A Samarco/Vale continua a poluir a lagoa Mãe-Bá, em Anchieta (sul do Estado), com rejeitos de minério de ferro. A denúncia é do coordenador ambiental da Associação de Moradores do Bairro Mãe-Ba Wever de Almeida Castilho, feita em audiência pública da Comissão de Representação do Rio Doce realizada nessa terça-feira (24), na Assembleia Legislativa. “A mesma lama que eles jogaram no rio Doce, estão jogando em Mãe-Bá”, alertou.
Conhecido como Passarinho, o coordenador ambiental da associação exibiu vários vídeos que comprovam o despejo de rejeitos sem tratamento na lagoa, crime ambiental cometido pela empresa há anos, sem providências do poder público. A mesma omissão ocorre em relação à poluição do ar emitida pela empresa no sul do Estado, que há décadas gera impactos ao meio ambiente e à saúde da população.
Tamanha contaminação por rejeitos, como aponta Passarinho, acabou com a pesca na lagoa, que já foi uma rica área pesqueira. “Hoje não há mais tucunaré, não tem traíra. Até mesmo peixes que sobrevivem em água poluída, como a tilápia, foram dizimados”, afirmou.
Morador de Mãe-Bá há dez anos, o coordenador destaca que a lagoa que dá nome ao bairro, a segunda maior do Estado, está contaminada por metais pesados, entre eles, o mercúrio. Há, também, contaminação por enxofre.
Ele lembrou aos deputados que Samarco/Vale já foi cobrada reiteradas vezes sobre a poluição da lagoa, inclusive, quando foi registrada uma grande mortandade de peixes no local, mas nunca apresentou respostas. O poder público, assim como a empresa, também sabe dos problemas ambientais gerados pela Samarco/Vale na localidade, mas faz “vista grossa”.
O despejo de rejeitos de minério sem tratamento na Mãe-Bá ocorre por meio de um vertedouro que tem na Barragem Norte, localizada dentro da área das usinas da empresa em Ubu, Anchieta. Esta barragem, segundo relatos de moradores, recebe despejos sistemáticos de grande quantidade de minério quando ocorrem problemas na produção, o que é frequente.
O ponto crítico, como apontam, fica próximo a dois locais por onde desce o minério e que, estrategicamente, só podem ser visto de barco ou caminhando pelas margens. Parte da barragem já está assoreada, com profundidade de menos de um metro, e apresenta coloração vermelha.
Denúncias indicam, ainda, que esta barragem teria sido item de condicionante da licença ambiental da Quarta Usina de Pelotização, inaugurada em 2014. A Samarco/Vale deveria ter garantido a limpeza da água, o que só fez até a finalização do processo. Depois de concedida a licença, os órgãos ambientais não promoveram a devida fiscalização. A lagoa da barragem está morta, sem peixes, com apenas caramujos que se alimentam da poluição. Mesmo destino traçado para a Mãe-Bá e suas nascentes.
A Samarco é uma empresa da Vale e da anglo-australiana BHP Billiton – com 50 % das ações, cada -, responsáveis pela maior tragédia social e ambiental da História da mineração, decorrente do rompimento da barragem em Mariana (MG). No Espírito Santo, o crime decretou a morte do rio Doce e ecossistemas interligados, contaminou o oceano, e acabou com o sustento de comunidades que dependem do manancial para sobreviver. Vinte dias depois, a empresa ainda não ofereceu qualquer assistência aos atingidos.
Reincidente
A Samarco/Vale usa a lagoa Mãe-Bá para lançamento de seus rejeitos desde sua criação, em 1977, e já acumula multas por isso. A última delas foi em 2010, no valor de R$ 204 mil, aplicada pelo Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema). Em setembro deste ano, porém, o secretário de Estado de Meio Ambiente, Rodrigo Júdice, garantiu a anulação da multa, infringindo a própria Resolução 004/2011 do Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema), do qual é presidente.
Em 2008, pelo mesmo motivo, a empresa foi multada em mais de R$ 1,3 milhão pelo Iema, após constatação de poluição na lagoa e praias de Mãe-Bá e a praia do Além. Naquela época, a empresa já acumulava R$ 5 milhões em multa no órgão ambiental.
No entanto, não há transparência sobre o destino desse dinheiro que, quando pago, vai para o Tesouro Nacional.
Debate
Após o depoimento do líder comunitário Wever de Almeida Castilho sobre a contaminação da lagoa Mãe-Bá, a Comissão de Representação marcou uma audiência pública na Câmara de Anchieta no próximo dia 2, às 18 horas.
Os deputados afirmam que irão ouvir, ainda, a Companhia Espírito-Santense de Saneamento (Cesan) e o Iema, na próxima terça (1), às 9 horas, na Assembleia.
Uma visita técnica também será realizada pela comissão, porém, sem data definida.