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Em Presidente Kennedy, Amanda Quinta ostenta saldo inexpressivo de realizações

A julgar pela peça publicitária encadernada em A Tribuna do último domingo (20), a prefeita de Presidente Kennedy, Amanda Quinta (SD), vai abrir as portas de 2016 sem ter legado ao município de maior Produto Interno Bruto (PIB) per capita do Brasil uma única obra que lhe faça jus à alcunha de “Emirados Árabes Capixabas”. E nem falamos de portentos arquitetônicos a la Dubai; obras de saneamento já fariam tão bonito quanto.
 
Segundo levantamento divulgado na sexta-feira (18) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Presidente Kennedy é o primeiro na lista dos dez maiores PIB per capita do país, com R$ 715. 193, 70. Os dados são do período 2010-2013. O município tem pouco mais de 11 mil habitantes.
 
O próprio caderno publicitário fornece um bom exemplo da inaptidão administrativa da sobrinha do ex-prefeito Reginaldo Quinta. Uma das ações alardeadas é o programa municipal de segurança alimentar para combater a desnutrição. Cerca de 950 famílias são atendidas. Mas se cada família é composta em média por quatro membros, temos aí 3,8 mil pessoas. Por aí temos uma noção de que um terço de Presidente Kennedy amarga uma situação social vulnerável.
 
Tanto quanto a fama nacional conferida pelas soberbas receitas, Presidente Kennedy também é conhecido pelo descompasso entre cofre cheio e serviço precário. Ninguém entende por quê, mesmo com a burra gorda, obras de infraestrutura básica de pavimentação ruas e avenidas e de instalação de redes de esgoto ainda são tratadas como prioridade, apontadas pelo cidadão kennedense em audiências públicas realizadas em 2013 pela prefeitura. 
 
Desejos compreensíveis para um município com mais da metade da população ainda vivendo sem esgoto. Em 2015, a prefeitura trabalhou com um orçamento municipal de R$ 400 milhões.
 
A vida toda Presidente Kennedy foi uma espécie de vasta fazenda de gado; já foi o maior produtor de leite do sul capixaba. De repente, virou um califado do petróleo com a crença cega de que desfrutará eternamente a vida doce dos royalties. 
 
Veja-se, por exemplo, como o município trata a chegada do Porto Central. Uma celebração. 
 
Complexo industrial e portuário com área de aproximadamente 6.800 hectares (equivalente a 68 milhões de metros quadrados) realizado pelo Porto de Roterdã (Holanda) e pela TPK Logística, em parceria com o governo estadual, o Porto Central escreverá mais uma página triste na história capixaba dos megaprojetos industriais de impacto econômico questionável e passivo social devastador. 
 
Uma história que tem tudo para se repetir. No pico da obra, a construção do Porto Central deve absorver cinco mil trabalhadores. Imagine o impacto de mais cinco mil pessoas numa cidade que mal assiste as 11 mil que já lhe habitam. A prefeitura de Presidente Kennedy festeja obras em seguranças, aquisição de radiopatrulhas, cursos de capacitação, reformas de escolas, construção de creches, pavimentação aqui, drenagem acolá, etc. Mas a maior parte ainda em andamento. Finda a obra, para onde todas essas pessoas irão?
 
A especulação imobiliária é outro fenômeno kennedense fruto da chegada de megaprojetos. Agentes econômicos compraram terrenos em zona agrícola a preço de banana e realizaram a venda dos mesmos já como inscritos em zona industrial a peso de ouro. 
 
O que fica dessa história é que Presidente Kennedy não está se preparando para um cenário pós-royalties. O município de Anchieta é o melhor exemplo para Presidente Kennedy. O anúncio de férias coletivas e o temor de demissões, efeitos do crime ambiental de Mariana (MG), instalaram o pânico em Anchieta, do dono do mercadinho da esquina ao prefeito Marcus Assad (PTB), uma vez que a cidade inteira funciona ao sabor da mineradora. 
 
Em 2014, mais da metade da receita de Anchieta partiu da Quota-parte Municipal do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (QPM-ICMS). No mesmo ano, 74% da receita de Presidente Kennedy foram compostas dos royalties e participação especiais. A participação da receita tributária, do QPM-ICMS e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) na receita total kennedense oscila entre índices de 1,2% e 2,3%. 
 
A certa vocação turística do município poderia ser uma bela e sustentável saída para manter a economia kennedense. Uma saída, no entanto, talvez inviabilizada pelo sequestro da Praia das Neves pelo Porto Central. Trata-se, esta, de uma empreitada deletéria em dois sentidos: semeia problemas sociais e prejudica pendores naturais.
 
Quando o então prefeito reeleito Reginaldo Quinta deixou Presidente Kennedy em 2012, cassado pela Câmara de Vereadores na esteira da Operação Lee Oswald, a população sentiu que perdera um pai. Com mimos e afagos assistencialistas, Quinta granjeou a simpatia de seu povo. O transporte público era gratuito, dava insumo para os agricultores, fornecia ônibus, também gratuitos, para estudantes de faculdades no norte do estado do Rio de Janeiro.
 
Quando não por vias assistencialistas, o poder público se vincula ao kennedense por vias diretas: em 2014, havia no município 91,6 servidores por mil habitantes, o quarto maior índice estadual. No mesmo ano, Presidente Kennedy teve a segunda maior despesa per capita com pessoal do estado (R$ 4,3 mil). O cenário aqui traça o mesmo desenho: aquela riqueza toda ainda não constituiu uma economia dinâmica.
 
No final da história, sobrevive o velho mistério kennedense: para onde vai tanto dinheiro? Como o tio, Amanda Quinta ainda não respondeu.

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