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Sem-terras reocupam fazenda em Conceição da Barra

Duzentas famílias sem-terra voltaram a ocupar, na manhã desta segunda-feira (5), uma área improdutiva de 200 hectares localizada na Fazenda Itaúnas, no distrito de Cobraice, em Conceição da Barra, norte do Estado, região que possui a maior concentração de terras degradadas pelas monoculturas de eucaliptais, canaviais e pastagens do Espírito Santo.

 

A intenção é retomar o plantio de alimentos e a garantir moradia para as famílias, que foram despejadas de forma apontada como truculenta pela Polícia Militar há sete meses, num ato de reintegração de posse em favor da Agropecuária Aliança S/A (Apal).
 

A área foi intensamente explorada pela monocultura de cana-de-açúcar e também eucaliptos da Destilaria Itaúnas S/A (Disa), empresa que teve falência decretada em 2016, deixando seus ex-empregados sem o devido atendimento de seus direitos trabalhistas. Sem perspectivas de trabalho e renda na região, os desempregados tomaram a iniciativa da ocupação e receberam, de imediato o apoio do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

 
Para Ângelo Souza, da direção estadual do MST, é muito importante o movimento lutar e reocupar essa área que é improdutiva, que não cumpre, assim, o seu papel social como prevê a Constituição Federal de 1998. “A luta por Reforma Agrária se faz urgente e necessária para garantir dignidade para a classe trabalhadora do campo e da cidade” afirma o dirigente.
 
Ângelo conta também que, segundo dados obtidos pelo MST no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), apenas 3% dos 923 imóveis rurais do município são responsáveis por 54% das áreas agricultáveis.
 
Violência física e psicológica
 
A primeira ocupação aconteceu em 27 de outubro de 2016, sendo batizada de Acampamento Fidel Castro, e marcou os 31 anos de atuação do MST no Espírito Santo. Durante os nove meses de ocupação, foi implementada uma lavoura agroecológica diversificada, em cerca de 50 hectares, onde os trabalhadores cultivavam feijões, mandioca, hortaliças e outros itens de subsistência, transformanndo profundamente, para melhor, a paisagem local, tão degradada pelas décadas de monocultivos.
 
No despejo, ocorrido no dia 11 de julho de 2017, a Polícia Militar destruiu os mais de 50 hectares de lavouras agroecológicas e casas construídas pelas famílias, chocando os acampados com a injustificada violência.
 
“A ação da polícia foi de um nível desproporcional, uma violência absurda”, lamentou, na ocasião, Adelso Rocha Lima, da coordenação estadual do MST. “Helicóptero, cavalaria, muitos policiais … para resolver um problema social e não de polícia. E que não foi resolvido, só agravado”, critica, narrando os voos rasantes da aeronave por cima das famílias, “uma violência física e psicológica desnecessárias”.
 
Acolhidas na escola do Assentamento Pontal do Jundiá, no mesmo distrito – a primeira escola de ensino fundamental e a primeira a adotar a Pedagogia da Alternância em um assentamento capixaba –, as famílias foram em seguida na comunidade quilombola de São Domingos, também em Conceição da Barra, somando-se à resistência das comunidades do Território Quilombola Tradicional do Sapê do Norte, encurraladas pelos eucaliptais da Aracruz Celulose (Fibria) e na luta para terem a titulação de seu território tradicional.
 
'Quando é que vocês vão sair?

'A Justiça já havia suspendido três vezes a reintegração de posse da Fazenda, contrariando argumentos e evidências apresentadas pela Defensoria Pública Estadual e por entidades e lideranças políticas que apoiam a Reforma Agrária.

O defensor público Vinicius Lamego de Paula explica que, raramente, nas chamadas audiências de conciliação – convocadas pela Justiça quando o proprietário ou posseiro da terra ocupada reivindica a reintegração de posse – o juiz prioriza o cuidado com as famílias e o encaminhamento da Reforma Agrária. 

“Os juízes geralmente defendem a propriedade da terra”, afirma, ressaltando que o trabalho da Defensoria Pública, nesses processos, consiste basicamente em sensibilizar os juízes, principalmente em estados como o Espirito Santo, que não possuem uma Vara Agrária.

Concordando com o advogado, Ednalva Moreira Gomes, liderança local do MST, diz que as audiências de conciliação são na verdade audiências de pressão e intimidação, em que a Polícia Militar e outros representantes do poder estatal nunca discutem a Reforma Agrária ou o que fazer com as famílias acampadas. “A pergunta é sempre: “Quando vocês vão sair?’', conta a liderança camponesa.

O defensor Vinícius explica ainda que os processos geralmente emperram na inoperância do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) que, mesmo sendo formalmente solicitado, não realiza os estudos sobre produtividade das terras reivindicadas, o que dá margem para que os juízes optem por respaldar o argumento dos supostos proprietários e decidam pela expulsão dos acampados.

Nem vistorias nem orçamento

De fato, durante todo o ano de 2017, não houve uma única vistoria para desapropriação no Estado e, até o momento, também nenhuma em 2018. Sequer o orçamento destinado à Reforma Agrária para este ano foi definido ainda, informa Ednalva Moreira Gomes, liderança local do MST.

“A Reforma Agrária está relacionada ao direito à vida. Direito à moradia, ao alimento, ao trabalho e à vida. Não é só um pleito do MST, mas da população em geral, porque envolve a segurança alimentar. O agronegócio produz exportação, não é para alimentar a população”, argumenta o defensor público.

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