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Pescadores atingidos pelo crime da Samarco-Vale-BHP ficam sem o seguro-defeso de 2017

Pescadores de Linhares, Colatina e Baixo Guandu denunciam a injustiça que estão sofrendo: impedidos de pescarem no rio Doce, devido à contaminação provocada pelo crime da Samarco-Vale-BHP, não registraram, obviamente, nenhuma movimentação no sistema do INSS e, portanto, ficarão sem as duas últimas parcelas do benefício, relativas a janeiro e fevereiro de 2017.

O ofício do INSS com essa informação foi encaminhado para as Associações de Pescadores de Baixo Guandu, Colatina e Linhares pelo Ministério Público do Trabalho de Colatina. Na tarde desta terça-feira (31), o procurador Bruno Gomes Borges da Fonseca esteve reunido Linhares e Baixo Guandu para tratar do assunto, mas, até o fechamento desta reportagem, não nos respondeu se a situação pode ser revertida ou se os pescadores irão mesmo ficar sem o seguro.

Já a Associação de Pescadores de Colatina esteve reunida, na mesma tarde de terça-feira, com a Samarco em um hotel da cidade, onde, apesar do principal questionamento ser a questão do seguro-defeso, o tema não foi abordado, ficando a reunião restrita a supostos esclarecimentos sobre o auxílio emergencial fornecido, muito precariamente pela empresa, para alguns dos pescadores atingidos. “É mais um meio de passar a perna na gente”, acusa Litunoy Gomes de Araújo, uma das lideranças presentes na reunião.

''Finge que me explica que eu finjo que te entendo''

Pescador profissional há mais de 20 anos, Araújo é enfático ao ressaltar as estratégias explícitas da empresa de ludibriar os pescadores. “Eles fingem que explicam e a gente finge que entende”, tenta brincar.

Na reunião de hoje, convocada pela empresa, Araújo conta que mais uma vez foi “explicado” o processo de recadastramento para recebimento do auxílio emergencial, por meio do cartão de benefício.

O processo teve início há cerca de três meses e não tem data para ser concluído. Segundo o líder colatinense, a tormento dos pescadores tem as seguintes etapas: primeiro a empresa telefona para cada um, faz o mapeamento da casa, por GPS, e em seguida telefona novamente para marcar uma entrevista em um colégio ou local similar. Lá, cada atingido responde a um exaustivo questionário, que, cerca de duas semanas depois, é enviado para a pessoa, para que ela confirme suas respostas ou diga se quer alterar algo. Depois, disso, é informado de que precisa “aguardar”. Até quando? Ninguém sabe.

“Eles dizem que em até 20 dias vão entrar em contato com a resposta sobre o cadastro, mas passa mês e mês e nada. Vai gente no seu vizinho, conversa com ele, mas não vai na sua casa. Uma semana depois, volta o técnico na sua rua, pra falar com você. E assim vai, muito bagunçado. Parece de propósito”.

Essa desarticulação das comunidades, incentivando rivalidades e desentendimentos entre vizinhos e colegas de profissão, é uma estratégia de guerra que as grandes empresas sempre utilizam para enfraquecer os atingidos por seus crimes. “Dividir para conquistar”, bem afirmou o procurador da República em Linhares, Paulo Henrique Camargos Trazzi, aos ouvintes de uma dessas enfadonhas reuniões da Samarco e Fundação Renova, realizada em Regência. “Se vocês não se unirem, a empresa vai passar por cima de vocês”, alertou.

Advogados são os únicos que a empresa paga corretamente

Na reunião desta terça-feira (31), os pescadores foram lembrados que precisam retirar seus processos da Justiça para receberem a indenização por falta de água. O valor varia de R$ 880,00 a R$ 968,00, mas já vem descontado o pagamento do advogado, de quem a causa foi retirada. Segundo Araújo, a empresa tem a lista dos advogados que ajuizaram as ações dos pescadores na cidade e paga a indenização somente após descontar os 25% dos advogados. “Ela que deveria pagar o advogado, não a gente!”, reclama.

A relação da Samarco-Vale-BHP com a categoria advogados é muito bem cuidada. A empresa já gastou mais de R$ 80 milhões com honorários advocatícios, desde a eclosão do crime, há 15 meses. Mas o pagamento das multas, os depósitos judiciais, os auxílios emergenciais e as indenizações aos atingidos recebem um tratamento bem diferente e os infinitos recadastros são só um dos exemplos do drama vivido pelos atingidos.

“Aqui é: ou você aceita ou você aceita, não tem como negociar, recusar nada que ela apresenta”, denuncia Araújo. “E a gente nunca tem informação direito. Nunca vêm as pessoas que têm autorização pra responder o que a gente quer saber: quando vai repovoar o rio? Quando vamos receber as indenizações?”, são perguntas que continuam sem resposta. 

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