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Defensoria Pública alerta sobre ‘privatização do desastre’ da Samarco/Vale-BHP

“O Comitê não tem personalidade jurídica, é um acordo de cavalheiros, o que é muito bom, pois poderia agilizar as ações necessárias. Mas se os entes públicos não fiscalizam minimamente as atividades da Fundação [Renova], o que se tem é a privatização do desastre”, pondera o defensor público estadual Rafael Mello Portella Campos, do Grupo Interdefensorial do Rio Doce (Gird), criado após o crime da Samarco/Vale-BHP.
Ele alerta que todo o sistema de governança baseado no Comitê Interfederativo (CIF) está sob risco de ser colocado em xeque. O motivo principal é o descumprimento da Deliberação 58 do CIF e de cláusulas do Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) – firmado em dois de março de 2016 entre a Samarco/Vale-BHP, a União e os Estados do Estado e Minas, e que estabelece um piso de R$ 20 bilhões o montante a ser aplicado na Bacia do Rio Doce atingida pelo rompimento da barragem de Fundão. Os recursos são referentes ao cadastramento para pagamento de auxílio emergencial e indenizações aos atingidos.
A Deliberação 58, assinada no dia 31 de março de 2017 pela presidenta do CIF, Suely Mara Vaz Guimarães Araújo, determina o imediato cadastramento das comunidades atingidas ao norte e ao sul da Foz do Rio Doce, mas que ainda não foram alvo de qualquer tipo de ação de compensação ou reparação de danos por parte da empresa ou sua Fundação Renova. São elas: ao sul, de Portal de Santa Cruz até Nova Almeida; e, ao norte, de Pontal do Ipiranga até as comunidades ao norte de São Mateus, na divisa com Conceição da Barra.

Passados mais de quatro meses da determinação, no entanto, as ações não foram realizadas, o que, no entendimento do GIRD, configura necessidade de reação por parte dos entes públicos que compõem o Comitê, e já demanda aplicação de multa.

Um primeiro passo nesse sentido foi tomado durante a última reunião do colegiado, com a publicação da Deliberação 93, de quatro de agosto último, em que o CIF “comunica o descumprimento da Deliberação 58 e demanda ações de divulgação e cadastramento nas áreas impactadas”.

No ato, o Comitê considera ainda as Notas Técnicas nº 2 do GIRD (21/11/2016) e nº 3 do Tamar/Dibio/ICMBio (17/02/2017), para requerer, entre outras ações, o início da busca ativa para cadastro dos atingidos nas regiões definidas na Deliberação 58, em até cinco dias úteis; o cadastramento, em até trinta dias, das pessoas que demandaram cadastro via telefone 0800 da Fundação até o dia 13 de julho; e o envio, a cada um desses solicitantes, de uma carta registrada com resposta sobre aceite ou não do cadastro, com motivações técnicas claras e objetivas.

“A Deliberação 58 é um termômetro do sistema de governança instituído pelo TTAC”, analisa o defensor público Rafael Mello Portella Campos. A aplicação de multa à Renova e Samarco/Vale-BHP será analisada na próxima reunião do CIF, no final de agosto. É quando será verificado “se o que prevalece é a forma unilateral de atuação da Renova ou se o sistema de governança idealizado pelos próprios entes públicos”, confronta o defensor, destacando a função desses órgãos federativos, de fiscalizar e validar as atividades da pessoa jurídica criada a partir do Termo de Transação e Ajustamento de Conduta, que é a Fundação Renova.

Rafael esteve presente na reunião realizada nessa quinta-feira (10) em Campo Grande, São Mateus, entre o Fórum Norte da Foz, órgãos da prefeitura do município e a empresa Sinergia, contratada pela Renova para realizar o cadastro das comunidades definidas na Deliberação 58.

O defensor público conta que a empresa afirmou não ter recebido qualquer determinação de prazo para iniciar efetivamente o cadastramento e que, ao contrário, foi contratada para realizar estudos e diagnósticos que irão subsidiar um futuro cadastro na região. E, mais grave, a Sinergia disse conhecer a Deliberação 93, mas que só daria qualquer resposta sobre o pleito das comunidades após o dia primeiro de setembro.

Diante da postura da Fundação, Rafael Portella afirma que a próxima reunião do CIF é decisiva. Caso a multa não seja aplicada, “todo o sistema de governança será desacreditado”. “O GIRD está pressionando o CIF porque entende que os entes públicos precisam se manifestar sobre essa desobediência”, reclama.

Na reunião, as comunidades compareceram em grande número e prestaram vários depoimentos, que emocionaram os presentes. Reafirmaram estarem fartos de estudos e diagnósticos e exigiram cadastro imediato de todos os atingidos. Ao final, foram definidos dez encaminhamentos, entre os quais uma reunião com a Fundação Renova e a participação ativa dos atingidos na escolha da empresa de assistência técnica a ser contratada.

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