Fotos: Sindaema
Se em São Mateus o drama do mar de irregularidades e omissão faz pingar água salgada nas torneiras, em Sooretama, também no norte do Estado, a situação consegue ser ainda mais grave: há mais de três não pingava uma única gota d'água nas caixas d'água do município. O verbo está no passado porque nesta sexta-feira (8), passados cerca de 100 dias, uma água amarelada e com gosto de ferrugem voltou a escorrer, mas é só por esta sexta. No dia seguinte, sempre volta “tudo ao normal”.
Mudanças climáticas, desmatamento, monoculturas de eucalipto e pastagens … sim, as causas históricas da crise hídrica no norte e noroeste do Estado são conhecidas há muito tempo e precisam ser remediadas em médio e longo prazo. Mas há municípios onde a omissão dos gestores locais intensifica a situação. Sooretama é talvez o caso mais assustador.
Em Sooretama, o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae) está sendo sistematicamente sucateado há muito tempo. Há cerca de quatro anos, numa audiência pública da Câmara de Vereadores onde se debatia a possibilidade de privatização da autarquia, uma liderança comunitária perguntou ao presidente da Casa se ele servia água do Saae pra sua família. A resposta foi negativa.
Hoje, quem olha a situação dos equipamentos e o órgão como um todo pensa estar diante de um cenário de guerra de algum lugar abandonado, fantasma. Além da falta absoluta de equipamentos mínimos de tratamento e medição, há vazamentos graves de água nas tubulações, instalações elétricas precárias e extintores de incêndio vencidos há mais de cinco anos, configurando não só falta de estrutura para garantir qualidade no serviço, mas também de segurança aos trabalhadores.
E enquanto a municipalidade sustenta sua omissão e irresponsabilidade, a população convive com a “água podre” – que vem de lagoas e barragens, visivelmente sem condições de uso – e sem regularidade, com algumas ruas ficando sem carros-pipa por até quinze dias. Quem pode fura poços artesianos, que custam de R$ 5 mil a R$ 6 mil, ou compra água de carros-pipa particulares, a cerca de R$ 35,00/mil litros. Pra beber, só mesmo água mineral, que hoje está em torno de R$ 6,00 o garrafão de 20 litros (custava R$ 4,50 a R$ 5,00).
“Até a Polícia ameaçou fechar as portas porque os banheiros estavam imundos”, denunciou uma moradora que não quis se identificar. Pois é, outro agravante de Sooretama é a ausência de mobilização social. As pessoas têm medo de se organizar, denunciar, reivindicar, mesmo após um bem-sucedido (e único) protesto popular, quando a prefeitura furou um poço no bairro Sayonara, após manifestação dos moradores. “Aqui ninguém tem coragem”, lamenta a moradora.
O Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente (Sindaema) é uma das poucas instituições que ainda consegue ter alguma atuação em favor da população nessa questão do (des)abastecimento de água. Mas ainda não conseguiu retorno.
A primeira solicitação de reunião com o Ministério Público, feita em março, até agora não teve resposta alguma. Outra solicitação, com o novo promotor, foi feita nesta sexta-feira (8). O apelo é para que o Ministério Público do Estado (MPES) se reúna com o Sindicato e outras entidades para discutir o que fazer com relação à grave crise hídrica na região, especialmente nos municípios de São Mateus, Sooretama e Linhares.