Segundo Pedro Valls, as únicas provas trazidas pelo MPES foram imagens de câmeras de segurança que não demonstram a participação nos atos de depredação à portaria da Vale durante o protesto, bem como o depoimento de dois seguranças da empresa – que, segundo o relator, poderia ter acionado a Polícia, caso realmente fosse constatada a participação do militante ambiental nos fatos reclamados pela empresa. O togado fez questão de registrar que o protesto foi acompanhado pela Polícia Militar.
“Em nenhum dos vídeos é possível identificar qualquer conduta do paciente [Alessandro Chakal] a apontá-lo como sendo autor dos fatos […] O fato de o paciente ter pulado a roleta e ter ido em direção à sala onde os bens foram danificados poderia ser um indício de sua autoria. Todavia, aquele mesmo vídeo revela que dezenas de pessoas pularam aquela roleta – muitas delas antes mesmo do paciente – e caminharam na mesma [direção]”, observou Pedro Valls.
Em seu voto, o relator questionou se o simples fato do ambientalista ter participado do protesto o tornaria um possível autor do dano causado, como pretendia o MPES. “Se a resposta é positiva, então a autoridade policial e o órgão ministerial deveriam buscar identificar e denunciar todas as centenas de pessoas que estavam na manifestação e encontravam-se na mesma situação do paciente. Registro, inclusive, que alguns vídeos revelam, com enorme nitidez, diversas pessoas que estavam no local dos fatos. Algumas delas em clara ação de dano ao patrimônio. O que efetivamente não se aplica ao ora paciente”, cravou.
Com a decisão pelo trancamento de ação, no julgamento realizado no último dia 27, o processo contra Alessandro Chakal deve ser arquivado em definitivo. Esse assédio processual não é a primeira tentativa das poluidoras e de autoridades de intimidar os militantes da causa ambiental no Espírito Santo. Por sua luta contra o “pó preto”, Alessandro e outros ambientalistas foram denunciados pelo promotor de Justiça, Marcelo Lemos, por supostos crimes contra a honra. O grupo questionava as ações efetivas do MPES contra a poluição.
O protesto
O protesto contra a Vale ocorreu na noite do dia 16 de novembro de 2015, pouco menos de duas semanas após o maior crime ambiental da história do País – o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), de propriedade da Samarco, cuja mineradora é um de seus acionistas. Cerca de 500 pessoas participaram da marcha que saiu da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) até a portaria da empresa, no final da Praia de Camburi, em Vitória. O protesto durou mais de duas horas e contou com a participação de estudantes, professores, crianças, famílias, artistas, cicloativistas e militantes de movimentos sociais.
A tragédia de Mariana deixou 19 mortos, além da lama de rejeitos ter devastado comunidades inteiras, acabando com a vegetação nativa e poluindo o rio Doce até sua foz, no distrito de Regência, localizado no município capixaba de Linhares (litoral norte). Foram coletadas mais de 14 toneladas de peixes mortos, além da degradação de 240 hectares de Mata Atlântica e mais 45 hectares de plantações de eucalipto. O volume de rejeitos despejados em terrenos e corpos hídricos chegou a 40 milhões de metros cúbicos. Das 195 propriedades rurais atingidas em MG, 25 foram completamente devastadas.