A Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo vai atuar no julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin 5240) contra a norma do Tribunal de Justiça de São Paulo, que instituiu o modelo de audiências de custódia, quando o detido é ouvido por um juiz logo após o flagrante. A decisão é do relator do caso, ministro Luiz Fux, que admitiu a inclusão do órgão como amicus curiae no processo. Com isso, a Defensoria local poderá participar do julgamento, inclusive, com a sustentação oral para defender a eficiência do sistema que também foi adotado no Judiciário local.
Na decisão que admitiu a participação da Defensoria no caso, o relator destacou a pertinência entre a questão discutida na ação – sobre a legalidade ou não da apresentação da pessoa presa em flagrante delito a um juiz de Direito em até 24 horas após a prisão – e a atribuição institucional do órgão. Luiz Fux também garantiu o ingresso no processo da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), que contesta a realização das audiências de custódia. A Adin foi protocolada pela Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol-Brasil).
“Nesse novo cenário de democratização da jurisdição constitucional, a habilitação de entidades representativas se legitima sempre que restar efetivamente demonstrado, de forma concreta, o nexo de causalidade entre as finalidades institucionais da entidade postulante e o objeto da ação direta. […] No caso em exame, há pertinência entre a questão de fundo debatida nos presentes autos e as atribuições institucionais das requerentes, o que autoriza as suas admissões no processo como amici curiae”, concluiu Luiz Fux.
No pedido de ingresso na ação, o defensor público-geral do Estado, Leonardo Oggioni Cavalcanti de Miranda, cita que o órgão capixaba adquiriu “relevante conhecimento prático” após participar de quase mil audiências de custódia realizadas no sistema prisional desde maio deste ano. “Cabe destacar que a matéria ajuizada na Adin atinge diretamente os trabalhos desenvolvidos pela Defensoria Pública, especialmente a do Espírito Santo, segundo Estado do país a implantar as audiências de custódia em toda região Metropolitana”.
O defensor capixaba menciona ainda no texto um breve histórico sobre a implantação das audiências pelo Tribunal de Justiça capixaba, os detalhes da estrutura montada no Centro de Triagem de Viana e o resultado das primeiras audiências. Segundo Leonardo Oggioni, foram realizadas 813 audiências de custódia até o dia 14 de julho, sendo que os representantes da Defensoria Pública participaram de cerca de 90% delas.
Na ação direta de inconstitucionalidade, a Adepol-Brasil defende que este tipo de audiência é uma inovação no ordenamento jurídico paulista, não prevista no Código de Processo Penal (CPP), que somente poderia ter sido criada por lei federal e jamais por intermédio de um provimento autônomo. Para a entidade, o poder de legislar sobre a matéria seria exclusivo do Congresso Nacional. Além disso, segundo a entidade, a norma repercutiu diretamente nos interesses institucionais dos delegados de polícia.
No último dia 21 de julho, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot Monteiro de Barros, se manifestou pelo não conhecimento da ação e, no mérito, por improcedência do pedido. No parecer, o chefe do Ministério Público Federal (MPF) destacou que a regulamentação deste tipo de audiência de custódia partiu do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com o tribunal paulista, a exemplo do que ocorreu em outras unidades da Federação, como nos casos do Espírito Santo, Maranhão e Minas Gerais. O estado do Rio Grande do Sul adotou recentemente as audiências – não sendo citada na manifestação devido ao fato do sistema ter sido lançado na última semana.
“O projeto objetiva permitir que a autoridade judicial não só analise de pronto a existência dos pressupostos de manutenção da prisão e de imposição de outras medidas cautelares, mas também permita o exame da existência de indícios de tortura ou abuso de poder na prisão dos cidadãos. Infelizmente, como se sabe, a despeito da maioria de policiais honestos e dedicados, ainda são numerosos e frequentes os episódios de tortura e abuso perpetrados por policiais contra cidadãos, sobretudo os de condição econômica vulnerável, como é notório e apontam entidades nacionais e internacionais de defesa de direitos fundamentais”, afirmou Janot.
Mesmo defendendo a adoção das audiências de custódia, o procurador-geral da República alerta que o “provimento poderia ter sido mais bem construído e mais adequado a atender à realidade dos órgãos do sistema de justiça se houvesse contato com contribuições de todos eles, notadamente o Ministério Público, a advocacia privada e a Defensoria Pública”. Janot defendeu que o CNJ regulamenta a matéria, enquanto o Congresso Nacional não discipline o assunto por meio de lei específica. A Advocacia Geral da União (AGU) também se manifestou favoravelmente à legalidade e manutenção deste tipo de audiência.