A Câmara dos Deputados pode colocar em votação, a qualquer momento, o substitutivo ao PL 3729/04, projeto de lei que busca criar um novo “sistema” de licenciamento ambiental. O substitutivo elaborado pelo deputado Mauro Pereira (PMDB/RS), relator da Comissão de Finanças e Tributação, acaba, na prática, com o licenciamento ambiental brasileiro. O alerta é da Fundação SOS Mata Atlântica.
O relator optou por seguir a proposta da Comissão de Agricultura que flexibiliza regras e reproduz vícios da PEC 65, que tramita no Senado e é fortemente repudiada pela sociedade. Entre outros retrocessos, aponta a entidade, o substitutivo de Marcos Pereira permite a dispensa e a simplificação do licenciamento, sem critérios ou diretrizes gerais, o que fere princípios Constitucionais e cria insegurança jurídica.
O PL também delega aos estados e municípios, e não à União, a definição de quais empreendimentos estarão sujeitos ao licenciamento ambiental, de acordo com a natureza, porte e potencial poluidor. O licenciamento poderia se dar em três modalidades: ordinário, simplificado ou dispensa.
A dimensão social dos impactos dos empreendimentos talvez seja a mais atacada pelo PL. Caso venha a ser aprovado, o texto impediria, por exemplo, a implantação de infraestrutura de saneamento básico para as comunidades afetadas pela hidroelétrica de Belo Monte, por não reconhecer o impacto socioambiental da obra. Deixaria descobertos também moradores e comunidades das áreas afetadas pelo dano da Samarco/Vale-BHP, na bacia do rio Doce, a quem caberia simplesmente recompor, quando muito, matas ciliares danificadas, desconsiderando ainda potenciais danos futuros que a atividade pode acarretar.
A proposta ainda dispensa do licenciamento ambiental as atividades agropecuárias e de florestas plantadas, à exceção da instalação de novas atividades quando houver restrições à sua implantação, estabelecidas em zoneamento agroecológico aprovado por lei específica. O único zoneamento agroecológico aprovado atualmente é do da cana-de-açúcar, que tampouco é aprovado por lei específica, mas sim pelo Decreto nº 6.961, de 2009. Sendo assim, não havendo qualquer restrição legal, a entrada em vigor da lei proposta liberaria de forma generalizada as atividades de agricultura e floresta plantada.
O texto pode afetar também áreas protegidas, patrimônios tombados, quilombos e terras indígenas, entre outros instrumentos da legislação ambiental brasileira, por buscar “facilitadores”.
Segundo a SOS Mata Atlântica, o licenciamento ambiental assegura a vida e garante a ordem social. “Um tema tão importante e estratégico como esse não pode ser discutido e votado sem transparência e em meio às Olimpíadas e a escândalos”, pontuou.
A entidade considera, no entanto, “um bom sinal” o fato de o Ministério do Meio Ambiente ter assumido, nessa quarta-feira(3), agenda permanente de articulação direta com o Congresso Nacional para assegurar a condução de pautas estratégicas para o país. Essa articulação poderia minimizar a pressão setorial sobre deputados e bancadas e impedir graves retrocessos à legislação ambiental brasileira, como o que ocorre com o licenciamento ambiental.
“A sociedade também precisa reagir para evitar que o substitutivo de Mauro Pereira ao PL 3729/04 seja votado às escuras no Legislativo e se mobilizar para aprovação de uma lei moderna, que defenda o meio ambiente e a sociedade sem retrocessos, e faça do licenciamento ambiental um instrumento arrojado de ganho para o desenvolvimento socioambiental no país”, convoca a SOS.