Os passarinhos são como portais, que abrem nossa percepção para uma interação mais respeitosa e próxima com a natureza. A partir desse princípio, que rege a observação de aves – atividade de educação ambiental e turismo ecológico/científico – foi criado o Projeto EnCantos das Aves do Caparaó, realizado desde março de 2017 com crianças e adolescentes da comunidade rural de Patrimônio da Penha, em Divino de São Lourenço, no entorno direto do Parque Nacional (Parna) do Caparaó.
Após muitas horas de aventuras e descobertas, o projeto se encerra com o lançamento de um guia impresso, com 60 das mais de 200 espécies observadas ao redor e dentro da comunidade, que será distribuído gratuitamente nas escolas e pousadas da região.
À frente do trabalho estão duas jovens moradoras do Patrimônio da Penha: a turismóloga caparaoense Relva Rodrigues de Carvalho, atual coordenadora da tradicional Associação para o Melhoramento Ambiental da Região do Caparaó (AMAR Caparaó), e a bióloga paulistana Tati Pongiluppi, que, entre outros multitalentos, apresenta um canal no youtube chamado Passarinhando pelo Brasil.
O projeto surgiu como mais uma atividade da Brinquedoteca Curumim, mantida pela ONG AMAR Caparaó, e que realiza diversas atividades voltadas à conservação da natureza para crianças. O objetivo principal: “transformar olhares através das aves e encantar as pessoas com sua magia e beleza”, resume Tati.
“Em nossa proposta, as aves são como um portal de conexão com a nossa essência, a nossa natureza, criando uma nova aliança entre o homem e os ambientes naturais, onde todos os seres possam viver em equilíbrio e harmonia”, profetiza.
Ao longo do ano, Tati e Relva observaram mudanças positivas no comportamento das crianças, que foram ficando mais camas, mais atenciosas, mais curiosas. “No começo ficavam muito alvoroçadas, quebravam vários equipamentos, mas à medida que fomos saindo a campo, elas foram tendo um contato maior com os bichos e a natureza e foram se acalmando, se organizando melhor enquanto grupo e se encantaram pelas aves de um jeito muito bonito”, relata Relva.
Quase 400 espécies
A avifauna do Caparaó tem 369 espécies catalogadas. A grande diversidade se explica pela diversidade de ambientes – floresta, brejos, campos, florestas nebulares – que se alternam de acordo com a mudança de altitude, que varia de 800 a quase 3 mil metros, mais precisamente 2.892, no alto do Pico da Bandeira, o terceiro mais alto do país, e o mais alto exclusivamente em território brasileiro – os outros dois estão na Amazônia, na fronteira com a Venezuela.
Para o Guia, foi possível retratar 60 espécies, escolhidas entre as mais fáceis de observar dentro da vila – “que todo mundo vai conseguir observar do próprio quintal” –, como a lavadeira-mascarada, cuja foto foi feita por uma das crianças, e o jacu, mas também as endêmicas de Mata Atlântica e as que representam bem os campos de altitudes, como a garrincha chorona e o beija-flor-de-topete-verde.
Além das fotografias, a publicação contém um mapa com os pontos de observação de aves na região e tem como principal objetivo inspirar as pessoas a observar aves e estar em constante contato com a natureza.
Plano de Ação
O Guia será lançado na próxima segunda-feira (27) e, depois, distribuído gratuitamente nas escolas e pousadas da região, para incentivar novos praticantes na arte da observação de aves e auxiliar os que já praticam.
“A gente espera que eles continuem com esse interesse não só pelas aves, mas outros grupos de animais e plantas, e que fiquem mais em contato com a natureza e levem essa mensagem pro resto da comunidade”, conta a bióloga, já antecipando uma possível segunda etapa do projeto, que seria executar um plano de ação feito em conjnto com as crianças, voltado a minimizar as ameaças que as aves sofrem dentro da comunidade, como tráfico, caça e colisões com vidros.
“As crianças mesmo já viram tucanos morrerem em colisões com vidros, e elas mesmas fizeram propostas pra reverter toda essas ameaças. Então o próximo passo é colocar esse plano de ação em prática”, anuncia.