O governo do Estado autorizou nesta quarta-feira (4) a mineradora Vale a utilizar seus créditos fiscais acumulados decorrentes das exportações – através da Lei Kandir – na importação de máquinas e equipamentos. O termo de acordo, assinado pelo secretário da Fazenda Bruno Funchal, não aborda os valores envolvidos, mas o rombo aos cofres públicos pode chegar à casa dos bilhões de reais. Em seu demonstrativo financeiro mais recente, a Vale anunciou que tinha um total de US$ 2,03 bilhões em tributos a recuperar, entre eles, os créditos tributários alvos do incentivo.
Em agosto do ano passado, o governo capixaba já havia tentado conceder um benefício semelhante à mineradora. Em ato do então secretário Paulo Roberto Ferreira – hoje chefe de gabinete do governador Paulo Hartung (PMDB) –, a Sefaz autorizou a utilização de R$ 129,4 milhões em créditos de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) da Lei Kandir. A iniciativa só não deu certo pela existência de erros no termo de acordo que se baseou em leis que não estavam mais em vigor.
Na época, foi cogitada a edição de um novo ato, porém, a medida sofreu forte resistência de setores da sociedade civil e da área fiscal do Estado por abrir mão de arrecadação no momento em que o governo alegava queda nas receitas. Mas nem mesmo a continuidade da política de “ajuste fiscal” de Hartung parece ter demovido o governo de conceder benesses à Vale. A mineradora acumula esse tipo de crédito por conta de sua atividade. A Lei Kandir desonera a exportação de commodities e produtos semielaborados do recolhimento de ICMS.
O Termo de Acordo nº 005/2017 não fala sobre valores envolvidos nesta operação, porém, o prazo de fruição (período de uso desses créditos) começou no último domingo (1º) e vai até o dia 30 de setembro de 2019. Os créditos acumulados poderão ser usados na compensação do imposto devido na importação de máquinas, equipamentos, peças, partes e componentes, destinados a integrar o seu ativo permanente imobilizado da mineradora. Pela fórmula do imposto, a empresa deve pagar o tributo devido no exato momento em que o ativo é importado.
Esse tipo de renúncia fiscal acaba não entrando no total divulgado pelo governo, através da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Para este ano, a previsão é de que o Estado deixe de arrecadar R$ 1,1 bilhão em favor dos empresários. Até 2020, a renúncia total deve ultrapassar R$ 4,62 bilhões, somente em valores admitidos. A obscuridade nos dados divulgados pelo governo Hartung fizeram o Ministério Público de Contas (MPC) cobrar mais informações sobre os incentivos concedidos pelo Palácio Anchieta.
Em maio deste ano, o MPC protocolou uma representação no Tribunal de Contas do Estado (TCE), pedindo a abertura dos dados sobre benefícios entre 1989 e 2016. O órgão ministerial quer acesso aos estudos técnicos que balizaram o cálculo da renúncia fiscal do Estado de 2017 até 2019, além dos valores acumulados em créditos de ICMS este ano.
No fim de 2016, o plenário do TCE julgou improcedente uma denúncia feita pelo Fórum das Carreiras Típicas do Estado (Focates), que também pedia a abertura da “caixa preta” dos benefícios. Alegando a existência de sigilo fiscal, a Secretaria da Fazenda negou acesso aos valores do patrimônio e a renúncia fiscal por cada empresa incentivada. A solicitação direta dos dados faz parte da nova estratégia do MPC para garantir o acesso aos dados que, nos últimos anos, vem sendo escondidos.