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Juiz repete acusações, mas deixa brechas em tese sobre crime de mando

O juiz Carlos Eduardo Ribeiro Lemos, da 5ª Vara Criminal de Vitória, foi o único ouvido no primeiro dia de júri popular dos acusados de mando do assassinato do juiz Alexandre Martins de Castro Filho. O magistrado voltou a repetir as acusações contra o coronel reformado da Polícia Militar, Walter Gomes Ferreira, e o ex-policial civil e hoje empresário Claudio Luiz Andrade Baptista, o Calu, que estão sentados no banco dos réus. No entanto, o depoimento de Carlos Eduardo, ouvido por mais de cinco horas sob condição de informante, deixou brechas sobre a tese do crime de mando, que é sustentada pela acusação.

Durante o depoimento, Carlos Eduardo não precisou assinar o termo se comprometendo a dizer apenas a verdade, já que não foi ouvido como testemunha. A defesa dos dois réus chegou a levantar o impedimento e a suspeição do juiz no caso. Entretanto, após uma discussão de quase uma hora entre a promotoria e a defesa, o juiz Marcelo Soares Cunha, que preside o júri popular, decidiu pela oitiva de Carlos Eduardo – não como testemunhas, mas apenas como informante.

Na maior parte do tempo, o colega do juiz Alexandre na Vara de Execuções Penais de Vitória se resumiu a confirmar a íntegra de três depoimentos dados por ele no curso dos desdobramentos do crime. No principal deles, concedido ao desembargador Sérgio Gama na instrução do processo que levou à aposentadoria do juiz Antônio Leopoldo Teixeira – também acusado de mando do crime, mas que ainda não foi julgado -, Carlos Eduardo lançou mão de uma série de relatos de eventuais casos de corrupção e crime organizado no Estado. Vários desses episódios acabaram fazendo parte da trama do crime de mando no processo.

De acordo com Carlos Eduardo, ele e o juiz Alexandre passaram a receber ameaças depois de denunciarem irregularidades na Vara sob responsabilidade do juiz Antônio Leopoldo, que comandaria um suposto esquema de venda de alvarás para liberação de presos para o cometimento de crimes em associação com os dois réus. O informante relatou ainda que o tom das ameaças cresceu após a expedição do pedido de prisão e de transferência do Coronel Ferreira do Quartel da Polícia Militar, em Maruípe, para um presídio de segurança máxima no estado do Acre.

Apesar de sempre se referir ao juiz morto como um amigo muito próximo, quase um confidente, Carlos Eduardo preferiu afastar uma ligação direta com o juiz Alexandre de quem se disse apenas um “colega de trabalho”. Mesmo exaltando a atuação conjunta durante a missão especial federal no Estado contra o crime organizado, o magistrado disse que não se recorda da data da designação da dupla – todas durante o período da presidência do tribunal do ex-desembargador Alemer Ferraz Moulin, do qual foi assessor jurídico por três anos antes de ser aprovado no concurso para juiz.

Quando foi questionado pela defesa de Calu, o juiz preferiu dar evasivas, sem responder a perguntas sobre acontecimentos que já haviam citados por ele. Um dos casos foi a representação administrativa feita pelos juízes Carlos Eduardo e Alexandre Martins contra Antônio Leopoldo no Tribunal de Justiça. Durante a primeira parte de seu depoimento, o magistrado falou com firmeza sobre os indícios de irregularidades que teriam sido encontrados por ele e o colega morto.

No entanto, não soube responder sobre o resultado concreto daquela denúncia, cujas suspeitas de irregularidades acabaram sendo afastadas uma a uma – ainda naquela época – pelo desembargador Pedro Valls Feu Rosa, que relatou o inquérito contra Leopoldo no Pleno do TJES, aprovado à unanimidade. A defesa do ex-policial civil chegou a questioná-lo sobre os pedidos de indiciamento – naquele caso, o relator só denunciou o ex-juiz e o Coronel Ferreira.

Essa deve ser uma das brechas exploradas pela defesa na sequência do julgamento. Um dos advogados de Calú, Leonardo Gagno, foi taxativo quanto ao depoimento de Carlos Eduardo: “Ele mentiu o tempo todo. É uma situação delicada. Ele não poderia nem estar aqui, pois tudo que disse foi submetido. Mas a nossa estratégia é perguntar para depois nos defender”. A fase em que ele se refere é a dos debates, que vai acontecer ao final da oitiva dos depoimentos de todas as testemunhas, além dos acusados. O advogado do Coronel Ferreira, Francisco de Oliveira, preferiu não fazer questionamento ao juiz. “É melhor não dar oportunidade à testemunha da acusação”, revelou.

Já os representantes do Ministério Público preferiram não comentar sobre o depoimento de Carlos Eduardo. Os promotores do caso, João Eduardo Grimaldi da Fonseca e Bruno de Freiras Lima, também não avaliaram se a acusação perde força com apenas mais uma testemunha – contra até cinco de cada réu. Eles aguardam somente que os próximos dias “sejam mais produtivos”. Impressão semelhante do pai do juiz morto, Alexandre Martins de Castro, que acompanhou todo esse primeiro dia de julgamento na primeira fila do Cineteatro da Universidade de Vila Velha. “O primeiro depoimento já foi bem completo contra os dois acusados”, avaliou.

Dia de julgamento

Após o longo tempo de espera para a conclusão do julgamento do caso Alexandre – os executores e intermediários já foram condenados –, o clima durante o primeiro dia de júri dos acusados de mando ficou aquém da expectativa. Fora a longa fila formada no início da manhã desta segunda-feira (24) pelas pessoas interessadas em acompanhar o julgamento, nada mais parecia mudar a rotina da universidade particular. Nas ruas de acesso também não se via qualquer manifestação relacionada ao julgamento.

Dentro do local improvisado do júri, o público nos momentos de pico ficou longe da capacidade máxima do teatro, que é de 200 pessoas. A plateia era formada, em sua maioria, por estudantes de Direito, mais preocupados com o início do julgamento – que estava marcada para começar às 9 horas, mas cujos trabalhos só foram abertos às 11h16. A sessão do Tribunal Popular do Júri foi iniciada com a seleção dos sete componentes do Conselho de Sentença, responsável pelo veredicto do caso. Foram escolhidos cinco homens e duas mulheres entre os 17 jurados listados (sete haviam sido impugnados pela defesa e outros três excluídos pelo juiz do caso).

Antes da oitiva das testemunhas, os representantes do Ministério Público tentaram, sem sucesso, questionar a prova de “última hora” lançada pela defesa dos acusados, a gravação de uma conversa entre a mãe de Calu e o promotor Florêncio Izidoro Herzog, que foi o primeiro a atuar nas investigações na morte do juiz Alexandre. No áudio, ele admite que o crime foi um latrocínio (roubo seguido de morte), versão sustentada pela defesa. O pedido foi rejeitado pelo juiz Marcelo Cunha, que atua na Vara do júri em Vitória e foi designado pelo Tribunal de Justiça para atuar especialmente neste julgamento.

A divulgação do áudio, em reportagem publicada no site da revista Veja no final de semana, causou uma mudança de rumo na cobertura do caso. Se antes a tese do crime de mando era o principal mote – jargão jornalístico para definir o assunto da matéria –, a versão oposta acabou sendo lançada nos holofotes da opinião pública às vésperas do júri. Nesta tese, o juiz Alexandre teria sido morto na manhã do dia 24 de março de 2003. após uma tentativa frustrada de assalto a caminhonete que acabara de estacionar em frente a uma academia de ginástica, em Itapoã, Vila Velha.

Logo após a instalação dos trabalhos, o julgamento foi suspenso às 13h24 para o horário do almoço. O relógio marcava 15h17, quando a sessão do Tribunal do Júri foi retomada com a preparação do depoimento de Carlos Eduardo, que começou efetivamente às 16h23 e se estendeu até 20h58. Os trabalhos foram novamente suspensos e serão reiniciados nesta terça-feira (25), a partir das 9 horas.

Será ouvida a última testemunha do MP, o delegado da Polícia Civil, Danilo Bahiense, que atuou nas investigações do crime. Depois serão ouvidas as testemunhas de defesa – duas pessoas arroladas pela defesa de Ferreira não compareceram, o ex-chefe da Casa Militar, o coronel reformado da PM, Luiz Sérgio Aurich, e o ex- subsecretário de Segurança e deputado federal Fernando Francischini.

Todas as testemunhas de Calu compareceram, entre elas, o perito gaúcho Mauro Juarez Nadvorny, colheu depoimentos dos acusados de suposto envolvimento no crime fazendo o uso da Tecnologia de Análise de Voz (LVA), mais conhecida como “máquina da verdade”. O executor do crime, Odessi Martins da Silva Filho, o Lumbrigão, que permanece preso pelo crime, também será ouvido no julgamento.

Encerrada a oitiva dos depoimentos, o julgamento entrará na fase de debates entre a acusação e defesa. De acordo com a legislação, o tempo destinado à acusação será de duas horas e meia e o mesmo tanto para a defesa. Embora seja facultativa, a réplica terá a duração de duas horas e o mesmo tanto para tréplica. Desta forma, a previsão é de que somente essa fase dure cerca de nove horas. A previsão do juiz do caso é de que o resultado do julgamento seja conhecido até a noite de sexta-feira (28).

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