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Centenário de Ruschi enaltece legado do naturalista e a importância de salvar o Mello Leitão

Uma festa digna de Augusto Ruschi marcou o encerramento do centenário de nascimento do naturalista (1915 – 1986). Não, não pense em grandes personalidades internacionais ligadas à ciência e à conservação da natureza ou em autoridades políticas de relevo estadual e nacional.

A trajetória brilhante do naturalista, cientista e professor Augusto Ruschi não precisa ser representada apenas por personagens de renome social, científico ou político. Isso é o que comumente se associa ao “Patrono da Ecologia do Brasil”.

 
Na noite da última sexta-feira (9), o Museu de Biologia Professor Mello Leitão, fundado por “Guti” em 1949, na chácara de sua família no município serrano de Santa Teresa, foi iluminado por moradores locais e capixabas que celebraram a gratidão e o respeito pela obra eterna do filho mais ilustre dessa terra, o “mestre” dos teresenses e capixabas, como bem definiu a viúva do naturalista, Marilande Angeli.
 

De fato, a grandeza de sua obra científica, das diversas unidades de conservação por ele criada e do Museu Mello Leitão, são frutos do imenso amor que Ruschi nutria pela natureza, pelas florestas, pela Mata Atlântica, por Santa Teresa e pelo Espírito Santo. Pois foi esse Ruschi, amoroso, destemido, brilhante e, ainda, por muitos incompreendido, que foi celebrado nessa noite de nove de dezembro.

Uma cerimônia ecumênica deu início à programação, à qual se seguiram alguns depoimentos. Entre eles, o do atual diretor do Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA), Helio de Queiroz Boudet Fernandes, ex-diretor do MBML. Afirmando, logo de início, que o “INMA é a nova denominação do MBML”, acabou sendo a única fala destoante, num momento em que o foco foi exaltar a importância de uma das principais obras vivas de Augusto Ruschi, que é o Museu Mello Leitão.

O prefeito eleito de Santa Teresa, Gilson Amaro, se colocou à disposição para ajudar no processo de salvamento do museu.  “Vamos ver o que juntos a gente pode fazer. Porque eu não vou ter o peito e a coragem de Augusto Ruschi, que praticamente lutou sozinho, contra todos”, reconheceu.

O único eterno

O jornalista Rogério Medeiros, diretor-responsável do jornal Século Diário, amigo do cientista, lembrou que começou a acompanhar Augusto Ruschi em 1973, a pedido de seu editor, quando trabalhava no Jornal do Brasil, na época, o mais importante periódico do País. “O seu Estado é muito estranho, Rogério”, narrou o jornalista, citando seu editor. “O mundo inteiro celebra Augusto Ruschi e, no Espírito Santo, ninguém fala dele!”. “Errado”, respondeu Rogério. “Falam muito, mas falam mal!”.

 

Risos à parte, na época, na redação do JB, e nesta sexta-feira (9), no MBML, o fato é, na verdade, lamentável. Revivendo uma frase do célebre cronista capixaba Rubem Braga – “A partir da metade do século XXI, o único capixaba que será eterno será Augusto Ruschi” –, Rogério Medeiros ressalta que o capixaba mais notável da história ainda é pouco reconhecido no Espírito Santo, em Santa Teresa e dentro do próprio Museu por ele fundado.
 
Rogerio Dalmonch, artista plástico e produtor cultural do museu, concordou com o jornalsita. “Eu vejo essa precariedade, esse esquecimento, esse descaso. E eu falo a partir daqui, dessa instituição”, protesta.

O produtor cultural conta que, quando chegou na instituição, em abril de 2015, não havia ainda nenhuma ação, nenhum evento, nenhuma menção ao centenário de Augusto Ruschi. Inconformado, Dalmonch foi reunindo o desejo dos funcionários do museu e da família do cientista e, mesmo sem nenhum recurso destinado para o evento, foi produzindo as exposições, discussões sobre Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente, plantios de mudas, entre outras iniciativas.

Alguns projetos ainda serão viabilizados, mesmo após o centenário, pois, segundo o artista plástico, “a memória de Ruschi precisa ser celebrada sempre!”. Uma exposição fotográfica a céu aberto, com a “trajetória de Ruschi sob a ótica de Rogério Medeiros” é uma das mais esperadas pela comunidade teresense.

Corrigir os erros da Lei 12.954/2014

Piero Angeli Ruschi, filho caçula do naturalista, destacou a necessidade urgente de restaurar a segurança institucional do Mello Leitão, com adequações na Lei 12.954/2014, que criou o INMA e extinguiu o MBML, antes de sua regulamentação.

“Não se deixem levar pela visão dogmática de que o MBML não pode abrigar o INMA em sua estrutura. De todas as instituições de pesquisa da Mata Atlântica, todas – Fiocruz, MUZUSP, Museu Nacional, Jardim Botânico… todas – justamente o MBML teve o mérito, a honra, de ‘abrigar’ o Instituto Nacional desse bioma! Então, que esse mérito não seja descartado para que o INMA absorva o Museu, mas sim que o INMA seja abrigado dentro do Museu de Augusto Ruschi! Desrespeitar nossa história e alienar o patrimônio do museu é um crime contra a obra e a memória de Augusto Ruschi”, declamou.

Sendo ainda mais duro, Piero fez uma analogia dizendo que o INMA, ao invés de se somar ao museu, está, ao contrário, se apropriando de todo seu patrimônio e até mesmo de seu nome, “como um convidado que rouba os bens da casa que lhe acolhe, depois rouba-lhe a própria casa, e que tenta disfarçar o crime assumindo o próprio nome de seu anfitrião”.

 

Memorial, Rio Timbuí e epidemia de eucaliptos

Muito oportuno que, em meio a essa luta de reinstitucionalização do Museu, estejam sendo reiniciados também movimentos de resgatar a atuação do Mello Leitão junto à melhoria da qualidade de vida das comunidades do entorno.

O produtor cultural Rogério Dalmonch revelou três grandes missões que assumiu junto da família do naturalista e dos funcionários do Museu. ”Nossa grande briga depois do centenário é implantar o Memorial Augusto Ruschi aqui dentro. Essa batalha nós vamos abraçar como abraçamos o centenário. E o primeiro passo é fazer o tombamento da casa”, afirma.

A revitalização do Rio Timbuí, que corta o Museu, e a educação ambiental junto às comunidades rurais do município também estão no topo de prioridades. “O Rio Timbuí precisa de muito cuidado e eu acredito que o museu tem que levantar essa bandeira. Tem que ser o propulsor dessa reviravolta dessa salvação do rio. E precisa contar com a comunidade”, convida.

“A gente precisa ir pro interior, pras comunidades. A epidemia do eucalipto tomou de Santa Teresa e quem não tem conhecimento da catástrofe que significa isso, se rende. A gente sabe da árdua labuta do trabalhador rural, mas a gente tem condições de propor caminhos pra reverter esse quadro”, afirmou.

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