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João Cabral, o mestre talhado na pedra

João Cabral de Melo Neto, este seu nome, de uma poética ou poesia talhada na pedra. Sua rotina é descrita neste poema emblemático de toda a sua obra, as lições de que ele retira o sumo são duras, duras como pedra. Já a sua conhecida letra fria, concisa, neste poema, tem na metáfora da pedra exatamente a dicção própria e a linguagem definida neste ser mineral duro e impassível, a pedra.
 
João Cabral não tem fraco por lírica, mas sua beleza vem da dura lição que ele encarna ou petrifica. João Cabral enumera o Sertão como origem de seu discurso, o mestre talhado na pedra sabe de si neste que é o ser duro de ser pedra, e poema de pedra, educação pela pedra. O poeta aqui não finge dor, não se lamenta, apenas descreve a mecânica de seu trabalho bruto, de poema bruto, puramente mineral, inanimado na imagem da pedra, mas se movimentando nesta descrição de um ser estático.
 
O movimento do poema é definido por poucas linhas, e já são suficientes, João Cabral marca na concisão deste poema o contrário de uma retórica enfadonha de poemas longos, não que ele não os faça, e não por razão de poemas longos serem melhores ou piores do que este, mas a demanda da educação da pedra é muito esta marca concisa, curta e certeira, do que ele quis apresentar como pedra, como a lição fundamental, a educação pela pedra.
 
A EDUCAÇÃO PELA PEDRA
 
Uma educação pela pedra: por lições:
 
para aprender da pedra, frequentá-la;
 
captar sua voz inenfática, impessoal
 
(pela de dicção ela começa as aulas).
 
A lição de moral, sua resistência fria
 
ao que flui e a fluir, a ser maleada;
 
a de poética, sua carnadura concreta;
 
a de economia, seu adensar-se compacta;
 
lições da pedra (de fora para dentro,
 
cartilha muda), para quem soletrá-la,
 
 
 
Outra educação pela pedra: no Sertão
 
(de dentro para fora, e pré-didática).
 
No Sertão a pedra não sabe lecionar,
 
e se lecionasse, não ensinaria nada;
 
lá não se aprende a pedra: lá a pedra,
 
uma pedra de nascença, estranha a alma.
 
 
 
(João Cabral de Melo Neto, do livro A Educação Pela Pedra, da edição Poesias Completas da José Olympio Editora)
 
 
 
Nota: Caros leitores, estou saindo de férias, o espaço de poesia e as resenhas no caderno de cultura voltam no fim de janeiro com novidades, abraços e boas festas!)
 

Gustavo Bastos, filósofo e escritor

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