Nesta Semana Santa, vilas tradicionalmente pesqueiras, como Povoação, em Linhares, e Campo Grande, em São Mateus, norte do Estado, acumulam os mesmos problemas que destroem sua coesão social e adoecem física, psicológica, emocional e financeiramente milhares de pessoas, desde que a lama chegou à Foz do Rio Doce, em novembro de 2015.
De Campo Grande, vem o grito de socorro pelo Festival do Caranguejo, que acontece há 17 anos na comunidade e é importante fonte de divulgação turística da comunidade e de captação de recursos para a Associação de Pescadores, Catadores de Caranguejo, Aquicultores, Moradores e Assemelhados de Campo Grande (Apescama).
Há quase um ano o manguezal local está morrendo e os caranguejos já desapareceram. Comprar caranguejos em Canavieiras, na Bahia, foi a solução apontada para que o Festival de 2017 aconteça, nos dias 19 a 21 de maio, é arrecade recursos para pagamento das contas da Associação, que está com luz, telefone e outros provimentos administrativos em atraso ou simplesmente desativados. Mas a Fundação Renova ainda não afirmou que financiará os custos.
“Só desavença e desunião”
Em Povoação, balneário de Linhares, dois importantes festivais também foram prejudicados e não acontecem desde 2016: o da Manjuba e o do Robalo. Povoação já foi reconhecida como impactada, mas sofre com a mesma estratégia de guerra lançada contra as comunidades pela empresa: cadastrar apenas algumas pessoas, fomentando as rivalidades, as brigas, “dividindo para conquistar”, como bem definiu o procurador da República no município, Paulo Henrique Camargos Trazzi.
“Aqui é só desavença, só desunião. Vizinho que briga porque um recebeu e outro não”, conta o presidente da Associação de Moradores de Povoação, Jocenilson Cirilo Mendonça.
A comunidade exige o pagamento do auxílio emergencial a todos os moradores e respostas sobre a contaminação das águas. “A gente foi impactado de tudo o que foi forma: acabaram com o Rio Doce, com o mar e com outro Rio que nós temos, que se chama Rio Monsarás”, descreve o presidente da Associação. “Rodearam a comunidade de lama podre”, sintetiza.
“Vamos dar mais quinze dias pra Renova resolver nossos problemas, senão vamos fechar as fábricas aqui”, anuncia. Quase quatro meses depois do primeiro protesto, que fechou a estrada que liga a comunidade à sede do município de Linhares, nenhum direito reivindicado foi atendido pela Samarco e sua Fundação Renova. “Só reuniões e assembleias, mas nenhuma solução favorável pra gente”, relata. “Eles não assumiram nada ainda, a Renova tá há quase nove meses só fazendo cadastro e empurrando as pessoas com a barriga”, denuncia. “Falam na nossa cara que não vai ter mais auxílio financeiro, só indenização”, reclama. “Só em causar dano às nossas águas… mexeu com o psicológico da gente”, roga.
Ministérios Públicos e Prefeitura
Além do auxílio financeiro da Samarco/Vale-BHP, Povoação também entrou com processos nos Ministérios Públicos do Trabalho (MPT) e Federal (MPF), reivindicando o asfalto da Beira Rio e a rede de esgoto. “Porque nós temos duas indústrias dentro da comunidade que não fazem nada, só um pouco de emprego pra algumas pessoas”, explica o líder comunitário.
Em Campo Grande, o presidente da Apescama, Adeci de Sena, recorreu também à Prefeitura de São Mateus, para que os pescadores sejam incluídos nos programas sociais por meio do Centro de Referência em Assistência Social (CRAS). “Todo mundo 'tá' com nome na Serasa, sem pagar energia, telefone, com dificuldade pra comprar comida. O seguro-defeso terminou no final de março e a gente não sabe quando vai começar a receber o auxílio da Samarco”.