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‘Empresa não quer resolver o problema que ela criou’

Não reconhecimento de diversas localidades atingidas, estratégias de desmobilização das comunidade, criminalização dos movimentos sociais. Um arsenal de imoralidades tem preenchidos os dias e meses que se seguiram ao maior crime ambiental da história do País e um dos maiores do mundo. A Samarco/Vale-BHP não quer resolver os problemas que criou com o rompimento da barragem em Mariana (MG) e tenta limpar sua imagem com mentiras. A avaliação é do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), que organiza em conjunto com outras entidades e setores da sociedade civil organizada uma série de atividades para marcar um ano do crime, no próximo dia cinco de novembro.

“A empresa, os governos federal, do Espírito Santo e Minas Gerais, fizeram um acordo que não tem como reparar os prejuízos ambientais e sociais. E até agora ninguém foi punido. Isso é uma carta branca pra continuar essa lógica de exploração de riquezas naturais com risco de novos crimes como esse”, acusa Joceli Andreoli, da coordenação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).

Entre segunda e quarta-feira (31 e 2) será realizada uma marcha de atingidos entre Regência, em Linhares (norte do Estado), e Mariana (MG), com paradas em diversas cidades ao longo do trajeto. A expectativa é reunir aproximadamente 500 pessoas. Ao final da Marcha, haverá o “Encontro dos Atingidos por Barragens”, em Mariana, reunindo cerca de mil pessoas afetadas pelos rejeitos da Samarco (Vale-BHP Billiton).

No decorrer do Encontro, estão previstas atividades culturais, palestras, mesas de debate e uma marcha, no encerramento, até Bento Rodrigues. Atualmente, o futuro do distrito devastado pela lama da barragem de Fundão ainda é incerto, já que o dique S4 da Samarco pode transformar toda a região em um depósito de rejeitos.

Luta unificada

“A Marcha vai ser muito importante para construir uma pauta coletiva de todas as regiões atingidas para ter mais força e pressionar os órgãos competentes”, conta Joceli. Essa união é muito importante, pois uma estratégia muito utilizada pelos grandes empreendimentos é a desarticulação comunitária, em que as empresas procuram disseminar as disputas entre as pessoas, entre os setores de uma comunidade e entre as diferentes comunidades.

Prova disso é a omissão da Samarco/Vale-BHP em fazer um cadastro definitivo dos atingidos nas localidades reconhecidas. Um ano após o crime, ela continua refazendo os cadastros, alimentando ansiedades, contrariedades e frustrações entre os moradores. Outra estratégia de desarticulação é usar de todos os recursos para protelar ao máximo as decisões judiciais.

“Há uma estratégia clara de 'enrolar', 'empurrar com a barriga',para as pessoas desistirem e aceitarem indenizações pessoais, enfraquecendo assim laços culturais e comunitários e as forças para lutar por seus direitos”, explica Joceni.

Em reunião nessa quinta-feira (27), na Cúria Diocesana de Colatina, várias entidades que participarão da Marcha e do Encontro relataram outros pontos sobre o crime e que comprovam a falta de vontade da empresa e dos governos em resolver de fato os problemas gerados.

Entre eles, a promessa de reassentamento dos desalojados em Minas Gerais apenas a partir de 2019; a ausência de um programa que garanta a reparação definitiva das perdas dos pescadores, que ficarão pelo menos dez anos sem condições de pesca, sem falar no aspecto cultural; a tentativa de esconder a lama plantando ervas leguminosas em distritos como Bento Rodrigues e Paracatu; a eliminação do conceito de “atingidos”, definido em decreto federal, e sua substituição por “impactado”; ausência de proposta para reparar os danos sobre as comunidades indígenas Tupiniquim, Guarani e Krenak; e a criminalização os movimentos sociais (até agora já são 13 processos da Vale contra atingidos).

Mais grave que no Golfo do México

“É uma política clara de tentar amedrontar”, alerta a liderança do MAB. “É o criminoso se colocando como julgador e inferindo nos órgãos públicos. Porque financia os políticos e as campanhas eleitorais, se acham no direito de calar os movimentos sociais. Mas isso não vai acontecer”, garante.

Essas e outras denúncias foram apresentadas pelo MAB em Londres no último dia 20, em uma reunião do conselho de acionistas da BHP e impressionaram os empresários, que desconheciam a postura da empresa no Brasil.

Para Joceni, uma postura mais digna da empresa começaria por assumir os problemas que criou. “Significa que ela teria de fato que medir, quantificar o que foi perdido”, indica Joceni.

Fazendo referência à ação civil pública do Ministério Público Federal, que valorou em R$ 155,5 bilhões o crime da Samarco/Vale-BHP, o mesmo valor definido para o crime da British Petrolium no Golfo do México em 2010, Joceni afirma que, aqui, a quantificação precisa ser definida a partir desse valor. “Na Bacia do Rio Doce o impacto foi muito maior que no Golfo do México”, compara. 

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