O capixaba Juliano Enrico é uma das figuras destacadas da nova geração do humor brasileiro. Ganhou o “mainstream” sem deixar o pé no “underground”. Seu trabalho conquistou sucesso internacional com o desenho animado Irmão de Jorel no Cartoon Network, trabalhou com Marcelo Adnet na TV Globo, passou pela MTV e ainda segue de perto os trabalhos da TV Quase.
Aliás, é justamente com este grupo de amigos, que inicialmente constituíram a Revista Quase quando estudantes, que o talento e o humor ácido de Juliano começaram a despontar, seja nos quadrinhos ou nas performances memoráveis vestido de Homem Galinha nas casas de show onde se realizavam as festas undergrounds capixabas, tempos que lembra com nostalgia. “Sinto falta de quando Vitória era uma referência cultural pro resto do país com bandas autorais e lugares de show e festas alternativas. A sensação é que hoje virou o paraíso das farmácias e das banda cover”, ironiza.
Desenhista, ator, produtor, roteirista, dublador, diretor, ele faz de tudo, mas no momento se dedica especialmente à produção da terceira temporada de Irmão de Jorel, primeira série latino-americana do canal estadunidense Cartoon Network.
Nesta sexta-feira (2), ele estará em Vitória para a realização de uma sessão especial com vários episódios da série projetados no estacionamento do Cine Metrópolis, na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), às 19h, como parte do encerramento da temporada de verão do Festival de Cinema de Vitória Itinerante. Juliano promete “fortes emoções”. Também “quase” promete cenas inéditas da nova temporada do desenho: “É possível que seja exibido o trailer…”. Oportunidade para quem ainda não conhece a série e para os fãs que queiram rever e conversar com o criador.
A série trata de uma família bastante excêntrica, que guarda inúmeras influências autobiográficas. Juliano realmente possui um irmão chamado Jor-El, nome inspirado na personagem de Superman, de cabelos longos e lisos, o garoto mais popular da cidade. O personagem central, o Irmão de Jorel, nunca tem seu nome revelado, mas pode-se imaginar em quem se inspira…
Em seu Fotolog, nos “longínquos” anos 2000, o jovem Juliano já trazia a alcunha Irmão de Jorel e manifestava todas frustração por crescer ofuscado pelo magnífico Jor-El. Ali mesmo, apareceram os primeiros desenhos e quadrinhos da família que hoje é acompanhada em vários países da América Latina. O Fotolog ainda está no ar, mas veja logo antes que ele se dê conta e resolva tirar do ar por vergonha.
Leia a seguir a entrevista de Juliano Enrico ao Século Diário, em que fala da sua carreira, da nova temporada de Irmão de Jorel e de sua relação com Vitória.
– Como você começa e desenvolve sua relação com o desenho até chegar na produção da série Irmão do Jorel?
Eu desenho desde nenenzinho e ficava inventando histórias com meus bonequinhos dos Comandos em Ação [faço as duas coisas até hoje]. Mesmo com a pressão da sociedade pra que eu deixasse de desenhar porque 'desenhar era coisa de criança' eu continuei desenhando. Minha família me fez acreditar que era maneiro desenhar e que eu desenhava bem. Meu traço não mudou muito de lá pra cá, mas a maneira que conto histórias foi evoluindo à medida que fui trabalhando com meus parceiros da TV Quase. A ideia de uma série de humor sobre a infância vem de uma vontade inicial de fazer quadrinhos biográficos autodepreciativos inspirados em fotos de família (da minha). Lá em 2002 mais ou menos…
– No que você inspirou para construir personagens e cenários do desenho? Há algo de capixaba neles?
Existem muitos personagens e lugares que lembram figuras e momentos de Vitória, sim. Eu gosto de criar me deixando influenciar por coisas que vejo e manipulo, isso de uma forma que acredito que faça sentido pra outras pessoas. Eu misturo personalidades e fisionomias e tento extrair a essência de alguns personagens lembrando de alguns detalhes reais. Eu manipulo a minha memória. Tudo isso acaba ganhando outras dimensões à medida que muitas pessoas vão se envolvendo na produção dessas ideias.
– A que atribui o sucesso do desenho não só no Brasil mas em outros países? Acha que Irmão do Jorel abre espaço para outras produções latino-americanas?
O Cartoon Network sempre teve um diálogo muito próximo e entendeu muito bem quais eram as necessidades do projeto desde o piloto. O Irmão do Jorel é a primeira animação original do Cartoon Network na América Latina e muitas novas séries legais estão sendo produzidas nesse momento. Acho que toda produção abre espaço para outras produções. O Irmão do Jorel é parte de algo muito grande e bonito. O mercado e o cenário da animação brasileira cresce e evolui todos os dias. Sinto que esse sucesso do Irmão do Jorel ajuda muito para que outros canais, produtoras e criadores não tenham medo de experimentar novas linguagens na animação.
– Como estão os preparativos para a terceira temporada? Que novidades pode adiantar? Há previsão de data para estreia?
Estamos produzindo mais 26 episódios inéditos e alguns curtas que ampliam e complementam o universo que conhecemos na série de TV. Teremos fortes emoções com o desdobramento dos acontecimentos do final da segunda temporada. Irmão do Jorel vai evoluir como ser humano ganhando novas camadas de personalidade e outros personagens ganharão mais destaque. A terceira temporada está se aproximando, mas ainda não tem uma data definida. Mas está se aproximando.
– Além do Irmão do Jorel, que outras atividades você vêm realizando ?
Tenho me dedicado exclusivamente aos roteiros, edições de animatic, direção e coreografia do Irmão do Jorel. Como a sala de roteiro é formada por membros da TV Quase, também me envolvo acompanhando os ensaios e gravações do Choque de Cultura, que está com episódios inéditos na TV Quase e no Omelete. O Último Programa do Mundo voltou recentemente com uma nova temporada no canal da TV Quase no youtube também, que foi gravada em 2016 pro canal de TV por assinatura FX. É só entrar no youtube.com/tvquase, se inscrever e assistir tudo.
– Como organiza seu cotidiano de trabalho? E o que faz quando não está trabalhando?
Fico entre Rio e São Paulo nos estúdios de voz (trilha e mix) e de animação. Quando consigo passar por Vitória, tento ficar com minha família. Passo um tempo vendo minha vovó regando o jardim, vendo meu pai contando umas histórias dele, minha mãe encontrando coisas perdidas pela casa, minhas sobrinhas mexendo e quebrando tudo… De repente percebo que estou trabalhando fazendo anotações mentais. Então quando não estou trabalhando, eu tô trabalhando.
– Tem vindo constantemente ao Espírito Santo? Sente saudades de algo daqui?
Não vou tanto quanto eu gostaria. Toda vez que passo por Vitória tem coisas novas construídas e quando olho com mais atenção descubro que é tudo farmácia. Sinto falta de quando Vitória era uma referência cultural pro resto do país com bandas autorais e lugares de show e festas alternativas. A sensação é que hoje virou o paraíso das farmácias e das banda cover.
– Você estará presente na sessão de sexta-feira do FCV Itinerante na Ufes? O que esperar desse evento?
Esse evento vai exibir os últimos episódios da segunda temporada em sequência. Vai ser tipo um longa formado por vários episódios de 11 minutos conectados numa mesma história. É possível que seja exibido o trailer da terceira temporada também com cenas inéditas…Fortes emoções!