A polêmica sobre o laudo de avaliação é mais uma entre as várias questões envolvendo o empreendimento portuário, que não pode sair do papel até a definição sobre o valor dos terrenos. Apesar da publicação do decreto do então governador Renato Casagrande (PSB) pela desapropriação das áreas, o Estado só poderá tomar posse da área até a conclusão de uma nova perícia – designada pela Justiça – com o objetivo de aferir o valor real das terras. O governo fez o depósito judicial de R$ 27 milhões, mas os representantes da Predial alegam que suas áreas valem mais de R$ 100 milhões.
É justamente essa diferença que alimenta a expectativa em torno do laudo contratado pelo governo e que acabou sendo ignorado, apesar do gasto de verbas públicas na contratação. A cotação atual do Estado tem como base um segundo parecer, feito por servidores da própria Secretaria de Desenvolvimento (Sedes), cujos métodos são questionados pelos proprietários das terras. Isso porque a equipe da Sedes levou em consideração que os terrenos seriam na zona rural, mas os donos dos terrenos sustentam que a área foi loteada, mudando a sua natureza para zona urbana – tanto que alguns lotes chegaram a ser comercializados para terceiros.
Na decisão liminar expedida no último dia 14 de julho, a juíza da 4ª Vara da Fazenda Pública Estadual, Sayonara Couto Bittencourt, acolheu o pedido da empresa, determinado ao Estado a exibição do laudo de avaliação emitido pela Sertha Planejamento, Engenharia e Serviços Ltda sob pena de multa. No entanto, o governo apresentou uma suposta “cópia integral” do processo administrativo da desapropriação, sem, contudo, apresentar o laudo produzido, alegando que o mesmo seria imprestável para fins da avaliação pretendida.
Em petição protocolada no dia 29 daquele mês, a Procuradoria do Estado alega que a empresa não teria prestado nenhum trabalho que resultasse em valores homologados pela Comissão de Avaliação Imobiliária (CAI) da Secretaria de Gestão e Recursos Humanos (Seger). “Tais serviços foram descartados de plano, antes mesmo de terem sido concluídos, o que só ocorre quando os valores apontados pela empresa particular são homologados pela CAI, o que não ocorreu, em razão de indícios de evidentes superfaturamento, não fazendo sequer parte integrante do processo administrativo”, justificou a procuradora Daniela Ribeiro Pimenta Valbão.
O governo justificou ainda que a utilização de servidores públicos efetivos se deu por conta do “temor de que o forte movimento especulativo dos interessados em superavaliar os valores a serem custeados pelo erário”. A peça também afirma que “causou estranheza” o fato dos representantes da Predial terem tido ciência dos trabalhos da Sertha, muito embora a contratação tenha sido publicada em Diário Oficial e conste no Portal da Transparência do Estado o pagamento de R$ 3.529,21 à empresa de avaliação.
No pedido de exibição do documento, os representantes da Predial alegam que o laudo privado “é pertinente e essencial útil, necessário e indispensável à perícia técnica oficial que será realizada muito em breve nos autos da desapropriação”. Na decisão, a juíza Sayonara Bittencourt verificou a existência dos requisitos para o acolhimento do pedido. Ela destacou ainda que a própria empresa Sertha admitiu que está impedida de encaminhar o documento, por força de cláusula contratual com o governo.
Em paralelo a este processo, a Justiça estadual analisa o pedido feito pelo Estado para garantir a imissão da posse na área, permitindo o início das obras – que estavam previstas para o início de 2016. No início de junho, o juiz de Presidente Kennedy, Marcelo Jones de Souza Noto, designou um novo perito para avaliar o valor real dos terrenos. Entretanto, os trabalhos sofreram um atraso após o reconhecimento da suspeição do perito nomeado anteriormente, que exercia função gratificada no próprio governo do Estado. O novo perito deve iniciar os trabalhos em breve, mas o reconhecimento da imissão da posse pelo Estado vai depender ainda do julgamento de agravos de instrumento pelo Tribunal de Justiça.
Outra polêmica envolvendo os trabalhos da perícia é o valor dos honorários a ser pago pelo Estado, que é responsável exclusivo pela produção da prova. O perito anterior havia cobrado R$ 11 mil para a realização da avaliação. Já o novo perito teria cobrado R$ 865 mil, fato que levanta suspeitas sobre a súbita majoração do valor dos serviços. Segundo fontes ligadas ao mercado, a elaboração do laudo deste porte tem um custo estimado entre R$ 5 mil e R$ 10 mil junto a peritos reconhecidos pela Justiça.
A discussão em torno do preço dos terrenos se arrasta desde agosto do ano passado, quando da publicação do decreto de desapropriação das áreas por motivo de interesse público. Apesar de ser um projeto privado, o governo entrou como sócio no empreendimento, que já está na fase de licenciamento ambiental.
O projeto do Porto Central prevê a construção de um complexo industrial e portuário em uma área de aproximadamente 6.800 hectares (equivalente a 68 milhões de metros quadrados). No entanto, a área portuária deve ser de 2.000 hectares (20 milhões de metros quadrados), sendo que a primeira fase pode ocupar 1.500 hectares (15 milhões de metros quadrados), segundo dados divulgados pela TPK Logística, empresa responsável pelo projeto.
A maior polêmica reside no fato de a empresa não constar como proprietária das áreas onde deve ser instalado o porto em Presidente Kennedy. Diferentemente do caso do projeto da Ferrous Resources, também no município – onde os terrenos foram adquiridos pela ZMM Empreendimentos e repassados à mineradora –, as áreas do Porto Central continuam em nome de terceiros, que não têm qualquer relação com o negócio.