Desta vez, além das escolas rurais (oficialmente, as escolas com menos de 100 alunos), também os Centro Estaduais de Educação de Jovens e Adultos (CEEJAs) e as Escolas de Atendimento Exclusivo aos Estudantes em Privação de Liberdade também estão na mira do autoritarismo do “imperador”, como os movimentos sociais apelidaram o governador PH.
Além de autoritário, é também retrógrado – contrariando absolutamente o discurso vazio que enaltece as medidas modernizadoras e progressistas do Imperador PH – e, muito provavelmente, ilegal.
As pistas sobre a ilegalidade da medida emergem da seguinte contradição: o Estatuto dos Conselhos de Escola afirma que os mesmos só podem ser extintos em duas situações: a extinção da unidade escolar ou a partir de uma decisão, em Assembleia, dos próprios membros do Conselho. Não é o que ocorre. A extinção dos conselhos é uma ordem autoritária, de cima para baixo, sem o menor consentimento dos conselheiros.
Sem verba federal
Coube às Superintendências Regionais de Educação (SREs) distribuir o receituário imoral às unidades afetadas, que inclui ainda a baixa do CNPJ e o cancelamento das contas bancárias abertas em nome das mesmas.
Sem Conselho e sem CNPJ, as escolas deixam de receber verba do Governo federal, o que praticamente inviabiliza seu funcionamento, em vista dos mirrados repasses feitos pela Sedu. Outra incoerência: nas ordenações das SREs, registra-se que essas escolas agredidas passarão a ter seu orçamento vinculado à uma escola-referência mais próxima.
O Ministério Público Estadual (MPES) instaurou, na promotoria de Linhares, o primeiro expediente denunciando a medida do Executivo.
Dentre os três públicos atingidos – camponeses, jovens e adultos interessados em concluir seus estudos e estudantes em privação de liberdade – a reportagem de Século Diário conseguiu conversar com alguns agricultores que têm filhos matriculados nas dezenas de escolas rurais de norte a sul do estado. O sentimento é de muito medo, tristeza e revolta.
Educação do campo é direito, não esmola
Confira abaixo o relato de Ana Cristina Soprani, membro do Comitê estadual de Educação do Campo e moradora de uma comunidade cuja pequena escola rural tem cerca de dez alunos, explica porque o tamanho dessas pequenas unidades escolares é inversamente proporcional à sua importância para a vida das famílias por ela atendidas.
“Aos camponeses foi negado o acesso à educação escolar por muitos anos em nossa história. Não são poucos os relatos de camponeses que tiveram de abandonar o campo para que os filhos tivessem acesso à escola. Quando muito, o que tínhamos era uma educação para ler e escrever outras realidades, sempre entonando a célebre frase: “É preciso estudar para sair da roça … Não ficar aqui como burros …” Enfim. A própria educação escolar chegada no campo pelas vias da industrialização e da revolução verde descaracterizavam nossa cultura, nossa identidade. Tal fato se deve à necessidade gerada pelo capital, de obtenção de mão de obra barata e de formação de reservas para a garantia de exploração máxima das indústrias. Mas o povo camponês sempre lutou e ainda luta pelos direitos hoje garantidos em lei. Ter no campo uma escola que dialogue com nossa realidade não é privilégio. É um direito conquistado com muita luta, sangue e suor. A educação é um campo em grande disputa. Nunca neutra. Deve ser debatida no sentido de formação integral para a vida, não para o mercado, apenas. Pois somos pessoas e não apenas mãos. Somos gente, não mão de obra. Nesse sentido, tanto o campo quanto a cidade carecem de uma educação que dialogue com a realidade do trabalhador. Mas, para os camponeses, essa educação é, de fato, tardia. Apenas muito recentemente conseguimos ver transformadas em leis nosso direito por uma educação própria do campo e apropriada à nossa realidade”.
Ou, como bem tem cantado o artista da terra Gilvam Santos: “Não vou sair do campo pra poder ir pra escola. Educação do campo é direito, não esmola”.