18, 2024

Leia Também:

Nas lentes de Tadeu Bianconi, o cotidiano diverso de uma fotografia nascida no Espírito Santo

 
Diante da tela do computador, no escritório de trabalho, em Jardim da Penha, Vitória, o fotógrafo Tadeu Bianconi exibe atento algumas das fotos que “clicou” (como costuma falar), durante suas viagens, após um ano morando em Bergen, Noruega. O encanto com os locais por onde passou só não é mais chamativo que a boa memória do fotógrafo em contar cada uma das histórias que estão por trás das fotos. Do “avião das balas” a um casal de namorados deitados numa praça, ele resgata o que viu em cada momento; como resolveu fotografar e, narra com detalhes as histórias dos locais, das estátuas, das praças, dos museus – que por sinal é uma de suas paixões – e dos tantos outros cenários por onde passou. 
 
Tadeu Bianconi, que é de Colatina, da “princesa do norte”, carrega muitos anos de histórias no seu currículo. Hoje, diante da extensa produção fotográfica que realizou, ele tem o trabalho caracterizado como “fotografia de rua” ou “fotografia do cotidiano”. Contudo, faz questão de afirmar que não é bem assim, não segue uma linha fotográfica única – e nem pretende seguir. Bianconi não tem a preocupação em definir o tipo de trabalho que desenvolve, já que seriam necessárias diversas classificações para definir todas as vertentes que ele adotou e adota na hora de fotografar. 
 
“O fotógrafo precisa andar, precisa viajar, mesmo que por distâncias curtas. Isso é importante por causa da luz, mesmo estando nos trópicos a luz muda de uma cidadezinha para outra e a gente tem que aprender a vê-la e a saber lidar com ela”, ensina. Luz é o que move muito a fotografia de Bianconi, que já viajou por todos os cantos do Espírito Santo e, sempre que retorna, volta a circular pelo Estado para perceber espaços que não havia dado atenção e clicar em meio a luzes que não tinham tido a oportunidade de perceber.
 
A luz, inclusive, foi um dos grandes desafios para o fotógrafo durante sua estada de um ano na Noruega. “Bergen, cidade da qual passei a maior parte do tempo, é o lugar onde mais chove no mundo. Todo dia chove, tem garoa, tem céu nublado e pouca luz. Mas as vidas das pessoas não param por isso e eu sou fascinando com a forma com que o ser humano consegue adaptar-se. Lá, quando tinha muito sol eles até achavam ruim. Eu logo aproveitava para tirar algumas fotos”, conta.
 
 
Bergen surgiu para Bianconi como um novo lar após a mulher do fotógrafo ganhar uma bolsa de estudos na cidade norueguesa. A família mudou-se para a Noruega e Bianconi a acompanhou durante o último ano, cuidando das crianças e da casa e, claro, procurando tempo para sair e fotografar. “Estar num ambiente novo é ter a possibilidade de fotografar sem o olhar condicionado. Essa visão de estrangeiro sobre a cidade chamou a atenção de pessoas por lá e até me rendeu alguns trabalhos”. Na cidade ele teve a oportunidade de fazer uma exposição num café com algumas fotos que fez em diversos períodos da vida, no Brasil, na América Central e também na Europa – fotografias que conta ter feito pelo prazer de fotografar, sem grandes pretensões. 
 
Por retratar o cotidiano, os lugares, as pessoas e até os objetos, o fotógrafo conta que os projetos fotográficos e as temáticas de suas fotos não são estrategicamente criados previamente, eles vão se formando. Vitrines com manequins, por exemplo, tem chamado a atenção dele pelos lugares por onde passa. Daria para criar uma série de fotos só com as vitrines que já fotografou. Nesse mesmo viés estão as tantas fotos dos museus que visita; dos balões em formatos de bichos que já clicou em diversos locais do mundo; dos objetos decorativos montados a partir de peças de Lego, que são muito comum em cidades da Europa; das diversas vezes que clicou na Vila Rubim, no Centro de Vitória; e outras tantas fotos que podem ser organizadas em exposições e projetos. 
 
“A minha fotografia é fruto dos fragmentos de coisas que eu vou passando. Não penso no que vou fotografar. Aliás, se eu for pensar nisso não sairia foto nenhuma. O banal tem muita beleza, o cotidiano, as pessoas da rua… Se eu parar para mostrar algumas da fotos que eu tirei nos últimos anos… Elas vão desde um talher na mesa a um quadro pendurado num hotel. Isso realmente me encanta, porque tudo o que a gente documenta está entrando em transformação constante, até mesmo o banal está em transformação. Hoje eu passo e fotografo um sinal de trânsito, amanhã esse sinal de trânsito não está mais ali”, detalha ele sobre essa espécie de estilo que tem seguido.
 
 
O fotógrafo pode até realizar uma fotografia “mais solta, mais livre”, como ele mesmo diz, mas isso não quer dizer que não se importe com composição e técnica. Bianconi utiliza com maestria a câmera digital e conhece bem todas as possibilidades oferecidas por ela, mas não deixa de lado a câmera analógica, que também carrega nas viagens que faz. Além disso, ele gosta de migrar entre a possibilidade de fotos coloridas e preto e branco – mesmo enfatizando com mais carinho os fotos que revelam o preto e o branco. Entretanto, apesar de ser da vertente que defende que os novos fotógrafos precisam cada vez mais conhecer todas as regras fotográficas, ele também acredita que é preciso quebrar todas essas regras e ousar, sair do senso comum. 
 
Diante de todas as experiências que vivenciou e dos lugares por onde passou, o fotógrafo ainda mantém muitas ambições. Uma delas é fotografar povos e comunidades da América do Sul. “Não sei se vai dar tempo de fazer, mas tenho o desejo de documentar as cidades da América do Sul, desde os pequenos povoados às cidades grandes. Não só na América do Sul, mas a Central também. Eu gosto muito desses locais porque se formos falar da Europa, ela já está pronta, tem seus problemas sim, mas, de um modo geral, está pronta. Já a América Latina não, você não sabe a que horas o trem chega, como vai ser certa viagem, existe uma certa tensão no ar – de você até ter que vigiar o equipamento para não ser roubado – isso tudo te força a dar o clique certo. Essa tensão da América Latina, de modo geral, me atrai –  não que eu goste de fotografar sobre a tensão, o que eu realmente gosto é de fotografar neste mundo de lógica diferente”.
 
 
E, apesar de ter acabado de chegar ao Espírito Santo, Tadeu Bianconi está articulando uma viagem à Bulgária, onde acontece uma exposição dele em duas cidades. Por já ter viajado, e ainda viajar bastante, ele conta que apesar de considerar-se um fotógrafo do mundo, não se incomoda em ser caracterizado como ‘fotógrafo capixaba’. “Sempre serei um fotógrafo capixaba. A luz que aprendi a fotografar é daqui, minha influência é de uma pessoa que nasceu no interior do Espírito Santo. Serei sempre um fotógrafo capixaba e acho até bom, porque a fotografia produzida aqui precisa encontrar algum lugar, ser mais vista – e nós temos bons fotógrafos aqui, desde os antigos aos novos, que precisam aparecer”. 
 
Diariamente o fotógrafo tem mantido o costume de postar suas fotos na internet. O resultado é imediato. Pessoas de diversos países comentam, gostam e elogiam. A prática se apresenta para ele como uma nova e boa possibilidade de visibilidade, já que ele explica que no Estado ainda há falta de espaço para expor seus trabalhos. “É triste dizer isso, mas talvez as pessoas de fora do Brasil conheçam mais a minha fotografia do que as pessoas daqui do Estado. A exposição que eu fiz na Noruega foi o evento em que mais vendi fotos, e para todo o tipo de gente, desde um professor da escola de arte, até um carpinteiro. Lá as pessoas estão em uma outra sintonia de valorização do artista, de querer entender nosso trabalho”, finalizou. 
 

Mais Lidas