Ao falar das personagens Ana e Mirela, “A Fuga” traz o universo do presídio feminino, ao mesmo tempo em que se aproxima de tantas outras mulheres fora das celas ao indicar outras camadas de significados. Na peça, escrita como ficção, é proposto um mergulho na trajetória dessas duas mulheres encarceradas que fazem dupla no revezamento para a escavação de um túnel, sem deixar de apontar para um sistema prisional que é falido, desumano e machista desde sua origem.
A ideia de escrever o texto surgiu em um núcleo de dramaturgia coordenado por Fernando Marques, do qual Alexsandra participou. “Há tempos tenho uma urgência em desenvolver algum tipo de trabalho dentro do presídio feminino – o que ainda não consegui concretizar. Provavelmente, esse interesse tem origem nas minhas experiências pessoais como visitadora de presídio masculino durante muitos anos, como uma observadora e ouvinte daquelas mulheres que dividiam comigo aquela fila, sabendo que muitas já tinham sido presas por causa de cônjuge”, destaca Alexsandra.
Outro aspecto que mobilizou o grupo para a montagem de “A Fuga” diz respeito à ausência de uma estrutura física e psicológica que atenda às necessidades das mulheres que estão em situação de cárcere. “Em muitos presídios femininos, uma série de direitos lhes são negados – desde a privada que não serve à sua anatomia até o filho recém-nascido que é arrancado da mãe antes de findado o período de amamentação”, ressalta Alexsandra. Nesse sentido, a frase de Heidi Ann Cerneka, presente no livro “Presos que Menstruam”, de Nana Queiroz, foi um dos estímulos no processo de montagem do espetáculo: “Para o Estado e a sociedade, parece que existem somente 440 mil homens e nenhuma mulher nas prisões do País. Só que, uma vez por mês, aproximadamente 28 mil desses presos menstruam”.
Os encontros para a montagem da peça, desde o início, contam, ainda, com a participação de seis mulheres com vivências no campo das Artes Cênicas. Elas observam, opinam, intervêm no processo, debatem com o grupo e produzem relatos publicados regularmente no blog do espetáculo. Mais informações podem ser conferidas no blog da peça https://afugagrupoz.wordpress.com/ e na página da peça no Facebook.
Oficina aberta ao público
Durante a temporada, o grupo oferecerá a oficina “Atuação, Processo e Registro” gratuitamente, nos dias 23 e 24 de setembro. A proposta é compartilhar parte do processo de montagem de “A Fuga”, que inclui produção de textos em formato livre. Segundo Fernando Marques, serão trabalhados o uso de fontes documentais como estímulo à criação, em um primeiro momento, e a elaboração de protocolos sobre a experiência, como forma de pensar sobre o próprio trabalho, posteriormente.
“Pretende-se não apenas que os participantes desenvolvam o seu trabalho como atores criadores, mas, sobretudo, a capacidade de pensar, compreender e avaliar seu processo de criação”, diz. As vagas são limitadas e a abertura de inscrições será divulgada na página do espetáculo no Facebook.