A Justiça federal vai decidir sobre a inclusão dos municípios de Serra, Cariacica e Vila Velha, além da Companhia Espírito-Santense de Saneamento (Cesan), como partes na ação civil pública que discute a omissão das autoridades no lançamento de esgoto nas praias e mananciais da Capital. O pedido foi feito pelas duas entidades ambientais que assinam a denúncia. Inicialmente, o alvo do processo era o município de Vitória que, por meio de sua Procuradoria, manifestou o interesse de atuar ao lado dos autores de ação.
Tanto o requerimento das entidades – Associação Nacional dos Amigos do Meio Ambiente (Anama) e a ONG Juntos SOS Espírito Santo Ambiental – quanto da prefeitura da Capital serão analisados pelo juízo da 4ª Vara Federal Cível de Vitória. Na peça das autoras da ação, a discussão sobre a titularidade dos serviços de saneamento na Capital volta à tona. Para as entidades, a Cesan atua de forma inconstitucional pelo fato de não ter ocorrido prévia licitação, além de irregularidades no projeto de lei aprovado na Assembleia que conferiu a exclusividade dos serviços para a empresa estatal – tese igualmente defendida pelo Município de Vitória.
A única diferença é de que as duas entidades reafirmam a responsabilidade da prefeitura da Capital, no caso, pela omissão em tomar providências contra os terceiros que o impediriam de exercer suas obrigações constitucionais e legais. O ponto comum é a necessidade de responsabilização do Estado do Espírito Santo, no que foi classificado como uma “calamidade ambiental”.
“Significa que os esgotos que estão sendo despejados in natura no território do Município de Vitória prejudicando os manguezais, mananciais e a Baía de Vitória, são responsabilidade conjunta dos Municípios que integram a Região Metropolitana, do Estado, de sua agência Reguladora e da concessionária do serviço público investida irregularmente. […] Não é possível ao réu desta ação solucionar o problema sem que os vizinhos o façam, abstendo-se de despejar esgoto in natura, através do seu território”, diz a peça assinada pelo advogado Esdras Elioenai Pedro Pires, que agora representa as entidades.
Em relação à responsabilidade do governo estadual– através da Cesan e da Agência de Regulação de Serviços Públicos (antiga Arsi) –, as autoras da ação destacam que o Estado evocou para si a qualidade de poder concedente, isto é, responsável pela prestação do serviço, ainda que de forma inconstitucional. “A ineficácia e desídia da concessionária é notória. O esgoto é lançado sem tratamento no mar a céu aberto, visível a qualquer pessoa nesta Capital”, apontam.
Para as entidades, caberá à Justiça Federal decidir pela procedência ou improcedência da ação sobre a conduta de cada Município e dos órgãos estatais. As autoras também pedem o indeferimento do pedido da prefeitura de Vitória para migração para o pólo ativo do processo sob justificativa de que não seria viável para o objetivo da ação. Neste caso, a adoção de medidas para cessar a poluição e recuperar a área já degradada.
Prefeitura culpa Estado
No pedido de mudança de réu para “vítima”, a Procuradoria do Município de Vitória acusa a Cesan de ser responsável pela falta de fiscalização nas ligações de esgoto dos seus usuários. Para a defesa, uma eventual responsabilização da prefeitura seria uma forma de “premiar o prestador do serviço que não fiscaliza sua prestação”. A defesa do município também sustenta que tem procurado seus direitos, porém, tem sido impedida de atuar por órgãos do Estado, caso do Tribunal de Contas (TCE).
A troca de farpas entre prefeitura e o governo do Estado começou logo após a divulgação de notícias no final de março, dando conta da intenção do Município em assumir a titularidade dos serviços. A medida da administração do prefeito Luciano Rezende (PPS) foi bastante criticada por integrantes do governo e pelo próprio governador Paulo Hartung (PMDB). A Cesan, por sua vez, obteve uma decisão cautelar do TCE, suspendendo qualquer iniciativa do Município para rever o atual modelo. Atualmente, a legislação estadual confere a exclusividade à companhia até o ano de 2051.
Conheça a ação
A ação civil pública (0009100-23.2017.4.02.5001) foi protocolada no início do mês pela Associação Nacional dos Amigos do Meio Ambiente (Anama) e a ONG Juntos SOS Espírito Santo Ambiental. Elas pedem que o município execute um plano de recuperação da área degradada, além da divulgação de uma campanha educativa para conscientização da população sobre a importância do saneamento básico e do tratamento de água potável.
Segundo a petição inicial, “o derramamento de esgoto nas praias acarreta, sem qualquer dúvida, na poluição desse ecossistema, trazendo prejuízos incalculáveis para a flora e a fauna da região, bem como à saúde das pessoas que frequentam o local”. As entidades consideram não ser razoável que se espere a constatação de que as águas não são mais balneáveis para que se adote providências no sentido de interromper o derramamento de esgoto.
As entidades pedem na ação que a prefeitura efetive o serviço de coleta e tratamento de esgoto sanitário. Para tanto, as associações se baseiam em três premissas: a necessidade de se prestar o serviço adequado aos consumidores; pelo dano ambiental causado em razão da ausência do sistema de tratamento; e do dano à saúde pública. A ação reforça que, além de causar doenças e a poluição do meio ambiente, a prática gera “danos patrimoniais e morais à coletividade” e ao próprio Sistema Único de Saúde (SUS).
Entre os pedidos feitos à Justiça, as associações pedem a concessão de liminar para a condenação ao Município para que apresente ao Conselho Municipal de Meio Ambiente (Comdema) um Plano de Recuperação da Área Degradada (PRAD) no prazo de 60 dias sob pena de multa, além da execução do planejamento e a execução de uma campanha de Educação Ambiental junto à população.
No mérito da ação, a Anama e a Juntos SOS Espírito Santo Ambiental querem que o Município indenize os munícipes que sofrem ou sofreram de doenças causadas por ausência do tratamento de esgoto ou daqueles impedidos de banhar-se nas praias e de praticar esportes aquáticos. As entidades pedem ainda que o poder público seja condenado a pagar R$ 50 mil a título de danos morais coletivos, a ser revertido ao fundo para reconstituição dos bens lesados.