Responsável por poluir o ar da Grande Vitória e derramar minério e carvão no mar de Camburi há décadas, sem qualquer punição, a Vale considera complicado e oneroso adotar providências para reduzir os impactos que provoca. É o que argumenta em recurso apresentado ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), no processo originado da operação da Polícia Federal que culminou com a interdição do Complexo de Tubarão.
Para liberar suas atividades, a Justiça Federal impôs que a empresa adotasse, nos próximos dois meses, medidas para reduzir os danos ambientais. Entre elas, técnicas mais modernas e eficazes para estancar ou reduzir ao mínimo as emissões e resíduos despejados no mar; apresentação de relatório técnico com o detalhamento das medidas adotadas; liberação do acesso ao Porto de Tubarão às autoridades policiais para monitoramento; e o encaminhamento de relatórios mensais sobre as emissões das chaminés de suas plantas industriais no local.
Embora já devesse tê-las adotado há anos, a Vale quer se livrar da obrigação, alegando que as medidas são tão “complicadas e onerosas, que nem ela, nem qualquer pessoa jurídica poderia implementar”. Para a empresa, a decisão do último dia 25 do juiz federal convocado Vigdor Teitel “pecou ao estabelecer o prazo de 60 dias para o cumprimento pela impetrante de condições dotadas de um altíssimo grau de subjetivismo”.
A mineradora diz ainda que não há provas de que cometa crime ambiental ou que provoque a destruição significativa da flora, a mortandade de peixes e danos à saúde da população. “A decisão se ampara na existência de investigações, na suposta ‘notoriedade’ dos fatos referentes ao pó preto que incomodaria os moradores da Grande Vitória e arredores, nas discussões sobre o assunto, em vídeos, filmagens e relatórios”.
No documento, a Vale também contesta a informação do processo de que a melhor técnica para minimizar os impactos das emissões de poluentes é o sistema de enclausuramento das pilhas de estocagem, denominado Domus, para em seguida defender as telas Wind Fences que implantou em Tubarão. Utiliza-se, para isso, de elogios do Ministério Público Estadual (MPES) às barreiras de vento e da celebração do criticado Termo de Compromisso Ambiental firmado com o órgão ministerial.
A empresa, mais uma vez, joga carga no coordenador da Juntos – SOS Espírito Santo Ambiental, Eraylton Moreschi, afirmando que ele “induziu ao erro o prolator da decisão agravada”, em parecer que assinou como assistente técnico da Associação Nacional dos Amigos do Meio Ambiente (Anama) em ação civil pública que determinou perícia na Vale.
Na intenção de desqualificá-lo, a peça de defesa se refere novamente aos depoimentos dos vereadores Davi Esmael (PSB), Rogerinho Pinheiro (PHS) e Vinícius Simões (PPS), membros da CPI do Pó Preto da Câmara de Vitória, ao promotor Marcelo Lemos, em inquérito civil aberto para apurar “irregularidades” na investigação. Repete que Moreschi foi acusado de ter “falseado” o relatório final, “para que dele constassem diversas acusações sabidamente falsas contra a Vale e a autoridades governamentais competentes e até mesmo o Ministério Público Estadual”.
“O mais emblemático exemplo de imprestabilidade técnica dos documentos é o relatório final dos trabalhos da CPI do Pó Preto”, pontua a empresa sobre as declarações dos vereadores, considerada pela defesa “estarrecedoras”. A luta de Moreschi à frente da Juntos – SOS para combater a poluição é classificada no recurso como uma “verdadeira cruzada pessoal contra a Vale”.
A mineradora segue explorando o assunto: “Certamente, caso o relatório efetivamente refletisse a realidade, jamais teriam constatado dele afirmações completamente absurdas, tais como a de que os métodos de fiscalização da Vale não seriam seguros, ou, pior ainda, acusações totalmente infundadas e desacompanhadas até da mais indiciária prova, como a de que existiria uma relação suspeita entre a Vale, os órgãos ambientais, o Ministério Público, o próprio poder legislativo e a prefeitura de Vitória, com vistas a permitir a suposta contaminação do ar e da água”.
O recurso também tenta desqualificar a operação da PF que constatou a poluição gerada pela Vale em Tubarão, tratando o material como uma “simplória filmagem”, além dos “referidos policiais carecerem do conhecimento técnico específico para afirmar se há materialidade do crime”.
Os argumentos da Vale pretendem revogar a decisão que impôs as obrigações, já que seu descumprimento acarretará em nova interdição de Tubarão, como determinado pela Justiça Federal.