O Núcleo de Repressão às Organizações Criminosas e à Corrupção (Nuroc) divulgou, nesta semana, um esquema fraudulento envolvendo empresários e profissionais de saúde suspeitos de vender materiais hospitalares descartáveis reutilizados. O fato pode jogar mais “lenha na fogueira” da chamada judicialização da medicina, pois a infecção hospitalar está entre os motivos pelos quais pacientes acionam a Justiça quando se sentem lesados nos serviços prestados por unidades de saúde. Segundo estimativas, cerca de 100 mil pessoas morrem por ano vítimas de algum tipo de infecção hospitalar.
O advogado especialista em Defesa Médica, Télvio Valim, explica que hospitais podem ser responsabilizados na esfera judicial por episódios de infecção hospitalar. “Na área do Direito dizemos que existe responsabilidade objetiva, pois a unidade de saúde deve estar ciente da qualidade dos produtos que utiliza e compra”, explicou Valim. Para o advogado, basta estabelecer um nexo causal. “Se a causa do dano estiver relacionada à responsabilidade do hospital, a unidade é responsabilizada, independentemente de quais foram suas ações ou intenções”, explicou Valim.
A judicialização da saúde é um fenômeno no Brasil e no mundo. De acordo com os dados extraídos da publicação “Números atualizados da judicialização da saúde no Brasil”, 1.346.931 processos judiciais de natureza cível foram ajuizados até 31 de dezembro de 2016 e estão tramitando na Justiça. Desses, 427.267 estão relacionados a planos de saúde e 214.947 a tratamentos e ao não fornecimentos de medicamentos pelo SUS.
Para Valim, o crescimento está associado a vários fatores, entre eles, maior acesso à informação por parte dos cidadãos. Além disso, no setor privado, os pacientes se tornaram consumidores exigentes. Dessa forma, acionam o Código de Defesa do Consumidor contra os profissionais quando se veem insatisfeitos. Já no setor público, a insatisfação dos usuários em relação ao SUS também tem sido levada aos tribunais.
O crescimento também envolve processo contra erros médicos. De acordo com dados do Superior Tribunal de Justiça (STJ), num extrato de 10 anos, de 2004 a 2014, houve um aumento de 1.600% no número de processos judiciais envolvendo médicos, além de um crescimento de 180% de profissionais condenados nos Conselhos Regionais de Medicina. As estimativas indicam que, atualmente, 7% dos médicos brasileiros respondem a processos.
Para Valim, nesse caso, as razões também são explicáveis. “No passado, a quantidade de profissionais era restrita, pois havia um número menor de faculdades de Medicina. Segundo Valim, outra variável é a precarização da Medicina. “Não é segredo, por exemplo, que no setor privado muitos hospitais são plenamente equipados, que os médicos são mal remunerados e que trabalham muito além da sua capacidade por exigência dos planos de saúde. Soma-se ainda problemas estruturais da rede pública de saúde, como falta de mão de obra auxiliar ao serviço médico”.