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ICMBio abre consulta pública para proteção da Ilha de Trindade

O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) divulgou, nesta quarta-feira (24), a data da consulta pública para discussão da proposta de criação de unidades de conservação marinha na região da Ilha de Trindade, a cerca de 1.200 quilômetros de distância da costa capixaba.

A consulta será realizada às 14 horas do próximo dia oito, no Centro de Visitantes do Projeto Tamar, localizado na Enseada do Suá, em Vitória. Até lá, os interessados podem enviar sugestões por email ou Correios, para a Diretoria de Criação e Manejo de Unidades de Conservação (Diman) do órgão, em Brasília/DF.

No site do ICMBio, está disponível o estudo que embasou as propostas iniciais do órgão, a serem apresentadas na consulta pública. “O Diagnóstico Biológico e Sócioeconômico para a proposta de criação de uma Área de Proteção Ambiental (APA) e um Refúgio de Vida Silvestre (Revis) na Cadeia Vitória-Trindade” apresenta um resumo da elevada riqueza biológica da região e sua singularidade em todo o Atlântico Sul e três cenários mais propícios para garantir a conservação ambiental, sem conflitar com os interesses econômicos depositados na região.

Em todos os três, há uma área mais sensível que deve ser alvo de uma unidade de conservação de proteção integral, ao redor das ilhas oceânicas, e uma região onde é possível ordenar os usos econômicos já desenvolvidos, por meio de uma unidade de conservação de uso sustentável.

As principais atividades econômicas atualmente em uso na região são a pesca e a mineração de rodolitos, utilizados para fabricação de adubos.

Hudson Pinheiro, membro da Associação Ambiental Voz da Natureza e pesquisador associado da Academia de Ciências da Califórnia, é o autor do estudo.

O documento explica que, “devido à importância biológica e ecológica para o Brasil, o presente documento apresentada um diagnóstico biológico e sócioeconômico para a proposta de criação de uma Área de Proteção Ambiental federal (APA) na Cadeia Vitória-Trindade abarcada pela ZEE brasileira (APA VitóriaTrindade) e um Refúgio de Vida Silvestre (Revis) na região do entorno da Ilha da Trindade e Arquipélago Martin-Vaz (RVS Ilha da Trindade). Este mosaico de Unidades de Conservação Marinha irá representar a maior área protegida marinha do Oceano Atlântico, tornando o Brasil uma das lideranças mundiais de desenvolvimento sustentável e conservação do território marinho”.

O pesquisador explica que, mesmo no primeiro cenário proposto, que é o mais restritivo, houve o cuidado de excluir, da área das unidades de conservação a serem criadas, a região de interesse para exploração do petróleo, para evitar quaisquer conflitos com o governo estadual e o Ministério das Minas e Energia.

As atividades de pesca e mineração de rodolitos, no entanto, acontecem na área prevista para a APA, e passariam a contar com mais normativas de uso sustentável e, no caso da pesca, que visem o favorecimento da frota local, protegendo-a das grandes embarcações asiáticas que pescam na região de forma predatória e ilegal.

Já nas ilhas e em seu entorno direto, a intenção é garantir a proteção integral. “São áreas muitos sensíveis e de alta singularidade, com mais de 10% de endemismos em todos os grupos pesquisados”, destaca Hudson, em referência aos estudos de fauna e flora realizados.

O estudo foi baseado em mais de 100 artigos sobre a região, com destaque para a produção científica mais recente realizada pela Voz da Natureza e a Universidade Federa do Espírito Santo (Ufes).

Mais importante laboratório natural do mundo

Considerado o mais importante laboratório natural do mundo, a Cadeia Vitória-Trindade (CVT) representa uma formação única no planeta, composta por uma cordilheira de montanhas de mais de 1.000 km de extensão, que conecta a costa central do Brasil à Ilha da Trindade e Arquipélago Martin Vaz. A CVT possui cerca de 30 montes submarinos, sendo que ao menos dez alcançam a zona mesofótica, entre 30 e 150 metros de profundidade, funcionando como verdadeiras ilhas para a biodiversidade marinha.

As ilhas oceânicas, situadas no extremo leste da CVT, abrigam a mais alta diversidade de algas calcárias do mundo, a maior riqueza de espécies recifais e espécies endêmicas entre todas as ilhas brasileiras, e ainda uma das maiores taxas de biomassa de peixes recifais do Atlântico Sul.

A região da CVT é reconhecida nacionalmente e internacionalmente como de alta prioridade para a conservação e uso sustentável da biodiversidade em todo o Atlântico Sul. Alvo de criação de uma Reserva da Biosfera Marinha, a CVT também foi apontada pela Convenção da Diversidade Biológica como uma área marinha ecologicamente e biologicamente significante, e indicada pelo governo brasileiro durante a Conferência da ONU sobre Oceanos/ODS 14, realizada em junho de 2017, como área prioritária para a proteção dos oceanos e criação de Unidades de Conservação marinhas.

A Ilha da Trindade é atualmente considerada uma Reserva Municipal de Vitória (Espírito Santo), também parte da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica (RBMA). A Ilha ainda abriga, desde 1957, o Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade, gerido pela Marinha do Brasil.

A proteção dessa região vem sendo reivindicada por ambientalistas desde 1962, quando a botânica Bertha Lutz, professora do Museu Nacional, propôs a criação de um Parque Nacional ao redor da Ilha da Trindade e do Arquipélago Martin Vaz. Em 2010, uma proposta de criação de uma área protegida marinha englobando toda a Cadeia Vitória-Trindade foi protocolada no ICMBio.

Expedições cientificas recentes, lideradas por cientistas brasileiros, desvendaram a importância dos montes submarinos para a origem e manutenção da biodiversidade na Ilha da Trindade e Arquipélago Martin Vaz, aperfeiçoando a proposta da criação de um mosaico de unidades de conservação marinhas ao longo da CVT. Atividades de pesca exercidas sem nenhuma forma de manejo, e a destruição de ecossistemas causada pela extração de ambientes recifais e bancos de rodolitos, constituem uma das principais fontes de ameaça ao redor das ilhas e montes submarinos.

Ambientes isolados, como ilhas oceânicas e montes submarinos, apesar de apresentarem exuberante biodiversidade e alta biomassa de peixes, são relativamente frágeis a atividades de exploração intensivas. O isolamento e a restrita área recifal forçam as populações destas regiões a serem mantidas por auto-recrutamento, dependentes delas mesmas para sua manutenção. Portanto, a falta de manejo pode levar muitas espécies rapidamente ao colapso, como exemplo o caso de extinção de tubarões já ocorrido em outras ilhas oceânicas brasileiras.

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