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Hospitais públicos reduzem oferta de serviços após terceirização

Quanto do Sistema Único de Saúde (SUS) continua sendo público diante da invasão de empresas privadas no setor? Motivados por essa pergunta, acadêmicos de oito universidades brasileiras (UFES, UFRJ, UERJ, Fiocruz, USP, UFMG, UFPE e UFBA) pesquisam, há três anos, a participação de grupos particulares no que deveria ser um sistema totalmente público, integral e universal.  O resultado até então? A constatação é de que o SUS está invadido internamente por transações econômicas que drenam recursos estatais para o empresariado. 
 
Outra descoberta: quando assumem as unidades públicas, empresas privadas restringem os serviços, optando pelos que são menos onerosos, operando dentro da lógica do lucro. Os procedimentos de alta complexidade, Oncologia e Hemodiálise, por exemplo, continuam sendo ofertados apenas nos hospitais totalmente estatais, deixando, assim, o que é mais custoso para a conta do Estado. Ou seja, empresas particulares recebem verbas públicas, lucram com ela e transferem para a conta dos governos o que é mais caro e pode comprometer o negócio.
 
Sem ampliação dos serviços
 
De acordo com a coordenadora da pesquisa Complexo Econômico Industrial da Saúde, a professora do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Estado (Ufes), Francis Sodré, havia expectativa de que o Jayme dos Santos Neves, na Serra, ampliasse os serviços do Dório Silva, pois, durante as obras, a unidade era chamada até de “Novo Dório Silva”.
 
“O Jayme é um equipamento novo, lindo, que foi passado para a gestão privada. E a ampliação dos serviços não aconteceu. Os procedimentos mais custosos não são ampliados nos hospitais geridos por empresas privadas”, explicou a pesquisadora, que completa: “As OSs, geralmente, assumem equipamentos novos ou que foram recentemente reformados. Não fazem a gestão dos que estão degradados ou que precisam de grandes investimentos estruturais”, completou a pesquisadora. 
 
O Jayme é administrado pela Associação Evangélica Beneficente Espírito Santo (Aebes), uma OS genuinamente capixaba. 
 
Para a presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde no Espírito Santo (Sindsaúde-ES), Geiza Pinheiro, outro exemplo claro dessa lógica ocorre no Hospital Central, no Centro de Vitória, o primeiro a ser terceirizado no Estado. Depois que passou a ser gerido pela OS Associação Congregação de Santa Catarina (ACSC), a unidade tornou-se um hospital chamado de “portas fechadas”, ou seja, que não recebe pacientes por demanda espontânea. Recebe apenas os que são transferidos e, para isso, emite autorização prévia, fazendo uma seleção.
 
Avanço da Terceirização no Estado
 
Duas das OSs que estão entre as 10 maiores do País têm atuado nos hospitais estaduais do Espírito Santo: a Associação Congregação de Santa Catarina (ACSC), que faz a gestão do Hospital Central, e a Associação Beneficente de Assistência Social e Hospitalar (Pró-Saúde), que atua no Hospital de Urgência e Emergência (HEUE), substituto do São Lucas. 
 
As instituições recebem hospitais recém-construídos ou reformados, completamente equipados, para um negócio em que não há riscos, pois é totalmente financiado com recursos públicos e sem fiscalização.  Segundo a legislação estadual, as OSs que atuam no Estado estão livre de qualquer controle social, ou seja, não precisam prestar contas ao Conselho Estadual de Saúde, por exemplo. Segundo a lei, basta que a Organização entregue os dados para a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa). 
 
No apagar das luzes de 2017, no dia 29 de dezembro, foi publicado no Diário Oficial do Estado mais uma OS habilitada para atuar no Estado: Hospital e Maternidade Therezinha de Jesus, que também está entre as 10 maiores do País. 
 
Mais gastos
 
A pesquisa Complexo Econômico Industrial da Saúde constatou, ainda, que o gasto com as OSs que administram três hospitais estaduais terceirizados – Jayme dos Santos Neves (Serra), Hospital Central (Vitória) e Hospital Estadual de Urgência e Emergência (HEUE/Vitória) – é 2,4 vezes superior às unidade totalmente públicas, sem garantia de que haja melhora no serviço.
 
No levantamento de todos os contratos de gestão firmados entre 10 estados brasileiros e as OSs, foi contatado que o problema não é o contrato de gestão inicial, que é mais divulgado. O problema são os aditivos que ninguém sabe que existem. “Alguns serviços, que tiveram o contrato de gestão inicial divulgado com custo de R$ 250 mil/ano saltaram para R$ 1,5 milhão/ano. Há casos de um único contrato com 15 aditivos em apenas 12 meses. O fato de fazerem tantos aditivos indicam, no mínimo, que não há qualquer planejamento”, disse a pesquisadora.  
 
Organizações Sociais que atuam no Espírito Santo

Hospital Central: foi o primeiro hospital estadual a ser privatizado, assumindo a gestão a Organização Social Santa Catarina. Desde então, funciona como Pronto-Socorro (PS) de portas fechadas. O que, na prática, significa que a unidade escolhe os pacientes que irá receber. Além disso, a rotatividade é muito grande, ou seja, as pessoas internadas, muitas vezes, não ficam o tempo necessário até a plena recuperação. O Hospital Central, diante da demanda, deveria ser um PS de portas abertas.

 
Jayme dos Santos Neves: a unidade está sendo investigada pelo Ministério Público Estadual pelo número excessivo de óbitos registrados no ano de 2015. Além disso, o Tribunal de Contas determinou fiscalização com enfoque na utilização dos recursos públicos transferidos pela Sesa à Associação Evangélica Beneficente Espírito Santo (Aebes), Organização Social contratada para gerir o Hospital Dr. Jayme Santos Neves. O Ministério Público de Contas (MPC) denunciou irregularidades no procedimento licitatório que resultou no contrato de gestão com a empresa.
 
Hospital Estadual de Urgência e Emergência: não tem mais os mesmos profissionais do antigo São Lucas em seu quadro de funcionários, ou seja, um corpo clínico referência no atendimento de urgência, emergência e traumatologia foi completamente desmontado. No lugar de servidores experientes e a serviço da saúde pública, a OS Pró-Saúde contratou terceirizados.
 
Hospital Estadual Infantil e Maternidade Dr. Alzir Bernardino Alves (Heimaba): foi privatizado recentemente. Com a mudança, a empresa que assumiu a unidade, Instituto de Gestão e Humanização (IGH), acabou com o acolhimento e com a classificação de risco. Novos técnicos de enfermagem inexperientes assumiuram o cuidado com crianças e o resultado tem sido um aumento considerável no número de mortes. A IGH tem sido investigada em outros estados por denúncias de quebra de contrato e irregularidades em licitações das quais participou.
  
A pesquisa Complexo Econômico Industrial da Saúde estuda grupos empresariais que operam dentro da saúde pública. São eles: empresas médicas/laboratórios e serviços de diagnósticos (1)/cooperativas médicas (2)/planos de saúde (3)/faculdades privadas de Medicina (4)/farmácias e drogarias (5)/grupos hospitalares (6) e Organizações Sociais de Saúde (7). 

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