Em 2020 um medo se concretiza: foi instalada uma ditadura religiosa no Brasil. Esse é o mote do curta As Bodas do Diabo, com as travestis Shoshanna e Verônika que se envolvem numa missão de risco para se libertar de um sistema opressor aos seus corpos e personalidade. O curta paulista tem direção de Ivan Ribeiro integrar a 3ª Mostra de Cinema LGBT de Vitória, que se inicia nesta sexta-feira (20), no Cine Metrópolis da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). A entrada é livre.
A história de As Bodas do Diabo e de tantos outros curtas, como Amanhã Já é Outono (foto de capa), da diretora Luciana Bezerra – curta que destaca o relacionamento entre duas mulheres; ou ainda a obra Coisa de Menino, produzida aqui no Estado por Bipe Couto e Dayana Cordeiro – que apresenta a vida do garoto João, de 10 anos, e sua conturbada relação com o pai – trazem à tona as tantas problemáticas com que a população LGBT precisa lidar.
Até domingo (22), a comunidade LGBT terá espaço para apresentar mais temáticas ainda a partir de uma seleção de filmes e curtas que buscaram privilegiar eixos temáticos refletidos nas sessões Cores; Sapatas; Bofes; Trans; entre algumas sessões especiais. A curadoria das obras ficou por conta do ES Cineclube Diversidade.
“Procuramos desenhar a curadoria a partir do momento em que nos perguntamos: afinal, o que estamos a fazer da potência de nossos desejos e os nossos corpos? Definidas essas duas questões, buscamos realidades que pudessem nos trazer histórias e performatizações de corpos fluídos e desejos plurais, que borram normas identitárias, sobretudo quando se trata de transexualidade e travestilidade”, explica Fabrício Fernandez, um dos organizadores da mostra.
Nesta edição, a Mostra de Cinema LGBT de Vitória traz curtas e filmes de diversos cantos do país, como Bahia, São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Minas Gerais, Pernambuco, Brasília entre muitos outros. E claro, com a presença de curtas produzidos no Espírito Santo. Ao todo, cinco representantes capixabas entram na mostra. Contudo, Fabrício conta que ainda almeja alcançar mais realizadores locais.
“É incrível como a produção daqui cresceu. Em 2014, na primeira mostra, fizemos uma sessão com filmes desde a década de 90, quando a cidade realizou curtas com a temática LGBT. Este ano, por exemplo, além dos curtas Coisa de Menino e o Cartas para Eros [de Herbet Fieni], que será lançado na mostra deste ano, vamos exibir o videoclipe, por exemplo, da Banda Velho Scotch, com temática Queer [destina-se a quem deseja escrever a própria história sem se prender às expectativas da heteronormatividade]. Está potente a produção local. Mas seria interessante que quem tenha material experimental também tire da gaveta e participe conosco!”, convoca Fabrício.
Ter acesso aos filmes e curtas de temática LGBT ainda é um pouco complicado. Entretanto, pelo fato de a mostra já estar em sua terceira edição, a acessibilidade às obras fica mais fácil. “Recebemos os filmes com muita agilidade neste ano e chegamos a receber até mais do que nosso tempo de exibição. Foi incrível o crescimento nesse contato. Procuramos chegar a cantos novos, com o filme de um realizador do Amazonas, por exemplo, que fez uma obra em parceria com Cuba. Mas infelizmente, realizamos a mostra na garra. Sem recursos nenhum”, afirma Fabrício. Aliás, a Mostra só recebe o apoio do Cine Metrópolis, que cede o espaço para as exibições.
Conheça mais algumas das obras participantes
Transcorpos
Fabrício, além de um dos curadores, também terá espaço para apresentar um curta, o Transcorpos. “O curta foi uma experiência de vivência com pessoas trans que tive. E daí partimos para a gravação de um poema em off com a Vick, hoje com o nome social Vitória Pastore, que vai estar conosco na mostra inclusive. Gravamos na minha casa mesmo, num estúdio improvisado. Tudo muito na batalha”, explica ele. A obra tem 2 minutos e foi finalizada em 2015.
Cartas para Eros
Cartas para Eros é um documentário produzido no Espírito Santo e que tem direção de Herbet Fieni. Em 35 minutos a obra é uma busca por vestígios materiais da cena transformista e clubber dos anos 90 em Vitória. Cartografando o devir afetivo que essas imagens-recordações desencadeam na processualidade de montagem do filme, o autor se transforma em objeto, deixando-se imergir num constante fluxo de imagens, agrupadas libidinosamente sob o impulso de Eros em seu desejo de criar encontros e relações entre os homens.
O Babado de Toinha
Com direção de André de Oliveira e Julia Aguiar, este curta chega de Serra Grande, na Bahia, para apresentar a personagem Toinha, uma baiana de acarajé pra lá de original e difícil de encontrar parecida. Ela prepara seu próprio azeite de dendê, num processo rústico e artesanal, no qual mergulha com o espírito de Iansã, e que exige dela força pesada e muitos conhecimentos. E dessa cultura popular tradicional, Toinha tira seu sustento. Sua banca está localizada na Vila de Serra Grande, Costa do Cacau, Sul da Bahia.
Serviço
A 3ª Mostra de Cinema LGBT de Vitória se inicia nesta sexta-feira (20), às 17h, no Cine Metrópolis da Ufes – Avenida Fernando Ferrari, 514, Goiabeiras, Vitória. A entrada é livre.