Quase um mês após a promulgação da lei que proíbe novos plantios de eucalipto na Serra e estabelece prazo de cinco anos para que sejam encerradas todas as plantações já existentes, sob pena de multa, entidades ligadas ao agronegócio no Espírito Santo publicaram nesse domingo (15) nota em que tratam a decisão da Câmara de Vereadores como intempestiva e inconsequente. Elas se mobilizam para reverter a proibição.
A nota, divulgada como informe publicitário, é assinada pela Associação de Engenheiros Florestais do Estado (Aefes), Centro de Desenvolvimento do Agronegócio (Cedagro), Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-ES), Federação da Agricultura do Estado (Faes) e Sociedade Espirito-Santense de Engenheiros Agrônomos (Seea).
As entidades alegam surpresa com a promulgação da lei e se dizem apreensivas com o que consideram um “embaraço criado pelos nossos legisladores”.
O argumento é de que são falsas as informações e até mesmo crença que os plantios de eucalipto “sugam as águas disponíveis como se fossem bombas d’ água, e danificam o solo, só porque estão prontas para uso em sete anos”. O documento aponta somente benefícios do monocultivo, inclusive a capacidade de sequestrar carbono atmosférico.
“O resultado destas decisões intempestivas e inconsequentes, legislando sobre o que não conhecem, tem causado um desserviço histórico e, em muitos casos, irreversíveis, trazendo enorme prejuízo à sociedade capixaba, por afugentar empreendimentos importantes, eliminando renda e emprego. Na década de 1980, o Estado deixou de receber os investimentos de empresas reflorestadoras, com foco em celulose e madeira. Estas foram se abrigar do outro lado da fronteira, no extremo sul da Bahia”.
A justificativa das entidades, as principais interessadas na manutenção e expansão da monocultura no Estado junto com as empresas da área, contradizem, no entanto, a realidade das localidades onde estão os extensos plantios no Estado, principalmente da Aracruz Celulose (Fibria), que também tem plantios na Serra.
Assim como as entidades que assinam a nota se valem de artigos científicos de pesquisadores para enumerar o que apontam como benefícios dos extensos plantios de eucalipto, há inúmeras pesquisas que atestam o contrário, além dos relatos de entidades e das comunidades prejudicadas pela atividade.
Entre os problemas estão exatamente a relação direta dos plantios com a questão hídrica, a escassez do solo, o uso intensivo de agrotóxicos e o desmatamento, um dos principais responsáveis pelas emissões de carbono na atmosfera.
Nos municípios que concentram a maior extensão desses plantios, São Mateus e Conceição da Barra, no norte do Estado, não há água nem para consumo dos moradores e os córregos e rios estão secos e contaminados. Sem ter mais para onde se expandir na região, as cidades serranas também foram invadidas pelo eucalipto, que avança ainda para as bacias dos rios Jucu e Santa Maria da Vitória, responsáveis pelo abastecimento de água da Grande Vitória.
Os impactos ambientais desta monocultura não são os únicos prejuízos. Há registros de graves problemas sociais, de violações aos direitos humanos, e da total ausência de assistência das empresas, que, no caso dos territórios indígenas e quilombolas, obtiveram as terras para os plantios por processos irregulares, contestados na Justiça Federal.
A Lei 4478/2016 que proíbe os plantios de eucalipto na Serra foi promulgada no último dia 20 pela presidente da Câmara, Neidia Pimentel (PSC). O processo retornou à Casa após transcorrer o prazo para o prefeito Audifax Barcelos (Rede) se manifestar sobre o projeto, aprovado pelos vereadores por unanimidade. A matéria é de autoria do vereador Aldair Xavier (PTB) e tem ainda as assinaturas de Nacib Haddad (PDT), Antônio Boy do INSS (PMDB) e Basílio da Saúde (Pros).
Em sua justificativa, Aldair alertou sobre o elevado consumo de água exigido por essa monocultura, que chega a 36,5 mil litros por ano, com o agravante de os plantios serem feitos próximos aos mananciais e em áreas de recarga, que são os topos de morros e aquíferos. O vereador também destacou os impactos do crime da Samarco/Vale-BHP ao rio Doce, o que reforça a necessidade de se preservar os recursos hídricos.
No Estado, também estão proibidos novos plantios de eucalipto em Mucurici e Ponto Belo, no extremo norte do Estado. Em março deste ano, o Tribunal de Justiça do Estado negou recurso à Aracruz Celulose (Fibria) e manteve a decisão em primeira instância de ação civil pública. A decisão também atinge a Suzano Papel e Celulose, que tem projetos de expansão para a região.