“É uma vergonha”, denuncia o procurador regional do Trabalho, Pedro Serafim, coordenador do Fórum Nacional de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos, sobre e lei (nº 13.301) sancionada pelo presidente interino Michel Temer na semana passada que dispõe sobre medidas de controle do mosquito Aedes aegypti, permitindo a pulverização aérea de agrotóxicos.
Enquanto vários países vêm restringindo cada vez mais a prática mesmo em zonas rurais, Serafim alerta que o Brasil vem agora incentivar a medida também em meio urbano, descumprindo convenções e tratados internacionais de proteção da saúde pública e do meio ambiente, dos quais é signatário.
O coordenador explica que, além do absurdo técnico, a lei também é ilegal e inconstitucional, primeiro, devido a um grave erro de procedimento que foi não ouvir as instituições responsáveis que tratam do tema. O Ministério da Saúde, por exemplo, não foi ouvido e, após sanção presidencial, se manifestou contrário à lei. Há uma semana, diversas outras entidades públicas, acadêmicas, científicas e da sociedade civil têm lançado notas, manifestando-se duramente contrárias à medida.
Serafim denuncia que a aprovação da lei faz parte de uma estratégia de desmonte do sistema de regulação do uso de agrotóxicos no Brasil que, desde 2008, ocupa o primeiro lugar no ranking mundial de consumo de venenos agrícolas, ultrapassando até os Estados Unidos. E alerta que, se ela for executada, pode abrir caminho para aumentar as pulverizações aéreas de agrotóxicos em áreas rurais, que já geram ínumeros impactos às comunidades.
Outra peça importante dessa tentativa de desmonte é o PL 3200/2015, em tramitação no Congresso, que propõe, entre outros equívocos, classificar agrotóxicos e transgênicos como produtos fitossanitários – termo hoje característico da agricultura orgânica – e retirar os Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente da consulta obrigatória para a liberação de agrotóxicos no país, deixando a tarefa exclusivamente para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
O Fórum também já está se mobilizando contra esse PL e clama pela participação popular e engajamento da imprensa para retirar o Brasil do topo do ranking de consumo de venenos agrícolas. “O Espírito Santo, por exemplo, ainda não aderiu ao Fórum nacional”, convoca Serafim.
A imprensa nacional chegou a divulgar que o presidente interino estaria considerando a possibilidade de revogar a nova lei que permite a pulverização aérea, mas segundo o coordenador do Fórum, nada oficial ainda foi comunicado. Enquanto isso, o grupo busca uma forma jurídica de suspender a execução da lei. Composto por entidades da sociedade civil com atuação em âmbito nacional, órgãos de governo, Ministério Público e representantes dos setores acadêmico e científico, o Fórum é um instrumento de controle social articulado com outros 21 fóruns estaduais.
Em terras capixabas, a pulverização de venenos agrícolas provocou uma tragédia denunciada nacionalmente em 2011, quando a aplicação de venenos sobre uma monocultura de café contaminou crianças em uma escola rural e algumas comunidades rurais em Vila Valério, noroeste do Estado. Em resposta, a população conseguiu mobilizar a Câmara de Vereadores e aprovar uma lei proibindo esse tipo de sobrevoo no município. Marijani Luck, militante local do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), percebe que a lei tem sido cumprida em Vila Valério e que tem havido uma redução considerável nas aplicações aéreas de agrotóxicos na região. Uma vitória local comprovando que, como diz o ditado, “só o povo salva o povo”.